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COEs com crédito colateralizado: quando o sonho do imóvel se transforma em pesadelo financeiro

22 out 2024, 15:15 - atualizado em 22 out 2024, 15:16
Imóveis Haddad ITBI imóvel coe
Produtos como o COE têm sido amplamente utilizados como uma ferramenta para reter clientes e seus patrimônios. (Imagem: 89STocker/ Canva Pro)

João e Maria, um casal jovem e trabalhador, tinham um plano claro para o futuro: adquirir um apartamento sem se endividar. Com um patrimônio de R$ 800 mil, fruto de uma herança e de anos de economia, o casal estava focado em realizar esse sonho.

A ideia era simples: continuar poupando e, quando tivessem o montante necessário, comprar o imóvel à vista, sem precisar de financiamentos. Esse era o caminho planejado para manter suas finanças saudáveis.

Foi então que, em meio a essa jornada de poupança, eles foram abordados por um assessor de investimentos de uma grande corretora. Ele apresentou uma proposta que parecia muito tentadora: acelerar a realização do sonho por meio de um planejamento financeiro bem estruturado e investimentos com retornos superiores aos de produtos conservadores, como o CDB que João e Maria costumavam utilizar.

O casal, inicialmente cético, decidiu confiar no assessor, que prometeu resultados que, segundo ele, poderiam viabilizar a compra do imóvel de forma mais rápida e eficiente.

Durante os dois primeiros anos, a carteira de investimentos montada pelo assessor até rendeu alguma coisa, mas nada muito diferente do que um CDB de banco poderia oferecer. No entanto, o casal seguiu com o plano, e, após esse período, finalmente atingiu o marco de R$ 1 milhão – o valor que tinham estipulado como necessário para comprar o tão sonhado apartamento.

Foi aí que veio o pedido de resgate do valor investido para, finalmente, concretizar o sonho. Mas, ao invés de apoiar a decisão de João e Maria, o assessor de investimentos, percebendo que perderia a custódia de R$ 1 milhão, propôs uma nova estratégia: por que retirar o dinheiro e deixar de investir, quando poderiam continuar com o capital aplicado e, ao mesmo tempo, realizar a compra do apartamento?

A proposta envolvia um Certificado de Operações Estruturadas (COE), com o capital nominal protegido, investido em ativos da bolsa americana, enquanto eles fariam um financiamento com crédito colateralizado pelo próprio COE para a compra do imóvel. Assim, eles manteriam o patrimônio investido e ainda comprariam o apartamento, com a promessa de que a rentabilidade do COE cobriria os encargos do crédito.

A oferta parecia irrecusável, mas o que João e Maria não sabiam era que estavam entrando em uma armadilha financeira. Passado o primeiro ano, os encargos do crédito colateralizado chegaram a R$ 100 mil, enquanto o COE, que deveria gerar os ganhos para cobrir os juros, estava praticamente no valor nominal. Para evitar a liquidação compulsória do COE, o casal precisou contrair um novo empréstimo, agora para pagar os juros do primeiro. O que parecia uma solução inteligente se transformou em uma bola de neve de dívidas.

No segundo ano, descapitalizados, sem liquidez e com a dívida crescente, João e Maria ainda tiveram o crédito negado para um novo projeto, já que estavam com uma operação de crédito de mais de R$ 1 milhão em andamento. E, para piorar, a rentabilidade do COE continuava irrisória, muito abaixo das expectativas vendidas pelo assessor.

Ao final de dois anos, a situação do casal se tornou insustentável. Sem capital suficiente para pagar a parcela de juros do crédito colateralizado – parcela essa que nem havia sido informada de forma clara no momento da contratação –, João e Maria se viram forçados a liquidar o COE de forma antecipada, o que resultou em um deságio de mais de 30%. O investimento inicial de R$ 1 milhão foi liquidado por menos de R$ 700 mil. Após os descontos da operação e o pagamento da parcela de juros de R$ 100 mil, restaram apenas R$ 550 mil para o casal, um valor muito inferior ao esperado.

No entanto, a situação ficou ainda pior. Mesmo após a liquidação do COE, a dívida com a corretora ainda era de R$ 1 milhão. O saldo remanescente de R$ 550 mil foi utilizado para abater a dívida, mas ainda assim o casal ficou com uma dívida de R$ 450 mil, além dos R$ 250 mil que já haviam sido pagos ao longo dos dois anos de operação em forma de encargos e juros. Ou seja, em vez de conseguirem manter seu patrimônio e realizar o sonho do imóvel, João e Maria sofreram uma perda total de mais de R$ 1,15 milhão em apenas dois anos, sendo forçados a lidar com uma dívida crescente e um patrimônio drasticamente reduzido.

Infelizmente, essa história não é incomum. Produtos como o COE, especialmente quando atrelados a créditos colateralizados, têm sido amplamente utilizados por corretoras e assessores de investimentos como uma ferramenta para reter clientes e seus patrimônios. Promessas de rentabilidade extraordinária e segurança de capital são vendidas de forma agressiva, enquanto os riscos e custos ocultos são deixados de lado.

No caso de João e Maria, o que deveria ter sido uma estratégia de investimento inteligente se transformou em um pesadelo financeiro, graças a um combo de produtos estruturados que visam mais a retenção de patrimônio pelos escritórios do que a realização dos objetivos dos clientes. Se você ou alguém que conhece está passando por uma situação parecida, é fundamental buscar orientação jurídica e financeira para reverter essas operações abusivas.

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