Economia e meio ambiente juntos: Soluções Baseadas na Natureza têm potencial para resolver desafios de forma mais barata, ecológica e eficiente
Imagine que você vive em uma cidade que, por ter ocupado áreas muito próximas a rios, sofre constantemente com inundações. Diante desse cenário, existem duas soluções hipotéticas:
- Uma megaobra de engenharia, caríssima e que sufocaria ainda mais o curso do rio;
- A estruturação de um parque alagável em épocas de cheias, com custo menor, e que poderá ser usado para o lazer da população, com retornos econômicos..
Considerando que as duas intervenções sejam eficazes do ponto de vista da inundação, a segunda é claramente mais interessante: mais barata, ecológica e promovendo qualidade de vida para a população.
O exemplo dado acima é real e corresponde à ideia executada no Parque Barigui, em Curitiba (PR), criado para armazenar a água da chuva, preservar a margem do rio e reduzir o impacto das enchentes. O projeto da década de 1970 deu certo e foi replicado em outros pontos da cidade, contribuindo para a contenção de cheias, manutenção de áreas verdes e uso dos parques para o lazer.
Segundo estudo elaborado pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, para além do ganho ambiental, cada R$ 1,00 investido no Parque Barigui retorna R$ 12,50 em benefícios para a população curitibana.
A intervenção é um exemplo de um conceito moderno para ajudar a sociedade a mitigar e se adaptar às mudanças climáticas: as Soluções Baseadas na Natureza (SBN).
“As cidades e a intervenção humana transformaram e modificaram os fluxos da natureza. Muitas vezes, a solução de problemas consiste em reconectar esses fluxos. Assim, desafios como ilhas de calor, enchentes, abastecimento de água e até mesmo sociais podem ser resolvidas com ações híbridas, que integrem engenharia e natureza – e são mais baratas de serem implementadas”, explica a paisagista urbana Cecília Herzog, consultora em SBN e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN).
As SBN, portanto, não são ações cujo objetivo está concentrado apenas na crucial pauta da conservação do meio ambiente, mas sim no enfrentamento de outros problemas, valendo-se da natureza para isto.
“Uma Solução Baseada na Natureza precisa ser multifuncional, trazendo benefícios para as partes envolvidas. Numa cidade, pode-se criar uma fonte de lazer, de geração de renda ou melhorar a mobilidade, por exemplo. E não é um conceito a ser aplicado apenas pelo poder público, mas também pela iniciativa privada”, reitera Cecília.
O que é uma Solução Baseada na Natureza (SBN)?
As SBN são ações que usam processos e ecossistemas naturais para enfrentar desafios urgentes da sociedade, como a escassez hídrica ou impactos de eventos climáticos extremos que refletem na segurança e na saúde da população. Para padronizar ações de conservação do meio ambiente, especialistas globais definiram as Soluções Baseadas na Natureza em projetos que reúnem oito atributos:
- Relacionam-se a problemas e desafios reais;
- Podem ser escaladas, ainda que desenhadas/testadas para um local específico;
- Trazem benefícios para a biodiversidade e o ecossistema;
- São viáveis economicamente;
- São pautados pela governança e transparência;
- Entregam múltiplos benefícios;
- São ajustáveis;
- São sustentáveis no longo prazo.
Mudanças climáticas vão pesar cada vez mais no bolso de investidores e da sociedade
O conceito de SBN vai de encontro justamente a uma falácia de que a preservação do meio ambiente não combina com o desenvolvimento econômico.
Contudo, essa suposta oposição está limitada a projetos de curto prazo, que podem trazer consequências desastrosas no futuro.
“Existe uma relação de dependência entre a economia global e a natureza. Qualquer negócio, de maneira mais ou menos direta, depende de algum recurso natural, como a disponibilidade de água, o equilíbrio do clima ou a polinização, entre outros”, explica Guilherme Karam, gerente de economia da biodiversidade da Fundação Grupo Boticário.
Como exemplo, um estudo realizado pela revista Nature, referência na área científica, concluiu que o PIB global pode ser reduzido em até 20%, até 2050, em função das mudanças climáticas.
“A degradação da natureza gera um retorno econômico intenso de curto prazo, mas isso se esgota e, no longo prazo, a tendência é de prejuízo”, reitera Karam.
Segundo o especialista, menos de 1% do PIB global é direcionado para a conservação da natureza e, para que o investimento ideal seja alcançado, não basta a ação do poder público e de instituições filantrópicas: o setor privado também precisa colaborar.
“A ótica tradicional de investimentos olha para risco e retorno. Agora, há de se pensar no impacto ambiental do negócio – e não só para evitar o negativo, mas promover o positivo – justamente o propósito das SBN”, explica.
Investimentos precisam ter “lente climática”
Para além do aporte de recursos em si, é fundamental que todo investimento, mesmo que não tenha na conservação do meio ambiente o seu core, observe o aspecto ambiental.
“Todo financiamento hoje precisa ter uma lente climática. Mais do que isso: não podemos utilizar os recursos para seguir fazendo mais do mesmo. Por exemplo, a reconstrução do Rio Grande do Sul não pode se pautar em impermeabilizar a área novamente”, explica Juliana Ribeiro, gerente de projetos da Fundação Grupo Boticário.
De acordo com Juliana, uma das frentes da Fundação Grupo Boticário no momento é promover o desenvolvimento de projetos de SBN. Por serem viáveis economicamente e resolverem desafios, eles são capazes de alavancar o financiamento de projetos ambientais.
“As cidades dizem que falta financiamento. Os financiadores, dizem que faltam bons projetos. Queremos fechar esse gap, e as SBN são esses projetos que atraem a atenção dos bancos, por exemplo, e que mantém a biodiversidade no ambiente urbano”, conclui.
Fundação Grupo Boticário: unindo a conservação do meio ambiente aos interesses econômicos e sociais
O apoio da Fundação Grupo Boticário ao desenvolvimento e implementação de Soluções Baseadas na Natureza conecta-se com o principal objetivo da instituição: trabalhar a agenda da conservação da biodiversidade no Brasil.
“Nossa missão é conservar a biodiversidade sem deixar de olhar para os benefícios sociais e econômicos, com a estratégia de promover a adaptação da sociedade brasileira às mudanças climáticas usando a natureza”, explica Juliana.
A Fundação foi criada em 1990, antes da Rio-92, a primeira reunião multilateral para tratar de um plano de ação global contra as mudanças climáticas.
Uma de suas principais ações que envolvem SBN é o movimento Viva Água, iniciativa multiatores que busca promover a segurança hídrica por meio da conservação de mananciais que abastecem as regiões metropolitanas de Curitiba (PR) e do Rio de Janeiro (RJ). O movimento deve chegar a outras bacias hidrográficas importantes para o abastecimento da população em outras regiões do Brasil nos próximos cinco anos.
Outra frente de destaque é o apoio a empreendedores e projetos que geram impacto positivo para o meio ambiente. A ideia é ajudar a iniciativa a se manter de pé até que seja viável financeiramente para caminhar sozinha.
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