Opinião

Como a estrutura de mercado pode definir a eficácia do salário mínimo

25 jan 2019, 9:30 - atualizado em 24 jan 2019, 16:53

Em seu início de mandato, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou um decreto que fixa o salário mínimo em R$ 998, valor esse que era previsto em R$ 1.006 de acordo com o governo anterior de Michel Temer.

É muito comum, as pessoas julgarem a fixação do salário mínimo como boa ou ruim em detrimento de seu valor, porém salários mínimos são nada mais do que incentivos que alteram a oferta e procura no mercado de trabalho. Ademais, o salário mínimo pode ser mais ou menos eficaz de acordo com a estrutura de mercado onde esse piso salarial é inserido.

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Como Funciona o Salário Mínimo no Brasil

De acordo com a Lei Nº 185 de Janeiro de 1936, e o Decreto-Lei Nº 399 de Abril de 1938, o salário mínimo brasileiro foi instaurado focando na premissa que todo trabalhador tem direito, em pagamento do serviço prestado, de um salário mínimo capaz de satisfazer, em determinada região do país e em determinada época, das suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte.

Após ambas as leis serem inseridas, haviam distintos salários mínimos por todo o Brasil, até que em 1984 o piso salarial se unificou em todo o país. Leis como a do salário mínimo, procuram resolver distorções financeiras que acontecem entre empregadores e funcionários. Essas distorções ocorrem quando o chefe paga um valor muito menor a seu funcionário pelo serviço produzido, reduzindo assim seu poder de compra e portanto seu bem estar.

Embora a política do salário mínimo busque resolver o problema de salários injustos ao trabalhador, em caso do salário fixado ser maior que o anterior, tal política cria incentivos para que mais pessoas oferecem sua mão de obra.

Em qualquer mercado de bens e serviços, existe um preço que simultaneamente as pessoas querem vender o seu produto, e ao mesmo tempo as pessoas querem comprar o produto oferecido. Neste preço, a quantidade de bens e serviços oferecidos, é exatamente a mesma em relação a quantidade de bens e serviços que as pessoas estão dispostas a comprar.

Na economia, é chamado de preço de equilíbrio o preço cuja a quantidade de bens e serviços é a mesma para quem está disposto a comprar e vender. Em uma situação de empregadores e trabalhadores, a ideia de preço de equilíbrio também funciona e o preço de equilíbrio pode ser chamado de “salário de equilíbrio”. Se o salário mínimo for maior que o salário de equilíbrio, surgirá uma mão de obra maior que a quantidade de pessoas dispostas a comprá-la, e isso pode causar problemas socioeconômicos como o desemprego e preconceito. Tal situação acontece por conta dos efeitos do preço mínimo em cima das forças de mercado.

Efeito de preços mínimos nas forças de mercado

Em seu livro “Introdução à Economia”, o professor de Harvard Gregory Mankiw afirma que a economia possui dez princípios, e um desses princípios é a ideia de que agentes econômicos reagem a incentivos. Por conta desse princípio, a fixação de um preço mínimo para um produto ou serviço, pode alterar a quantidade de pessoas que desejam comprar esse produto ou serviço, assim como pode alterar a quantidade de pessoas que oferecem esse produto ou serviço.

Como exemplo, imagine que em uma cidade estejam sendo vendidos sorvetes no valor de R$ 2,50. Também imagine que a quantidade de sorvetes a serem vendidos pelos sorveteiros por R$ 2,50 seja de 300 unidades. Se formos representar esse mercado de sorvetes graficamente, poderíamos imaginar uma reta azul, apelidando-a de “O”. Essa reta possui um comportamento ascendente, ou seja, vai subindo para o lado direito e representa a quantidade de sorvetes oferecida pelos vendedores conforme o preço do sorvete fica maior. Na economia, é mais conhecida como “Curva de Oferta”.

Podemos imaginar uma nova reta, com a cor vermelha, chamando-a de “D”. Essa reta D decresce para a direita, pois o comportamento do consumidor é de adquirir uma quantidade maior de sorvete conforme seu preço vai caindo. Na economia é popularmente chamada de “Curva de Demanda”.

Na situação de equilíbrio, a quantidade ofertada por quem vende sorvetes é exatamente a mesma em relação a quantidade de sorvetes a ser compradas. Além disso, o preço dos sorvetes é exatamente o mesmo que os vendedores querem vender e os consumidores podem comprar.

Agora imagine que exista uma associação chamada “Associação dos Sorveteiros Unidos”. Essa associação acredita que o preço cobrado pelos sorvetes é muito pequeno, e tal valor prejudica os trabalhadores em termos de margem de lucro e poder de compra. Por ser organizada, essa associação consegue facilmente maior organização política, e por conta disso,  essa associação de sorveteiros procura fazer lobby com políticos e então é aprovado um projeto de lei que coloca o preço mínimo do sorvete em R$ 4,50.

De início, os sorveteiros comemoram, fazem churrasco, tocam som alto em praça pública e soltam fogos. Mas ao aumentar o preço dos sorvetes em R$ 4,50, a quantidade demanda pelo público por sorvetes cai de 300 para 270 unidades. Além disso, incentivados por maiores margens de lucro, surgem novos sorveteiros dispostos a vender seu sorvete por R$ 4,50. Sendo assim, haverá um aumento de 330 unidades na quantidade ofertada de sorvetes, quantidade essa que é superior em relação a quantidade de sorvetes que as pessoas querem comprar ao preço de R$ 4,50. Logo, haverá o que é chamado na economia de “Excesso de Oferta”.

