Política

CPI da Câmara vê crime da Vale na tragédia de Brumadinho

15 maio 2019, 5:54 - atualizado em 15 maio 2019, 6:02
Audiência pública da CPI para investigar tragédia de Brumadinho (Imagem: Antonio Augusto/Câmara dos Deputados)

A CPI da Câmara vê “crime” da mineradora Vale (VALE3) ao omitir problemas na barragem do Córrego do Feijão, que se rompeu em Brumadinho, em 25 de janeiro. Na noite de ontem (14), os deputados ouviram funcionários da empresa e da Agência Nacional de Mineração (ANM), em depoimentos que duraram mais de sete horas.

Engenheiro de recursos hídricos da Vale, Felipe Figueiredo Rocha disse que secretariava algumas reuniões técnicas e garantiu ter repassado a gerentes e diretores da empresa todas as informações que recebeu a respeito do “nível de atenção” em que se encontrava a barragem.

“Esse é o painel de outubro de 2018 em que a (gerente da Vale) Marilene (Lopes) encaminha para (os diretores e gerentes) Silmar Silva, Lúcio Cavalli, Joaquim Toledo e Alexandre Campanha: ‘a barragem 1 requer mais investigação e monitoramento de campo para identificar e projetar medidas complementares mais eficientes'”, revelou.

Rocha ressaltou que o “nível de atenção” não indicava risco de rompimento imediato. Ele chegou a ser preso provisoriamente após a tragédia, sob a suspeita de pressionar a empresa de auditoria Tüv Süd em prol de um laudo de estabilidade da barragem.

Ele negou a acusação, informou não ter poder de chefia na Vale e ainda se disse “incomodado” com o ex-presidente da empresa, Fábio Schvartsman, que levantou suspeita de omissão de informações por parte de Felipe.

Outro funcionário da Vale, Tércio Andrade Costa, que monitorava as barragens por meio de radar, também confirmou o envio de todos os informes aos gerentes responsáveis. Indagado pelo relator da CPI, deputado Rogério Correia (PT-MG), o chefe de fiscalização da Agência Nacional de Mineração (ANM), Wagner Araújo, afirmou que deformações na estrutura e uso de drenos por parte da Vale mostram que a barragem deu sinais prévios que deveriam ter sido informados ao Sistema Integrado de Gestão de Barragens (SIGBM). Segundo Araújo, essa omissão foi “gravíssima”.

“Pelo que a gente tem ouvido dizer sobre o dreno horizontal profundo que foi interrompido com carreamento de sólido – e isso é preocupante em uma barragem a montante -, possíveis deslocamentos identificados em radar, tudo isso são indícios de que a estrutura não estava saudável”, informou, ressaltando que essa informação deveria ter sido repassada pela Vale à ANM.

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Omissão

Para caracterizar ou não a omissão, documentos colhidos na Vale ainda estão em análise pela ANM e Polícia Federal. Wagner Rocha não admite falha na fiscalização da agência.

Ele lembrou que a ANM só tinha três funcionários para fiscalizar as 350 barragens de mineração em Minas Gerais e que a legislação dá à mineradora a responsabilidade pelas informações sobre segurança.

Após a tragédia, a ANM tem avançado na automatização do monitoramento por meio de equipamentos (radares e piezômetros) elétricos capazes de gerar alertas e atualizar dados, sem necessidade de informações “meramente declaratórias” das empresas.

Gerente-executivo do Complexo do Córrego do Feijão, Rodrigo Gomes de Melo se emocionou ao lembrar que só escapou da tragédia por estar de férias em 25 de janeiro. Melo explicou porque não foi cogitada a hipótese de remoção prévia do refeitório e da administração da Vale, localizados praticamente no pé da barragem e onde morreu grande parte das mais de 300 vítimas.

“Existem pessoas que são sobreviventes daquela situação e eu sou um deles. Eu não sou um suicida. A gente acreditava que aquela estrutura estava segura e também existia um processo de confiança no corpo técnico”.
Rodrigo de Melo e o engenheiro Felipe Rocha estão afastados de suas funções na Vale por recomendação do Ministério Público.

Para os deputados, não há dúvida do “crime de omissão” da Vale, como sintetizou o relator Rogério Correia.  “Significa omissão da Vale. Se a ANM soubesse disso, ela não permitiria que (a barragem) continuasse a ter o mesmo funcionamento que estava tendo”.

Demandas

O presidente da CPI, deputado Júlio Delgado (PSB-MG), apresentou três demandas colhidas durante audiência pública da comissão em Brumadinho, na segunda-feira (13): garantia de água potável para a população; não suspensão do pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) aos moradores que receberam o auxílio emergencial do governo federal (MP 875/19); e rapidez do Instituto Médico Legal (IML) na identificação por DNA em partes de corpos resgatados em meio à lama.

Auditoria

A CPI também ouviu o gestor administrativo e financeiro da empresa alemã Tüv Süd, Marcelo Pacheco. Como eletricista, ele afirmou não ter participado das decisões técnicas que atestaram a estabilidade da barragem do Córrego do Feijão.

Segundo ele, não há outras experiências da empresa com mineração fora do Brasil. A empresa suspendeu os contratos que tinha com a Vale, desde 2013, e abriu uma investigação interna, na Alemanha, a respeito do rompimento da barragem de Brumadinho.

Os deputados estranharam a falta de conhecimento de Marcelo Pacheco quanto ao contrato com a Vale e lembraram que o engenheiro Makoto Namba, que assinou o laudo de estabilidade, se manteve calado diante da CPI que investiga o caso na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.