Economia

Corte de impostos de Paulo Guedes tem risco de ser efêmero

31 mar 2022, 17:18 - atualizado em 31 mar 2022, 17:18
Paulo Guedes
Corte de impostos de Guedes tem risco de ser efêmero (Imagem: Reuters/Adriano Machado)

O plano do ministro da Economia, Paulo Guedes, de cortar impostos com base nos recentes recordes de arrecadação pode se tornar um de seus legados, mas corre o risco de ter vida mais curta do que o esperado.

Nos últimos dois meses, o governo abriu mão de uma receita de R$ 39 bilhões ao reduzir impostos sobre gás de cozinha, diesel e vários tipos de mercadorias. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) foi inicialmente reduzido em 25%, mas esta semana a queda chegará a 33%.

Agora, Guedes quer aumentar a lista de produtos com imposto de importação zerado e até um corte adicional de IPI não está descartado.

As medidas vêm como uma última tentativa de reduzir a carga tributária do Brasil, uma das mais pesadas entre as economias emergentes, já que a aprovação de uma reforma tributária mais ambiciosa parece cada vez mais improvável com as eleições presidenciais a apenas seis meses de distância. Desde que assumiu o cargo em 2019, Guedes viu a maior parte de sua agenda de austeridade e privatizações parar no Congresso ou ser derrubada pela pandemia.

O ministro tem dito que os cortes fazem parte de um plano para amenizar o impacto da inflação que está acima de 10% ao ano, além de ajudar a reindustrializar o país. Sua estratégia tem como uma de suas bases um relatório da Secretaria de Política Econômica, publicado em setembro passado, que concluiu que a receita tributária do Brasil cresceu “estruturalmente” em cerca de R$ 100 bilhões em 2021.

No entanto, as conclusões do relatório não são consensuais nem mesmo dentro da equipe de Guedes, segundo duas pessoas com conhecimento do assunto que pediram anonimato porque a discussão não é pública. Ainda é cedo para saber se o crescimento da arrecadação é, de fato, estrutural, disse uma das pessoas.

O Observatório Fiscal da Fundação Getúlio Vargas também expressou preocupação. “Esse número está longe de ser corroborado pela realidade, devido ao uso inadequado de métodos comparativos e também ao uso inadequado do termo ‘estrutural’ para se referir ao efeito da alta inflação nas receitas tributárias”, disseram economistas da instituição independente em relatório publicado em dezembro.

A arrecadação saltou 17,35% no ano passado, para R$ 1,9 trilhão, acima da inflação, mesmo com a perda de força da recuperação pós-pandemia. A maior economia da América Latina, cujas contas fiscais há muito preocupam investidores e economistas, deve crescer apenas 0,5% este ano.

Procurado, o Ministério da Economia não comentou o assunto.

Custo macroeconômico

“Uma coisa é implementar cortes de impostos limitados. Mas fazer isenções de proporções macroeconômicas em um país onde a inflação está acima de 10% e os juros são altos é outra coisa”, disse Manoel Pires, um dos economistas responsáveis ​​pelo relatório da FGV, em entrevista nesta semana.

O ministro agora trabalha por incentivos fiscais, sob o argumento de que a receita maior do que o esperado que entrou nos cofres do governo nos últimos meses deve ser devolvida à sociedade. “Sou um liberal, devemos colocar limites aos impostos”, disse em um evento recente. “O povo não pode continuar sofrendo com impostos altos, como sempre acontece no Brasil.”

Segundo Pires, os cortes de impostos feitos por Guedes até agora ainda são defensáveis ​​e devem fazer parte de uma reforma tributária maior que o Brasil não conseguiu aprovar no Congresso. Ainda assim, esse movimento tem que ser feito com cuidado.

Guedes é um crítico de longa data da carga tributária brasileira, uma das maiores entre as economias emergentes. Segundo o Ministério da Economia, ficou perto de 32% do PIB em 2020. O sistema tributário do país também é complexo e caro para as empresas, pressionando a inflação de dois dígitos que obrigou o Banco Central a fazer um dos ciclos de alta de juros mais agressivos do mundo.

Pires, da FGV, alertou que “isenções fiscais muito grandes e arbitrárias estimularão a demanda”, enquanto o Banco Central luta para conter o aumento de preços.

“Terá um custo macroeconômico além de um custo fiscal”, afirmou.

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