No gráfico acima, os primeiros 270 sorvetes serão vendidos ao preço de R$ 4,50, já os 60 sorvetes excedentes não serão vendidos e são considerados como um excesso de oferta. Esse excesso existe porque a quantidade ofertada é muito maior em relação a quantidade de demandada de sorvetes ao preço de R$ 4,50. Por conta desse excesso de oferta, os vendedores que tentaram vender os 60 sorvetes restantes, poderão ficar sem dinheiro para consumir bens e serviços que precisam.

Além disso, o excesso de oferta pode causar um maior poder de barganha ao consumidor de sorvetes. O consumidor poderá selecionar o seu vendedor em função de características físicas como sexo, etnia, idade ou qualquer fator intrinsecamente ligado ao vendedor que não tenha correlação com o sorvete a ser vendido. Isso ocorre porque o consumidor terá uma quantidade maior de sorvetes disponível para comprar, logo poderá utilizar na compra outros critérios além do sorvete em si.

Da mesma maneira que o caso dos sorveteiros gera uma quantidade de pessoas que não conseguem vender seus sorvetes, tal situação também pode ocorrer nas relações entre empregador e empregado. Caso o preço do salário mínimo esteja acima do equilíbrio, surgirão novos trabalhadores dispostos a oferecer seus serviços, o que culminará em excesso de oferta e essa oferta ficará desempregada.

Olhando sob o viés de desemprego, podemos pensar que o salário mínimo não é tão bom assim, entretanto existem situações onde o salário mínimo pode ser eficaz e isso pode depender da estrutura de mercado existente na região que o salário mínimo será inserido.

O que são estruturas de mercado?

Estruturas de mercado são formas que estudam como os bens e serviços estão ofertados e demandados entre si, assim como o comportamento dos agentes que participam de cada mercado na economia. As estruturas de mercado também estudam o número de agentes oferecendo bens e serviços, a quantidade ofertada assim como a quantidade demandada influenciando nos preços.

Uma estrutura de mercado muito conhecida na economia é o monopólio. Um monopólio é uma situação onde existe apenas o produto de uma empresa no mercado, e não há substitutos próximos desse bem ou serviço oferecido por outras firmas¹. Um monopólio ocorre por conta de uma barreira de entrada, que é uma maneira de impedir que outras empresas ofereçam o mesmo bem ou serviço no mercado.

Estrutura de mercado versus Salário Mínimo

Em 1930, surge da Universidade de Cambridge uma economista chamada Joan Robinson. Robinson lançou seu primeiro livro chamado “A economia da concorrência imperfeita”. Em sua obra, Robinson buscava entender a teoria dos monopólios, mas sim compreender mercados onde havia produtos semelhantes entre si e ao mesmo tempo um produto semelhante que se diferenciava dos demais por mais que fosse semelhante de seus concorrentes.

Por exemplo, imagine que você queira comprar um achocolatado no supermercado. Na prateleira, existem diversos achocolatados, muitos semelhantes entre si em termos de sabor e valor nutricional. No momento da escolha, você escolhe aquele achocolatado da marca que você mais se identifica, não se importando com seu preço e nem a qualidade em relação aos outros achocolatados. Robinson chama essa situação de “Concorrência Monopolista”, situação essa onde há produtos semelhantes entre si e mesmo assim existe um produto que consegue se diferenciar dos demais.

Em uma de suas reflexões, Robinson se perguntou “E se aplicássemos a teoria do monopólio no ponto de vista de quem compra o produto?”. Foi aí que Robinson chegou no que é conhecido hoje na economia como “Monopsônio”.

Monopsônio é uma estrutura de mercado onde existe apenas um comprador e diversos vendedores para comprar um bem ou serviço. Por exemplo, suponha que exista uma grande empresa que compre peixe de vários pescadores de determinada região no Norte brasileiro. Por conta da grande empresa ser a única compradora de peixes e haver diversos pescadores dispostos a vender seus peixes, a empresa poderá determinar o preço pelo qual irá pagar aos pescadores pelo cardume. Caso o valor pago pela empresa esteja abaixo do valor de que valem os peixes, a firma diminuirá o poder de compra dos pescadores da região e também o seu bem estar na região.

A situação dos pescadores também pode acontecer entre trabalhadores e empregadores em pequenas cidades. Para resolver esse problema, Robinson propôs a criação de um salário mínimo em situações onde existisse um monopsônio de qualquer grande empresa do mercado².

Se partirmos da ideia de Robinson, o salário mínimo pode ser mais eficaz em pequenas cidades, pequenas cidades que existem maior ocorrência de monopsônio e o trabalhador pode ser prejudicado. Já em metrópoles, onde existe um maior número de empresas, dispostas a comprar bens e serviços, o salário mínimo pode vir a não ser tão eficiente, pois pode causar excesso de oferta e os trabalhadores podem migrar a outras empresas, essas que comprarão o serviço do trabalhador a valor de mercado.

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