Internacional

Conferência debate papel dos jovens ante a crise na América Latina

14 jan 2020, 21:28 - atualizado em 14 jan 2020, 21:28
Protesto Chile
Para Cardona, os adolescentes da América Latina estão se sentindo cansados e revoltados, pois os governos de seus países “não os escutam e nada muda” (Imagem: REUTERS/Goran Tomasevic)

Os adolescentes da América Latina precisam ser reconhecidos como atores nas reformas sociais em seus países. A opinião é do professor de Direito Internacional Público da Universidade de Valência e ex-integrante do Comitê dos Direitos da Criança das Nações Unidas, Jorge Cardona.

Ele participou hoje da conferência Infância e Juventude frente a Crise e Conflitos Sociais na América Latina e no Caribe – Balanço e Perspectivas, que aconteceu na Cidade do México.

Para Cardona, os adolescentes da América Latina estão se sentindo cansados e revoltados, pois os governos de seus países “não os escutam e nada muda”.

“Acho fundamental dizer que os adolescentes são vítimas da violência, sendo utilizados pelo narcotráfico, gangues, crime organizado. São vítimas da exclusão social, da criminalização. A desigualdade e a violência não melhoram. A participação dos jovens mudou [através de redes sociais e outros sistemas de participação] nos protestos em todos os continentes e, muito particularmente nos países da América Latina, como no México, Peru, Bolívia, Chile, Argentina. Mas há um sentimento de cansaço, de rebeldia, pois não os escutam e nada muda”, disse o professor.

A conferência é organizada pela Rede Latinoamericana e Caribenha pela Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes (Redlamyc) e pela organização Tecendo Redes Infância (Tejiendo Redes Infancia); e contou com a participação de outros dois especialistas, a equatoriana Sara Oviedo e o argentino Norberto Liwski, ambos ex-membros do Comitê dos Direitos da Criança das Nações Unidas.

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Para Norberto Liwski as desigualdades na América Latina se aprofundaram nos últimos anos (Imagem: REUTERS/Henry Romero)

Iniciativas

Para a especialista Sara Oviedo, a região tem vários exemplos de iniciativas positivas.

“A América Latina está regada de iniciativas positivas, de [organizações não governamentais] ONG’s e organismos de cooperação que implementam programas e projetos de defesa e proteção das crianças e adolescentes. No Equador, fizemos uma coalizão nacional contra o abuso sexual. Está contemplado o combate ao abuso sexual no sistema educativo, nas famílias, nas igrejas. Os abusos acontecem nos estabelecimentos onde se ensina esportes, música, ginástica, etc. Realmente é um tema muito preocupante e aqui no Equador tem bastante visibilidade neste momento”.

Sara lembrou que, nos últimos 20 anos, diversas manifestações no Chile, por exemplo, tiveram início por iniciativa dos estudantes do país.

“Os primeiros antecedentes foram em 2001, no processo autodenominado mochilazo, quando através de mobilizações, os estudantes protestaram contra as tarifas de transporte. Em 2006, o movimento pinguino – que tinha este nome pela forma e cor dos uniformes dos alunos –, começou com uma manifestação de colégios. Eles demandavam melhores condições de infraestrutura de ensino. Em 2011, os estudantes novamente voltaram às ruas, para demandar mudanças no sistema educacional”.

A especialista conta que os estudantes que participaram das manifestações de 2001, 2006 e 2011 hoje já estão mais velhos e sabem que as mobilizações levam a uma de estruturas: “Eles ocupam cargos diversos em instituições públicas e privadas e isso permite que dêem apoio aos estudantes de hoje”. Para ela, a participação dos adolescentes é uma participação política, que luta pela mudança da atual situação de desigualdade que existe na região.

Para Sara, a sociedade chilena reconhece os estudantes como os que lideraram processos de mudança, no entanto, denunciou a violência com que foram tratados durante os protestos deste ano, “sendo atacados, presos, torturados e massacrados”.

Desigualdades

Para Norberto Liwski, pediatra e assessor do Instituto Interamericano da Criança (Instituto Interamericano del Niño -IIN), as desigualdades na América Latina se aprofundaram nos últimos anos. Segundo ele, em 2012, 45% da população da região vivia na pobreza e 12% na pobreza extrema. Metade deles sendo crianças e adolescentes.

Entre os anos de 2012 e 2014, a pobreza caiu um pouco, tendo voltado a crescer entre os anos de 2014 e 2019. “Em 2019, voltamos a 31% de pobreza e 12% de pobreza extrema, as crianças representando quase 50% dessa população”, disse Liwski.

Para o especialista, uma das principais áreas afetadas é a educação. “Com o aumento da desigualdade na região, 77% dos estudantes que estão na pobreza extrema, pobreza ou que têm baixos ingressos [na escola], não completam o ensino médio”.

“É fundamental que os países tenham políticas ativas e profundas e que abarquem os diversos setores sociais, de promoção, proteção e integração social que promovam os direitos das meninas, meninos e adolescentes”, defendeu Liwski.