Com Lula como “coringa”, nova esquerda latino-americana busca futuro mais verde
Favorito a conquistar a presidência da Colômbia, Gustavo Petro quer, se vencer o pleito marcado para o final deste mês, interromper todas as novas explorações de petróleo e levar o país para um futuro mais verde.
A posição se alinha à do recém-empossado presidente do Chile, Gabriel Boric, um “millennial” que também prometeu assumir uma posição firme no combate às mudanças climáticas.
À medida que a América Latina vê o ressurgimento de uma guinada à esquerda, que até o final do ano deve governar a maior parte do continente, o tom “mais verde” de novos líderes contrasta com o “nacionalismo de recursos” da velha guarda, que costuma ver um controle rígido em energia e metais como o melhor caminho para o progresso econômico e a autodeterminação.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ser um coringa. Líder nas pesquisas de opinião para as eleições de outubro no Brasil, Lula há muito é identificado com o desenvolvimento petrolífero, mas ao mesmo tempo também busca estabelecer contrastes com o presidente Jair Bolsonaro, um cético das mudanças climáticas.
Lula evoca com frequência a prosperidade que marcou seu governo entre 2003 e 2011, quando um superciclo de commodities alimentado pelo aumento da demanda chinesa por aço, soja e outros produtos ajudou a encher os cofres do governo.
Ele também ocupava a Presidência quanto a Petrobras descobriu o pré-sal, uma reserva com cerca de 50 bilhões de barris de petróleo que foi vista como divisor de águas no combate à pobreza.
Em entrevistas recentes, o petista descartou sugestões de que seguiria o tom de Petro e evitaria projetos de petróleo potencialmente lucrativos.
Mesmo assim, o senador Humberto Costa (PT-PE), um aliado próximo de Lula, acredita que a transição energética deve se acelerar no Brasil caso a esquerda volte ao poder. Ele projeta um aumento na geração por fontes como solar, eólica e de biomassa.
“Acho que de novo, mesmo, vem essa questão da preocupação ambiental e energética. Acho que isso vai ter um papel relevante”, disse Costa. “Nossas políticas ambientais e energéticas foram boas (no governo anterior de Lula)… mas hoje essa questão ficou mais urgente e mais ampla.”
O senador afirmou também que Lula buscaria o “desenvolvimento autossustentável” na Amazônia, ao contrário de Bolsonaro.
Sem planeta, sem vida
No final deste mês, os eleitores colombianos irão às urnas para o primeiro turno da eleição presidencial local, na qual Petro, de 62 anos, pretende guiar a esquerda à primeira vitória em décadas.
O ex-guerrilheiro, que mais tarde se tornou parlamentar e prefeito de Bogotá, escolheu a ativista ambiental e estrela progressista em ascensão Francia Márquez como sua companheira de chapa.
Márquez, que pode vir a ser a primeira vice-presidente afro-colombiana, enfatizou em uma entrevista que ela e Petro romperiam com os conservadores do país, que há muito abraçam o petróleo e o carvão, mas também com colegas esquerdistas como o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, um defensor incondicional dos combustíveis fósseis.
“A questão é que tanto a esquerda quanto a direita estão fomentando uma política de extrativismo em um momento em que a humanidade enfrenta o desafio de fazer a transição desta economia extrativista para uma economia sustentável”, disse Marquez, de 40 anos, uma feminista vocal, à Reuters. “A vida não é possível sem nosso planeta.”
Petro prometeu interromper novas explorações de petróleo e gás, proteger os recursos hídricos e fornecer mais segurança aos ambientalistas na Colômbia — o país mais perigoso do mundo para esses ativistas.
No Chile, enquanto isso, uma nova lei deve obrigar o país a alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Empresas terão de se adaptar às novas “fronteiras” estabelecidas para limitar emissões e a poluição, disse o ministro do Meio Ambiente de Boric à Reuters na última sexta-feira.
Para líderes tradicionais de esquerda na América Latina, o controle e o uso de recursos estão relacionados a um legado de exploração que remete aos períodos coloniais — e muitas de suas políticas estão concentradas em afastar as mãos do capital privado estrangeiro de suas riquezas naturais.
No México, López Obrador conquistou no mês passado apoio do Congresso para nacionalizar a exploração de lítio, um metal crucial para a fabricação de baterias que o país ainda não produz.
Desde então, o líder mexicano disse que deseja se juntar a Chile, Argentina e Bolívia para avançar no desenvolvimento com ideias semelhantes.
Ele também buscou fortalecer o domínio da petroleira estatal Pemex e da empresa nacional de eletricidade CFE em seus respectivos setores, cancelando leilões de petróleo e energia renovável e priorizando o despacho de energia das usinas da CFE, mesmo que elas sejam predominantemente movidas a combustíveis fósseis.
Na Bolívia, um dos países mais pobres da região, o presidente socialista Luis Arce mostrou-se aberto a negociações com investidores do setor de gás natural.
O governo também espera anunciar ainda neste mês parcerias com empresas estrangeiras para iniciar a exploração das maiores reservas de lítio do mundo, em um momento de crescente demanda.
Na reta final da campanha na Colômbia, Márquez faz questão de evitar expectativas irreais para a agenda “verde” de Petro.
“Essa mudança acontecerá da noite para o dia? Não, não acontecerá em quatro anos. Mas precisamos de vontade política para dizer: ‘Sim, devemos começar a transição.'”
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