Cripto: tendências de infraestrutura e previsões empresariais para 2020
1. Ferramentas institucionais de negociação, custódia e conformidade
Demorou um tempo para a Bakkt dar a largada, mas a corretora de futuros de cripto da Intercontinental Exchange (ICE) esteve ganhando participação de mercado contínua (ou lenta) em contraste à CME desde seu lançamento em meados de setembro.
Fidelity Digital Asset Services garantiu sua licença para um fundo. Foram lançados novos custodiantes institucionais de cripto, como o Anchorage, enquanto houve fusões (Coinbase e Xapo).
Corretores principais, como Tagomi, lançaram para automatizar o roteamento de ordens inteligentes e unir negociações de clientes em uma base de “melhor execução”. Dados de referência passaram por uma grande nivelação.
Em suma, a maioria das peças fundamentais que faltaram no último ciclo de mercado foram criadas e são capazes de atrair maiores consumidores de maneira significativa.
Talvez haja alguma consolidação desses serviços se o mercado negocie lateralmente por um período de tempo mais extenso, mas agora a infraestrutura existe a fim de apoiar os investidores institucionais.
2. Mercados de crédito
Crédito DeFi teve muito hype em 2019, mas foi o crescimento de empréstimos de emprestadores centralizados que realmente foram bem-sucedidos. Havia cerca de US$ 650 milhões de empréstimos em toda a DeFi. Enquanto isso, Celsius emprestou mais de US$ 2 bilhões em um período de 90 dias.
Até empresas de empréstimo pretensiosas como a Blockchain.com, que começou com as operações no fim de 2019, emprestou mais de US$ 10 milhões por mês. A maioria desses empréstimos são relacionados a cripto e são usados por investidores para venda de ativos a descoberto.
No entanto, recentemente, vimos empréstimos de dinheiro garantidos por cripto tomando uma grande porção do mercado de empréstimo.
O relatório do terceiro semestre da Genesis Capital fornece compreensão sobre a análise detalhada de seu livro de empréstimo.
Apesar do crescimento, o mercado de empréstimo ainda é imaturo e subpenetrado.
Esperamos que o crescimento de empréstimo continue sua trajetória alta e tórrida, e veremos algumas das ampliações de mesas de empréstimo espetaculares no ano novo, por conta da maior competição de preços de empréstimo e do aumento dos perfis de risco.
3. Grandes atualizações de dados/pesquisa
Quando começamos a Messari, CoinDesk e CoinMarketCap eram, basicamente, as únicas empresas de dados e informações em nível de qualidade.
Hoje, TheBlock, Decrypt, Delphi Digital e muitos grupos de pesquisa de corretoras e de fundos oferecem uma melhoria de 10 vezes na cobertura e rigor analítico que trazem ao mercado.
Empresas como CoinMetrics, Flipside Crypto e Kaiko (todas parceiras da Messari) fornecem métricas e dados excepcionais e muito mais confiáveis sobre os mercados, blockchains e tendências off-chain que afetam cada protocolo e seu token.
Ainda assim, é necessário comer muito arroz e feijão se quisermos dominar qualquer coisa que possa ser chamada de “fundamental” para uma nova classe de ativos.
Caso para análise, eu analisei o volume de negociação de 24 horas na OKEx de acordo com cinco diferentes fornecedores de dados dentre os principais e obtive o seguinte resultado:
– US$ 523 milhões na CoinMarketCap
– US$67 milhões no “Blockchain Transparency Institute”
– US$826 milhões na Nomics
– US$2,5 bilhões no monitor de volume da FTX (incluindo os volumes de derivativos)
– US$328 milhões por CryptoCompare
Esses são os dados de algumas das maiores corretoras de cripto do mundo. Não há dúvidas de que a SEC não confia nos dados de preço à vista ou esteja confortável com os padrões de cumprimento internos de até mesmo algumas das corretoras globais mais líquidas.
É claro que alguns de nós vão continuar a direcionar os padrões de dados na nova década, mas as corretoras e os projetos têm de achar um meio-termo conosco, com divulgações e verdadeiras estruturas internas.
4. Ferramentas de governança
Como as equipes que começaram centralizadas se descentralizam com o tempo? Como os projetos lançam e atraem missionários vs. mercenários, agora que está claro que a mágica dos lançamentos “justos” do bitcoin e da ethereum não são repetíveis?
Como podemos identificar os modelos sustentáveis a fim de atrair players a longo prazo ou governar os conselhos de fundações e de tecnologia que enviam submissões (commits) aos protocolos enquanto minimizam o risco de autonegociação?
