Contra o “comunavírus”, “gabinete do ódio não paga a conta”, mas frita Tereza Cristina
O processo de fritura da ministra Tereza Cristina segue em curso e vai se retroalimentando na medida em que o Brasil mantém sua postura de criticar a China, direta e indiretamente, pela pandemia e pelo “comunavírus”, como chamou esta madrugada o chanceler Ernesto Araújo em texto publicado em suas redes sociais.
A titular do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento várias vezes defendeu o pragmatismo do comércio contra as provocações ao maior importador de produtos brasileiros. E isso despertou mais a fúria, com ataques nas redes sociais, comandados pelo “gabinete do ódio que não tem conta para pagar”, salienta Pedro de Camargo Neto, conselheiro da ministra enquanto montava seu gabinete e parte de sua política.
O presidente Jair Bolsonaro ainda não tratou de defendê-la decisivamente contra o chamado “gabinete do ódio”, de onde parte os ataques, nem tampouco reprendeu pública e definitivamente seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL) e o ministro da Educação, Abraham Weintraub.
Partiu deles – considerados membros desse grupo de bolsonaristas nascidos pelo impulso do guru do governo, Olavo de Carvalho, e do segundo filho presidencial, o vereador Carlos Bolsonaro (Repulicanos-RJ) –, os ataques mais diretos a Pequim, com duras respostas do embaixador chinês em Brasília.
Várias entidades do agronegócio manifestaram apoio à titular do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), mas balanceiam a defesa da gestão do Mapa com cuidados políticos. Embora vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Camargo Neto transita em raia própria, como outro líder veterano do agronegócio, Sebastião Guedes.
No cerne do debate, está o alinhamento irrestrito do Brasil aos Estados Unidos, outro crítico da China, e a dúbia posição do governo com Pequim. “Os Estados Unidos não possuem amigos, têm interesses”, diz Guedes, até dezembro presidente da Câmara Setorial da Pecuária de Corte, órgão de assessoramento da ministra, que o queria dando continuidade.
Preço alto
Na mesma linha, o vice da Rural lembra da vitória que o Brasil teve sobre os Estados Unidos na Organização Mundial de Comércio (OMC), no começo dos anos de 2000, contra os subsídios ao algodão, quando ele liderou a disputa enquanto secretário de Produção e Comercialização do Mapa. Os Estados Unidos também se diziam amigos do Brasil, então.
As provocações à China podem cobrar um preço alto, a começar porque o país “tem um governo central forte, que proporciona um poder de recuperação também elevado”, e que pode enfrentar desafios, complementa Camargo Neto.
Desafios, mas não desaforos. O Brasil não são os Estados Unidos que podem desafiar e desaforar os chineses.
Por que provocar nosso maior comprador?, pergunta ele, recordando, por exemplo, que a China agora está usando seu poder “de armazenagem estatal e subsidiado para fazer estoques”. Além do Brasil precisar da China agora, quando a capacidade de estocagem brasileira se esgota nos caminhões, ele lembra que vamos precisar muito depois que a pandemia declinar e a economia precisar acelerar para sair do limbo recessivo.
A China já anunciou mais compras de soja dos Estados Unidos e certamente vai começar a comprar carne bovina também. É o acordo comercial entre os dois gigantes entrando em cena.
Os dois principais itens do agronegócio brasileiro exportados para lá vão sofrer concorrência, ainda que o fornecimento brasileiro não possa ser relegado pelos chineses, a redução haverá e algum produtor vai pagar essa conta.
O risco é as críticas forçarem um grau maior de corte das importações chinesas, coisa que certamente está no radar da ministra Tereza Cristina, como pensa Sebastião Guedes, hoje no Conselho de Agronegócio da Fiesp e até março vice-presidente do Conselho Nacional da Pecuária de Corte (CNPC).