Corretoras se adaptam ao home office em meio a caos de pandemia
Além da forte volatilidade nos mercados, as corretoras de valores mobiliários estão se adaptando a um estilo diferente de trabalho em meio à pandemia do Covid-19, conforme buscam manter o ritmo de suas operações diante de quarentenas que colocaram boa parte de seus profissionais em esquema home office.
“É um desafio enorme pegar 2.300 pessoas da noite para dia e mandá-las trabalhar de casa. Para conseguir operacionalizar isso, tivemos que comprar um número grande de equipamentos, prepará-los e enviar para todos os colaboradores. O time virou noite para conseguir dar conta de tudo em tempo recorde”, afirmou o diretor de tecnologia da XP Inc (XP), Thiago Maffra.
“Nós vemos áreas inteiras trabalhando de casa e com entregas até mais eficientes do que antes”, acrescentou. “O grande desafio agora é manter a comunicação no ambiente de home office, mas as ferramentas que utilizamos têm dado conta do recado. A XP Inc é dona das plataformas XP Investimento, Clear e Rico.
O fato de parcela majoritária das operações, tanto de investidores institucionais como de pessoas físicas, já ser via meio eletrônico atenua os efeitos, principalmente nas casas com a tecnologia como pilar das plataformas.
Na Genial Investimentos, onde 95% dos funcionários estão em home office, o copresidente-executivo Cláudio Pracownik destacou que a tecnologia vem se provando uma grande aliada. “Não tivemos qualquer impacto na nossa produtividade nem no atendimento dos clientes.”
O executivo conta que as reuniões têm ocorrido por videoconferências, os funcionários têm acesso seguro à rede e os ramais estão todos conectados à internet (VoIP), com a telefonia funcionando normalmente como se estivessem no escritório.
Para os profissionais que continuam nos escritórios, as corretoras adotaram medidas como álcool em gel nas mesas, limpeza constante dos ambientes e distanciamento entre os colaboradores, em alguns casos até em andares diferentes.
“Nós estamos aprendendo”, afirma o diretor e sócio da Nova Futura João Ferreira. Na corretora, os profissionais foram divididos em três equipes, com uma trabalhando no escritório e duas fora, em esquema de rodízio a cada duas semanas. “Mesmo o pessoal que fica dentro estamos separando em ambientes diferentes, aumentando a distância entre as pessoas.”
Na Genial, apenas mesa de operações e poucas pessoas da áreas de suporte, sobretudo em departamentos como de TI, seguem atuando presencialmente. “Essas áreas garantem a estabilidade dos sistemas, a melhor execução das ordens de clientes em tempo real via mesa, por exemplo”, disse Pracownik.
Na BGC Liquidez, o presidente Erminio Lucci contou que as reuniões estão ocorrendo por meio de aplicativos, como o Zoom, enquanto o “delivery” tem sido a opção da maioria da equipe que permaneceu trabalhando nos escritórios, uma vez que restaurantes estão na lista de serviços que foram suspensos pela quarentena.
Ele disse que a maior parte dos funcionários que responde pelas áreas de suporte e que têm pouco ou nenhum contato com cliente, conhecida como “back office”, está trabalhando de casa, mas a equipe de “front office”, que trabalha com clientes, tem parte trabalhando em casa e parte nos escritórios no Rio de Janeiro e São Paulo.
“Não está fácil o gerenciamento do dia a dia, principalmente com tantas variáveis com pouca visibilidade”, admitiu, ressaltando, contudo que estão conseguindo atender a base de clientes. “Essa é a boa notícia.”
Emocional
Ferreira chamou a atenção também para o efeito emocional dos profissionais no momento. “O problema não é comunicação, tecnologia, é a cabeça… Todos trabalham super bem, mas o (componente) emocional está muito forte”, afirmou. “Há uma combinação de preocupação com a saúde com um efeito econômico devastador, isso gerou um pânico tremendo”, acrescentou.
Ele citou, contudo, que depois de quase duas semanas desde que a quarentena foi decretada no Estado de São Paulo, “o pessoal começou a entender melhor a realidade, e a situação está mais calma”.
O “circuit breaker”, mecanismo que suspende as negociações na bolsa quando o Ibovespa registra quedas a partir de 10%, foi acionado seis vezes apenas em março e o dólar renovou máximas históricas nominais em relação ao real, com forte volatilidade.
Na visão Pracownik, as mudanças de comportamento que estão se estabelecendo agora tendem a deixar um legado muito importante para a etapa pós-epidemia. “As pessoas estão se acostumando a trabalhar de uma nova forma e entendendo que o trabalho remoto além de conveniente pode ser muito eficiente.”
Maffra, da XP Inc, concorda. “Após essa crise, não tenho dúvidas de que essa questão do home office será muito praticada. É uma mudança que trará benefícios para todas as empresas no pós-crise.”
A avaliação nas corretoras, contudo, é de que é muito cedo para decisões sobre qualquer mudança nas estruturas de trabalho, em espaços físicos, mesmo com a percepção de que pode significar economias em custos com alugueis de escritórios, principalmente com o horizonte de retração econômica no país em 2020.