Quanta governança deve ser imposta a níveis de código vs. entidades jurídicas? Como as regras do jogo são atualizadas com o decorrer do tempo?
Existe um número limitado porém crescente de precedentes do que constituem melhores (e piores) práticas na governança cripto: na Ethereum, Tezos, Zcash, MakerDAO e muitos projetos menores estão aprendendo na marra.
Atualmente, uma das maiores lacunas na infraestrutura cripto é o que poderia ser mais ou menos definido como “serviços de governança” enquanto repensamos em como organizar os mercados.
Serviços de staking podem ser os mais próximos em relação às ferramentas necessárias para a governança eficaz dos protocolos, e está no meu planejamento de 2020 fortalecer o histórico político para ideias.
5. Corretoras como finanças abertas
Corretoras como finanças abertas têm quase todo o dinheiro e poder em cripto por conta de seus pools de liquidez.
No entanto, já que é um negócio competitivo e impiedoso e as transferências de custo são relativamente baixas, o ritmo do desenvolvimento de novos produtos e serviços é tórrido por necessidade.
Quando os usuários podem movimentar seus ativos fluidamente em dezenas de corretoras globais, esperam que sua corretora tenha segurança e serviços da mais alta classe, experiência de usuário (UX) ininterrupta e taxas competitivas como stakes de mesa.
Mas eles também querem negociação em margem, opções de empréstimo, serviços de staking, ferramentas de registro de taxas e qualquer outra coisa que se torne indispensável nos próximos anos, e eles querem agora.
Eu sugiro que você separe um tempinho para ler esse relatório gigantesco sobre o histórico de corretoras da Nomics, e a tese da MultiCoin de “Corretoras como Finanças Abertas”, em que Kyle Samani pergunta: “e se as corretoras não atingiram seu auge, mas, em vez disso, ainda estão na fase inicial de sua ascensão?”.
É uma boa pergunta: corretoras podem comprar serviços centralizados que se tornem projetos atraentes, interessantes para bifurcação e de baixa liquidez e que tragam seu próprio pool de liquidez aos mesmos protocolos, além de oferecer aos usuários um pedaço da ação por meio de tokens de corretoras.
O poder delas não vai diminuir tão cedo, e sim aumentar.
6. Invasões a corretoras também vão aumentar
Foi outro ano agitado para as invasões a corretoras, totalizando US$ 150 milhões em propriedade de criptomoedas. Binance, UpBit e Bithumb foram algumas das vítimas dentre as 20 principais corretoras globais por volume (apesar de ser digno de nota que eles cobriram todas as perdas de seus usuários).
Os alvos vão apenas aumentar nos próximos anos porque essas equipes vão aumentar em tamanho (e se expor a um maior risco de ataques sociais engenhosos) e porque as corretoras vão lançar mais dos serviços descritos acima.
Os chamarizes de ativos sob gestão (AuM, na sigla em inglês) vão aumentar, então a frequência e sofisticação dos ataques vão seguir o mesmo passo.
Uma ameaça de nível nuclear para cripto vai ser a exploração da vulnerabilidade de armazenamento frio em par com o que aconteceu com a Mt.Gox em 2014.
Se um ataque de escala similar acontecesse com a Coinbase, Binance ou um novato maior e institucional como a Fidelity, poderemos, provavelmente, vender os stakes e entrar em outra indústria por alguns anos enquanto a radioatividade diminui.
7. O criptocaubói sobrevive
Ano passado, Eric, nosso chefe de pesquisa, previu que uma grande corretora estrangeira enfrentaria ações jurídicas pesadas de um regulador americano (independente das restrições de acesso de usuários americanos da corretora).
“Vai resultar em um confronto jurídico e épico, já que decacórnios [empresas avaliadas em mais de US$ 10 bilhões] geralmente não desistem sem lutar”. E, meu Deus, que ano foi esse para a grande corretora Bitfinex.
A corretora de Hong Kong perdeu acesso a US$ 850 milhões após o Gabinete de Procuradoria-Geral de Nova York (NYAG) realizar a prisão de dois homens acusados de lavagem de dinheiro por meio de um processador de pagamentos oculto chamado Crypto Capital, que a Bitfinex alavancou para serviços bancários.
Então, o NYAG processou a iFinex, empresa-mãe da Bitfinex, após alegar que a empresa “participou de um disfarce para esconder a perda aparente de US$ 850 milhões do fundos corporativos e de clientes combinados” ao pegar emprestado da Tether, sua operadora de stablecoin afiliada, para cobrir o seu déficit.
