Como Lula pode driblar autonomia do Banco Central (e por que plano pode dar errado)
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva travou uma batalha contra o Banco Central por causa da taxa Selic, que está sendo mantida em 13,75% ao ano desde agosto. Para o presidente, a taxa básica de juros está muito alta e até começou a questionar se a autonomia do Banco Central foi uma boa decisão.
Atualmente, Lula não tem força política para rever a independência do Banco Central. Ele precisaria levar esse assunto para o Congresso, mas o governo tem outras prioridades, como a reforma tributária e o desenho de um novo arcabouço fiscal.
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Por isso, Lula pode usar a meta de inflação para tentar driblar a autonomia do Banco Central. Em janeiro, em entrevista a GloboNews, o presidente afirmou que a meta de inflação era muito baixa.
“Você estabeleceu uma meta de inflação de 3,7% e quando faz isso é obrigado a arrochar mais a economia para poder atingir a meta. Por que não 4,5%, como nós fizemos?”, disse.
Na teoria, se a meta fica mais alta, a inflação do país – que está em 5,79% – estaria mais próxima do teto ou do centro e a Selic poderia ser reduzida. As metas de inflação para 2023 e 2024 são de 3,25% e 3%, respectivamente.
Meta alta não garante Selic baixa
No entanto, na prática, a história é bem diferente. O Itaú projeta que o Banco Central pode elevar a taxa Selic para um patamar de 15% caso o presidente insista na ideia de mudar a meta de inflação de 4,5% em 2024.
O banco destaca, em relatório, que elevar a meta de inflação do atual patamar seria percebido como pouco compromisso da política econômica, resultando em inflação mais alta à frente.
O cientista político Alberto Carlos Almeida aponta que o risco de se aceitar mais inflação é que, em algum momento, o indicador começa a subir e o Banco Central precisará elevar os juros novamente para combater a alta nos preços.
“Você não combina com a inflação: ‘Olha, você vai subir um pouquinho e fica nesse nível’. A inflação pode lentamente fugir do controle e, mais na frente, será necessário combatê-la e de novo vamos ver a pressão para juros altos”, afirmou em áudio para o Bastidor da Política.
Volta da meta de inflação antiga
A opção de revisão da meta de inflação não é descartada nem pelo presidente do Banco central, Roberto Campos Neto. Segundo Igor Gadelha, colunista do Metrópoles, o presidente do Banco Central sinalizou a integrantes do governo que deve defender uma mudança na meta de 2023.
A principal razão nem seria o embate com Lula, mas sim que o Banco Central não cumpriu as metas estabelecidas para os anos 2021 e 2022.
O plano é elevar a meta de 3,25% para 3,50% (meta do ano passado), sendo que será mantida a margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.
Banco Centra x Governo
Quem define a meta da inflação é o Conselho Monetário Nacional (CMN) e três pessoas fazem parte dessa decisão: Campos Neto e os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet.
“Os ministros são de livre nomeação do presidente da República. Então, ele pode se reunir com ambos e definir politicamente qual deve ser a meta da inflação. Com isso, são dois votos contra um do presidente do Banco Central, caso haja uma discordância”, destaca Alberto Carlos.
No começo da semana, Haddad confirmou ter conversado com Tebet sobre o tema. A ministra é considerada o voto de Minerva nessa história, uma vez que o ministro da Fazenda é um aliado próximo de Lula e Campos Neto está na oposição, aos olhos do governo.
A reunião de decisão da meta será em maio, mas no dia 16 de fevereiro deve acontecer a primeira reunião do CMN. Na ocasião, Campos Neto, Haddad e Tebet já devem começar a discutir o tema.