Política

Com Lula como “coringa”, nova esquerda latino-americana busca futuro mais verde

16 maio 2022, 7:33 - atualizado em 16 maio 2022, 7:33
Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ser um coringa. Líder nas pesquisas de opinião para as eleições de outubro no Brasil, Lula há muito é identificado com o desenvolvimento petrolífero (Imagem: REUTERS/Washington Alves)

Favorito a conquistar a presidência da Colômbia, Gustavo Petro quer, se vencer o pleito marcado para o final deste mês, interromper todas as novas explorações de petróleo e levar o país para um futuro mais verde.

A posição se alinha à do recém-empossado presidente do Chile, Gabriel Boric, um “millennial” que também prometeu assumir uma posição firme no combate às mudanças climáticas.

À medida que a América Latina vê o ressurgimento de uma guinada à esquerda, que até o final do ano deve governar a maior parte do continente, o tom “mais verde” de novos líderes contrasta com o “nacionalismo de recursos” da velha guarda, que costuma ver um controle rígido em energia e metais como o melhor caminho para o progresso econômico e a autodeterminação.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ser um coringa. Líder nas pesquisas de opinião para as eleições de outubro no Brasil, Lula há muito é identificado com o desenvolvimento petrolífero, mas ao mesmo tempo também busca estabelecer contrastes com o presidente Jair Bolsonaro, um cético das mudanças climáticas.

Lula evoca com frequência a prosperidade que marcou seu governo entre 2003 e 2011, quando um superciclo de commodities alimentado pelo aumento da demanda chinesa por aço, soja e outros produtos ajudou a encher os cofres do governo.

Ele também ocupava a Presidência quanto a Petrobras descobriu o pré-sal, uma reserva com cerca de 50 bilhões de barris de petróleo que foi vista como divisor de águas no combate à pobreza.

Em entrevistas recentes, o petista descartou sugestões de que seguiria o tom de Petro e evitaria projetos de petróleo potencialmente lucrativos.

Mesmo assim, o senador Humberto Costa (PT-PE), um aliado próximo de Lula, acredita que a transição energética deve se acelerar no Brasil caso a esquerda volte ao poder. Ele projeta um aumento na geração por fontes como solar, eólica e de biomassa.

“Acho que de novo, mesmo, vem essa questão da preocupação ambiental e energética. Acho que isso vai ter um papel relevante”, disse Costa. “Nossas políticas ambientais e energéticas foram boas (no governo anterior de Lula)… mas hoje essa questão ficou mais urgente e mais ampla.”

O senador afirmou também que Lula buscaria o “desenvolvimento autossustentável” na Amazônia, ao contrário de Bolsonaro.

Sem planeta, sem vida

No final deste mês, os eleitores colombianos irão às urnas para o primeiro turno da eleição presidencial local, na qual Petro, de 62 anos, pretende guiar a esquerda à primeira vitória em décadas.

O ex-guerrilheiro, que mais tarde se tornou parlamentar e prefeito de Bogotá, escolheu a ativista ambiental e estrela progressista em ascensão Francia Márquez como sua companheira de chapa.

Márquez, que pode vir a ser a primeira vice-presidente afro-colombiana, enfatizou em uma entrevista que ela e Petro romperiam com os conservadores do país, que há muito abraçam o petróleo e o carvão, mas também com colegas esquerdistas como o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, um defensor incondicional dos combustíveis fósseis.

“A questão é que tanto a esquerda quanto a direita estão fomentando uma política de extrativismo em um momento em que a humanidade enfrenta o desafio de fazer a transição desta economia extrativista para uma economia sustentável”, disse Marquez, de 40 anos, uma feminista vocal, à Reuters. “A vida não é possível sem nosso planeta.”

Petro prometeu interromper novas explorações de petróleo e gás, proteger os recursos hídricos e fornecer mais segurança aos ambientalistas na Colômbia — o país mais perigoso do mundo para esses ativistas.

No Chile, enquanto isso, uma nova lei deve obrigar o país a alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Empresas terão de se adaptar às novas “fronteiras” estabelecidas para limitar emissões e a poluição, disse o ministro do Meio Ambiente de Boric à Reuters na última sexta-feira.

Para líderes tradicionais de esquerda na América Latina, o controle e o uso de recursos estão relacionados a um legado de exploração que remete aos períodos coloniais — e muitas de suas políticas estão concentradas em afastar as mãos do capital privado estrangeiro de suas riquezas naturais.

Petro prometeu interromper novas explorações de petróleo e gás, proteger os recursos hídricos e fornecer mais segurança aos ambientalistas na Colômbia — o país mais perigoso do mundo para esses ativistas (Imagem: REUTERS/Luisa Gonzalez)

No México, López Obrador conquistou no mês passado apoio do Congresso para nacionalizar a exploração de lítio, um metal crucial para a fabricação de baterias que o país ainda não produz.

Desde então, o líder mexicano disse que deseja se juntar a Chile, Argentina e Bolívia para avançar no desenvolvimento com ideias semelhantes.

Ele também buscou fortalecer o domínio da petroleira estatal Pemex e da empresa nacional de eletricidade CFE em seus respectivos setores, cancelando leilões de petróleo e energia renovável e priorizando o despacho de energia das usinas da CFE, mesmo que elas sejam predominantemente movidas a combustíveis fósseis.

Na Bolívia, um dos países mais pobres da região, o presidente socialista Luis Arce mostrou-se aberto a negociações com investidores do setor de gás natural.

O governo também espera anunciar ainda neste mês parcerias com empresas estrangeiras para iniciar a exploração das maiores reservas de lítio do mundo, em um momento de crescente demanda.

Na reta final da campanha na Colômbia, Márquez faz questão de evitar expectativas irreais para a agenda “verde” de Petro.

“Essa mudança acontecerá da noite para o dia? Não, não acontecerá em quatro anos. Mas precisamos de vontade política para dizer: ‘Sim, devemos começar a transição.'”

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