Bitfinex reclamou a queixa do NYAG, levantando uma venda de tokens de US$ 1 bilhão em maio para reabastecer o déficit “temporário”, e depois ganhou um adiamento no caso contra o NYAG que limitou a quantidade de informação que eles precisavam compartilhar com os investigadores do caso da Crypto Capital. O drama ainda continua.
A empresa ainda planeja “descongelar” os ativos da Crypto Capital que eles acreditam estarem sendo retidos principalmente por autoridades europeias enquanto ainda brigam pelo que afirmam ser inquéritos excedentes da NYAG.
Tem muito a se analisar aqui em relação ao estado das corretoras na próxima década.
As primeiras corretoras de cripto não são necessariamente “suspeitas” ou vão contra as leis de KYC e antilavagem de dinheiro, mas seus intermediários de pagamento podem ser!
Tudo surge a partir da realidade dolorosa de que o negócio bancário de cripto ainda é assustadoramente escasso (e os reguladores tornam impossível a vida das corretoras).
Tether parece ter sido reservada completamente antes do escândalo da Crypto Capital, em contraste à especulação anterior.
Dan Matuszewski, antigo chefe de negociações OTC da Circle Trade, afirmou, recentemente em um podcast (altamente recomendado, aliás) que ele “sabia perfeitamente” que bilhões de dólares foram enviados para criar tether porque ele mesmo iniciou, pelo menos a maior parte, das novas transações em meio à euforia de mercado de 2017.
Apesar de todo o drama, a Bitfinex permanece uma das três corretoras de cripto mais líquidas do mundo. O fornecimento surpreendente de tether duplicou desde o início do ano.
Aparentemente, negociadores profissionais de cripto abraçaram a antifragilidade da corretora e sua abordagem de Velho Oeste ao criar a empresa (pelo menos até agora). Entretanto, é difícil imaginar um contexto em que isso continue já que os investidores institucionais começam a entrar no mercado.
Se você ganha dinheiro o bastante e não faz coisas que sejam aparentemente ilegais, você pode contratar o exército de advogados necessário para se manter no negócio. Caubóis.
Para uma visão mais cética porém excelente do drama da Bitfinex e do Tether e sobre o que diz respeito ao estado da criptoeconomia, você deveria ler essa sinopse viciante da história de ambas as empresas.
8. Coinbase vs. Binance
Não existe ilustração melhor da luta pela supremacia cripto do que a competição contínua entre a Coinbase e a Binance.
Coinbase permanece na posição de liderança para a construção da empresa de cripto dominante do Ocidente e redobrou as iniciativas para atrair usuários varejistas de cripto como uma variedade de novas ferramentas de “Finanças Abertas”.
Provavelmente, a Coinbase também vai pegar grande parte do mercado institucional, dada sua posição única de custodiante do maior fundo do mundo, Bitcoin Investment Trust da Grayscale, e sua recente aquisição da empresa de custódia Xapo.
A aquisição da Tagomi, principal corretora institucional de Nova York, foi recusada, mas faz muito sentido. Eu espero que dê certo em 2020.
Tenha em mente que a Coinbase manteve sua liderança apesar de um ano tumultuoso, que levou à rotatividade notável (e muito pública) da liderança sênior, incluindo CTO, COO, chefe de Instituições, vice-presidente de Engenharia e três outros diretores de engenharia.
A resiliência é impressionante e responde à profundidade das posições da Coinbase, além de seu fosso competitivo. Coinbase ainda é sinônima com a abordagem “pare e compre cripto” para milhões de clientes no Ocidente.
A empresa tem cinco dos principais fundos de guerra para acordos de M&A (fusão e aquisição) e o compromisso da empresa com os reguladores põe sua cabeça aos pés à frente de suas contrapartes, de um ponto de vista em conformidade e de “responsabilidade”.
Circle não é mais uma adversária já que está perdendo o gás ou vai estar à venda (talvez para a Coinbase?). Kraken não oferece a mesma amplitude de serviços. Novos concorrentes, como Fidelity e Bakkt, atendem clientes diferentes a uma gama bem mais lenta (e previsível).
A única ameaça à Coinbase é geopolítica, algo similar à sua principal adversária. O ritmo de crescimento da Binance é lendário.
Ela tem sido uma das empresas de crescimento mais rápido — em qualquer mercado — de todos os tempos, atingindo uma receita de US$ 1 bilhão em seus primeiros 18 meses (tecnicamente, Block.One, criadora da EOS, é a empresa de crescimento mais rápido da história, já que sua venda de tokens totalizada em US$ 4 bilhões de um ano foi considerada receita, mas isso é assunto para outra hora).
