Com Rússia e Ucrânia em combate, onda de estrangeiros na Bolsa pode se prolongar?
A bolsa brasileira presenciou no início do ano uma forte entrada de investidores estrangeiros, que buscaram encontrar refúgio em mercados emergentes, sobretudo o Brasil, sob a iminência de uma escalada das tensões entre Rússia e Ucrânia.
Em janeiro, a entrada líquida de capital atingiu R$ 24,8 bilhões, equivalente a 35,1% do montante de 2021, de R$ 70,7 bilhões. O fluxo visto no primeiro mês deste ano também superou o patamar registrado em janeiro do ano passado, de R$ 23 bilhões.
Com o efetivo do ataque da Rússia em áreas separatistas do leste da Ucrânia na madrugada desta quinta-feira (24), investidores estão alertas aos próximos movimentos do governo russo e às implicações que isso terá para a economia global, estendendo a tendência de aversão a risco nos mercados internacionais.
Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, destaca que o Brasil pode ver um aumento no fluxo de investimentos no médio prazo. Cunha ressalta, no entanto, que não dá para considerar o país como “porto seguro” no cenário atual.
“Acho que não dá pra falar que o Brasil é um porto seguro para investimentos. Porto seguro seriam títulos soberanos de países desenvolvidos como os Estados Unidos, por exemplo, ou ouro, que é uma reserva de valor”, afirma.
A corrida em direção a portos seguros naturais está se confirmando, com a cotação do ouro subindo e os índices acionários operando em queda. O Ibovespa cai mais quase 1%.
Na avaliação de Pedro Galdi, analista da Mirae Asset, o fluxo estrangeiro tende a continuar e pode até se fortalecer com a crise na Ucrânia à medida que os investidores se desfazem de suas posições e passam a buscar por oportunidades mais atrativas.
Edmar de Oliveira, operador da mesa de renda variável da One Investimentos, também acredita que investidores estrangeiros continuarão procurando a bolsa brasileiro, pois dois fatores estão “jogando a favor” do mercado local: o grande peso das commodities e os juros reais.
“O Brasil, como um dos grandes países exportadores de commodities, pode sugar todo esse estoque de capital que está na Rússia hoje. O investidor, olhando para o Brasil como um país emergente, como a Rússia, e commoditizado, isso já traz outra atividade. Ao mesmo tempo, você tem um país com os maiores juros reais do mundo”, lembra.
Oliveira destaca ainda que empresas da bolsa com bom potencial de expansão estão sendo negociadas a múltiplos muito baixos.
Alexsandro Nishimura, economista e sócio da BRA, chama atenção para o risco de uma inversão da tendência positiva.
“O mercado ainda precisa entender a extensão do conflito, as eventuais sanções adicionais que devem ser anunciadas e as reações dos países do ocidente. Caso haja prolongamento dos conflitos, o dólar tende a ampliar sua valorização, com possível interrupção do fluxo de estrangeiros para mercados emergentes”, afirma o especialista.
Mauro Morelli, estrategista-chefe da Davos Investimentos, explica que a forte entrada de estrangeiros é resposta a uma realocação interna dos mercados emergentes e alta dos preços das commodities. Nos dois casos, Morelli vê upside limitado.
“O mais provável é que não, a gente não tenha um aumento desse fluxo nesses próximos meses. Pelo contrário: o mais provável é que isso diminua”, conclui.
Mercados em queda
Na madrugada desta quinta-feira (24), o conflito no Leste Europeu ganhou novas proporções. O presidente da Rússia, Vladimir Putin, autorizou uma operação militar em áreas separatistas do leste do país ucraniano.
O ataque liberado por Putin ocorreu horas depois que separatistas pró-Rússia pediram que Moscou ajudasse a impedir uma suposta agressão ucraniana.
Neste momento, combates estão acontecendo em praticamente todas as regiões do território da Ucrânia, informou a polícia ucraniana.
Os mercados repercutem os desdobramentos da invasão, com as bolsas europeias fechando em forte queda. Os mercados dos EUA, que abriram o dia também no campo negativo, reverteram as perdas e passaram a operar em alta depois do pronunciamento do presidente Joe Biden.
Às 16h45, o S&P 500 registrava leve alta de 0,14%, a 4.231,45 pontos. O Nasdaq Composite subia 1,75%, a 13.265,71 pontos.
No Brasil, o Ibovespa mantinha queda firme de 1,62%, a 110.190,48 pontos, no mesmo horário.
Por Diana Cheng e Renan Dantas