Crise política não dá trégua
A agenda econômica vazia em termos de indicadores e eventos relevantes nesta terça-feira concentra o foco dos mercados domésticos na questão política, neste dia que deve ser agitado em Brasília. Com isso, o contexto de atividade, inflação e juros no país deve ficar em segundo plano, já que o presidente Michel Temer mantém um governo de aparências, incapaz de retomar a pauta do ajuste das contas públicas.
Tudo o que os investidores queriam era uma solução rápida para a crise que eclodiu em meados de maio, de modo que a delação de empresários da JBS não contaminasse a recuperação econômica nem paralisasse a agenda de reformas. Um mês depois, porém, a sensação é de que um desfecho está longe do fim e que a instabilidade política vai prosseguir, penalizando a economia.
Com a semana mais curta e esvaziada no Congresso por causa das festas juninas, os esforços da base aliada se concentram em garantir os votos para barrar uma eventual denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra Temer. Aliás, o viés já favorece o arquivamento do processo na Câmara, com o voto favorável de ao menos 172 deputados, de um total de 513.
A questão é que se o presidente conseguir um número muito perto do mínimo necessário, abaixo da maioria desejada para governar com tranquilidade, ficam evidentes a perda de apoio e os sinais de mais turbulência à frente, com uma debandada dos partidos aliados. Por outro lado, um placar ao redor de 300 votos a favor pode reacender a esperança na retomada das negociações pela reforma da Previdência.
Já a Polícia Federal não tem dúvidas de que Temer comentou ao menos o crime de corrupção passiva, juntamente com seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures. Porém, a PF pediu mais cinco dias para concluir a perícia técnica da gravação feita por Joesley Batista e finalizar a investigação sobre a suspeita de obstrução de Justiça e organização criminosa.
À espera desses dias que prometem ser agitados, merecem atenção os eventos no front político programados para hoje. Um dos destaques é o julgamento, à tarde, do novo pedido de prisão do senador afastado Aécio Neves pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Na semana passada, o colegiado negou o habeas corpus da irmã do tucano, por 3 votos a 2.
Se o placar se repetir, a Corte deve encaminhar ao Senado o pedido de autorização da prisão de Aécio e o Conselho de Ética promete decidir sobre a questão em cinco dias. Enquanto aguarda a decisão no Judiciário, a Casa Legislativa deve votar o relatório sobre a reforma trabalhista, em sessão da Comissão de Assuntos Sociais. Antes de ir ao plenário, o texto também precisa ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Mesmo no centro da turbulência política, Temer tenta manter uma agenda positiva e se encontra nesta manhã com autoridades e investidores russos, em busca de acordos bilaterais. No calendário econômico doméstico, saem apenas leituras regionais de índices de preços ao consumidor, pela manhã.
No exterior, a agenda econômica igualmente fraca traz dados sobre a conta corrente na zona do euro, logo cedo, e nos Estados Unidos (9h30). Lá fora, o sinal positivo se mantém entre as bolsas na Europa e em Nova York, com os ganhos novamente liderados pelas ações do setor de tecnologia. A recuperação nos preços do petróleo também ajuda.
A exceção fica com a China, que registrou perdas em Hong Kong e em Xangai, antes da decisão sobre a inclusão dos índices acionários chineses na cesta referencial do MSCI, que agrupa as carteiras de ações de maior valorização no mundo e é usada como referência para diversos fundos de ações. O anúncio deve ser feito hoje.
Nas moedas, destaque para o tombo da libra esterlina ao menor nível em uma semana, abaixo da faixa de US$ 1,27, após o presidente do Banco Central inglês (BoE), Mark Carney, descartar a chance de aumento iminente na taxa de juros britânica. A autoridade monetária mostrou-se preocupada com os impactos do Brexit na economia local, diante das incertezas nas negociações do Reino Unido com a União Europeia (UE).
O euro, por sua vez, oscila em alta em relação ao dólar. Mas a moeda norte-americana mede forças antes os rivais, após as declarações do presidente da distrital de Nova York do Federal Reserve, William Dudley, afirmar que suspender o ciclo de alta dos juros agora colocaria a economia dos EUA em perigo.
Na mesma linha, o presidente da distrital de Chicago do Fed, Charles Evans, afirmou que o atual ambiente econômico suporta aumentos graduais na taxa de juros do país. Em reação, o rendimento (yield) dos títulos norte-americanos (Treasuries) recua, diante da menor demanda pelos papéis. Ainda hoje, espera-se pela fala do vice-presidente do Fed, Stanley Fischer.