E a empresa não mostra sinais de desaceleração. O que faz a Binance funcionar?
A empresa é mestre em arbitragem regulatória e obediente pelo espírito das leis existentes (de proteger usuários de fraude e manipulação) sem estar envolvida na letra da lei ou esperar pela bênção explícita de qualquer regulador individual.
Isso é algo que a Binance pode conseguir fazer com sua equipe e infraestrutura distribuídas globalmente enquanto ainda trabalha com uma abordagem país por país para legitimar suas on-ramps (negociações de fiduciárias para cripto).
A preocupação é de se esse empurrão agressivo resultaria em ações regulatórias.
Apesar de terem se fechado dos clientes americanos (temporariamente) e terem uma visita controversa das autoridades (polícia? reguladores) em Pequim, continuam sendo a corretora não chinesa mais dominante e melhor em nível de volume.
Eles também lançaram sua própria corretora descentralizada; iniciativas de empréstimo, de margem, de staking e de stablecoin (BNB); além de verem seu token entrar para os cinco principais ativos por capitalização de mercado em um ponto (atualmente em oitavo lugar).
Ah, e eles também começaram a melhorar sua atividade de M&A.
Como brincou a MultiCoin, Binance continua com sua “blitzscaling” (tanto a estrutura geral como as técnicas específicas que permitem que as empresas atinjam imensa escala a uma velocidade incrível).
9. Todas as outras fontes de liquidez
Poderíamos fazer um relatório completamente diferente da microestrutura de amplo mercado de cripto (no ano que vem, provavelmente), mas basta dizer que Bitfinex, Coinbase e Binance possam não ser as maiores ou mais importantes corretoras do mercado atual.
Tanta negociação e liquidez e cripto acontecem nas mesas de mega-OTC (onde a maioria do fluxo de ordem original é criada hoje), ou mercados de futuros “não regulados”, como a BitMEX (que pode-se dizer que é a fonte de descoberta de preço de cripto atualmente) e, por trás do grande das megacorretoras Huobi e OKEx.
Isso também nem inclui as maiores corretoras japonesas e coreanas que talvez sejam tão grandes quanto a Coinbase Pro. Eu fiquei mais confortável com a Bitfinex ao longo dos anos, mas ela ainda me assusta bastante e parece ser uma bomba prestes a explodir, de um ponto de vista regulatório.
Felizmente, comandar o maior casino do mundo também significa que você pode pagar pelos melhores advogados.
10. Security tokens
Fora os tokens de corretoras, que são quase valores mobiliários, e os instrumentos sintéticos, security tokens são tão irrelevantes atualmente que eu quase esqueci de incluí-los neste relatório (pois é!).
Arjun acertou, em sua publicação do ano passado, quando disse que uma das suas regras principais era “nenhum veículo de investimento deveria prometer maior liquidez do que os ativos subjacentes proporcional”.
Eu concordo e isso é bem verdade em relação aos ativos que vêm com mais restrições regulatórias do que qualquer coisa negociada atualmente na infraestrutura cripto.
Aqui vão as coisas mais interessantes que aconteceram no mercado de security tokens este ano: Harbor abandonou sua venda de tokens e o CTO da empresa saiu; SeedInvest possa ser a única empresa que a Circle não consegue vender; e tZero declarou que iria levantar US$ 400 milhões, depois US$ 100 milhões e depois nada?
Pensei que eles tivessem levantado alguns milhões após todo o drama, mas eu nem me preocupei em pesquisar porque a única coisa que eu lembro sobre a tZero era que Patric Byrne, CEO de Estoques (e impulsionador da tZero) parece ter usado a empresa para ferrar com os investidores a longo prazo logo antes de se demitir, vender rapidamente suas ações e se mudar para a América do Sul após “expor o estado profundo” (A publicação de Matt Levine sobre esse assunto é uma obra-prima).
Security tokens parecem ser uma daquelas soluções em um problema aparente e estão rapidamente tomando o lugar da narrativa “blockchain, não bitcoin” como o meme mais divulgado e sem sentido do mercado.
Qualquer coisa, em breve, as empresas vão descentralizar seus modelos de negócio com redes alimentadas por token do que tokenizar (e destruir a liquidez para) suas ações e dívidas.
Mercados de empréstimo e de derivativos de cripto em grande escala precisam se materializar antes dos security tokens se tornarem interessantes daqui a 5 ou 10 anos, então talvez iremos incluí-los de forma mais relevante no nosso relatório de 2030.