Com Airbnb em baixa, Lisboa quer tratar déficit habitacional
Nas principais cidades turísticas ao redor do mundo, apartamentos usados por viajantes que não tinham reservas disponíveis um ano atrás agora estão vazios.
Com a quarentena e o isolamento social, o mercado de estadias curtas, dominado pelo Airbnb, não voltará aos níveis pré-pandêmicos tão cedo, se é que voltará algum dia. Nas cidades turísticas, não se sabe o destino de apartamentos que anteriormente eram usados por viajantes.
Em Lisboa, um plano pretende ocupar imóveis vagos, ao mesmo tempo em que trata do déficit de moradias de valor acessível, que foi exacerbado pelo coronavírus.
No segundo trimestre, a capital portuguesa lançou um programa para incentivar proprietários de imóveis utilizados para estadias curtas a colocá-los no mercado de aluguéis de longo prazo.
Relatos sugerem que isso já está acontecendo organicamente em muitas cidades. Lisboa está incentivando o processo ao eliminar o risco.
Proprietários participantes não alugarão suas propriedades para inquilinos individuais, mas para a própria cidade.
Sob o programa Renda Segura, proprietários que temem que seus apartamentos fiquem vazios podem inscrevê-los para aluguel pelo município, por um período mínimo de cinco anos.
A autoridade municipal se encarrega de encontrar inquilinos por meio de um programa habitacional para jovens e famílias de baixa renda.
O valor máximo dos aluguéis mensais é de 450 euros (US$ 509) para uma residência de um quarto e 1.000 euros (US$ 1.130) para uma casa espaçosa.
Para os proprietários, a renda gerada com esses aluguéis fixos pode ser menor do que eles poderiam obter com a locação para turistas, mas eles se livram de riscos e complicações, além de ficarem isentos de impostos sobre propriedade imobiliária e ganhos de capital.
Dados atualizados sugerem que, na Europa toda, proprietários de imóveis usados para estadias de curta duração precisarão buscar alternativas. Segundo a empresa de análises de aluguéis para férias AirDNA, as reservas no Airbnb e na plataforma rival Vrbo para a 29ª semana de 2020 (a partir de 13 de julho) caíram drasticamente em comparação com o mesmo período de 2019.
A queda interanual foi de 76% em Lisboa, 75% em Amsterdã e 74% em Paris. Nos estágios iniciais da pandemia, o recuo na demanda não foi acompanhado pela oferta: o número de apartamentos oferecidos para estadias de curto prazo na França diminuiu apenas 3,2% entre janeiro e março de 2020.
Pode ser um sinal de que, em condições de pandemia, os proprietários ainda receiam retirar seus imóveis das plataformas e assumir compromisso com inquilinos mais permanentes.
É cedo para afirmar se um plano como o de Lisboa é o caminho para as cidades deixarem os proprietários seguros o suficiente para migrar para os aluguéis de longo prazo, mas o programa já atraiu um pequeno número de interessados. A cidade anunciou na segunda-feira que 177 apartamentos foram aceitos desde a primeira rodada de inscrições, submetidas entre meados de maio e o final de junho.
Em uma cidade onde 25.000 apartamentos estão oficialmente registrados para aluguel de férias, esse aumento inicial na oferta de moradias com aluguel acessível talvez nem seja percebido.
Porém, se o programa continuar crescendo nos próximos anos (haverá outra rodada de inscrições em setembro e outubro), o efeito sobre a grave falta de moradias populares em Lisboa pode ser notável. Somente nos primeiros nove meses de 2017, quase 1.500 famílias foram despejadas do centro da capital.
Talvez tão significativo quanto seja atrair moradores para áreas centrais agora voltadas para o turismo. Quando os moradores deram lugar aos turistas, lojas e serviços de bairro desapareceram, substituídos por empreendimentos que atendem às necessidades instantâneas dos turistas.
O resultado é uma cidade que tem menos recursos para servir seus próprios habitantes, incentivando uma indústria turística que acaba prejudicando a própria vida urbana que atrai os visitantes.