Clima, Rússia e China: O que esperar para soja, trigo e milho no 2º semestre de 2023?
Como você viu aqui no Agro Times há duas semanas, os contratos dos principais grãos negociados na Bolsa de Chicago (CBOT) seguiam um movimento de forte derrocada no primeiro semestre deste ano.
O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) informou que as lavouras de soja e milho do país estão no pior patamar desde 1988.
Assim, conversamos com alguns especialistas sobre o que esperar para o mercado do trigo, soja e milho no segundo semestre de 2023.
Soja
Para Luiz Fernando Gutierrez, analista de soja na Safras & Mercado, a tendência para os preços na Bolsa de Chicago (CBOT) é de alta, em função das menores projeções para a safra dos Estados Unidos, atualizada na sexta-feira (30).
De acordo com o USDA, a soja tem a área plantada prevista em 33,79 milhões de hectares, bem abaixo aos 35,48 milhões de hectares previstos pelo mercado.
“Esse corte na área dos EUA não era esperado e muda muito as perspectivas para os próximos meses, porque o potencial produtivo agora é bem menor do que antes, 5 milhões de toneladas a menos, e eles não vão colher uma safra recorde. Com isso, a questão climática tem trazido muitos problemas para as lavouras norte-americanas”, explica.
Segundo Gutierrez, o cenário que se desenhava negativo para Chicago, agora é positivo.
“Como nós vemos as lavouras do país piorando, podemos prever um novo corte de safra já em julho, e se o clima não melhorar, devemos trabalhar com uma safra abaixo de 118 milhões de toneladas e estoques apertados, o que traz força na CBOT, e isso deve perdurar até setembro-outubro, quando o Brasil começa a plantar sua safra”, comenta.
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Milho
De acordo com o consultor sênior da Safras & Mercado, Paulo Molinari, o principal fator de atenção fica para o quadro climático nos Estados Unidos.
“O mercado do milho no Brasil está alinhado a paridade de exportação e deve demorar para romper este vínculo no segundo semestre, em função do volume da safra de verão de 2023. Levará mais tempo para que o mercado encontre uma reação fora do padrão internacional”, disse.
Segundo Molinari, a oferta é único fator que parece mexer com os preços de mercado no momento atual.
“O tamanho das produções dos principais exportadores é sempre a ‘chave’ do mercado. Dessa forma, novas baixas nos preços vão depender do ritmo da entrada da safrinha, do tamanho da safra norte-americana e do câmbio neste segundo semestre”, explica.
Para o consultor, o clima sempre exerce sua volatilidade sazonal nos preços do grão na CBOT.
“Contudo, 30 dias de estiagem no segundo maior estado produtor dos EUA (Illinois) pode levar a alterações nos dados de produção e causar impactos positivos nos preço internacionais até 2024. Por outro lado, essa perda na produção precisa ser razoável para que os preços se mantenham acima de US$ 6 por bushel na colheita local. Seria mais plausível um preço entre US$ 4,50 e US$ 5 na colheita, mesmo com alguma perda”, diz.
Entre os fatores macroeconômicos de atenção para o milho, Molinari destaca o período atual de juros altos para controlar a inflação no pós-pandemia, assim como a guerra entre Rússia e Ucrânia, que pode resultar em volatilidades nos preços do milho e também do trigo.
Segundo o departamento, a área plantada com milho nos EUA em 2023 ficou estimada em 38,07 milhões de hectares, contra 37,17 milhões esperados pelo mercado.
Dessa forma, esse número acima da expectativa aponta para uma tendência de queda do grão na CBOT.
Trigo
Na visão do analista de trigo na Safras, Elcio Bento, mesmo com a volatilidade do mercado, que dão combustível aos movimentos especulativos, os preços seguem os fundamentos de mercado.
“Os últimos números divulgados pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) aponta para uma produção global crescendo mais que o consumo. Com isso, pela primeira vez desde a temporada 2019/2020, os estoques globais têm uma estimativa de alta em relação ao ano anterior. Essa alta seria modesta e, a relação estoque/consumo se elevaria pouco: de 33,9% para 34,1%”, diz.
No entanto, desde o último relatório do USDA, há previsões de que as condições climáticas adversas podem afetar a produtividade das lavouras em importantes produtores globais têm sido ventiladas no mercado.
Na Rússia, a consultoria russa SovEcon rebaixou sua projeção para a produção de trigo da Rússia em 2023/2024. A colheita deve totalizar 86,8 milhões de toneladas, contra 88 milhões esperadas anteriormente.
Já o serviço de monitoramento agrícola da União Europeia (MARS), estimou, na última segunda-feira (26), que a produção de trigo da Rússia deve cair 17% na comparação com o ano passado, totalizando 86,7 milhões de toneladas.
O volume ainda superaria em 4% a média dos últimos cinco anos.
“Apesar disso, como a safra passada foi recorde, o país conta com bons volumes de estoques e deve continuar muito agressiva no mercado externo. Há um ano, o cereal do maior exportador global saía dos portos a US$ 397/tonelada. Atualmente é indicado a US$ 232/tonelada (-42%)”, comenta.
De acordo com Bento, os seguintes países, que se destacam pela exportação do cereal, devem ter queda nas produções:
- Índia: queda de 1,2 milhões de toneladas
- Austrália: queda de 10 milhões de toneladas
- Ucrânia: queda de 3 milhões de toneladas
“Destaque também para a China, onde chuvas intensas durante duas semanas consecutivas devem ter prejudicado a qualidade de cerca de 30 milhões de toneladas de trigo. Isso pode levar o país a ser ainda mais agressivo nas importações. Atualmente, estima-se que o país dívida com o Egito o posto de maior comprador internacional do cereal”, explica.
Por outro lado, as seguintes nações e blocos devem tem um incremento na produção na comparação com a safra anterior:
- Argentina: alta de 7 milhões de toneladas
- União Europeia: 6 milhões de toneladas
- Canadá: 3 milhões de toneladas
Por fim, Bento ressalta que o conflito entre Rússia e Ucrânia deve continuar mexendo com o mercado do trigo.
“Os três meses que sucederam o início do conflito em 2022 foram de incertezas em relação ao abastecimento global e intensas elevações de preços. Parece muito pouco provável que notícias vindas do Mar Negro possam ter impactos semelhantes ao longo da atual temporada. Contudo, seguirão como um dos principais fatores que geram volatilidade ao mercado. Os exportadores da região do Mar Negro respondem por mais de 30% do saldo exportável global”, discorre.
Segundo ele, qualquer notícia que coloque em xeque o fornecimento do cereal dessa região, reverbera no mercado
“O corredor de exportação da Ucrânia, que expira em 18 de julho, garante um capítulo novo a essa novela a cada reunião para renovação. Até o momento, contudo, tem sido uma moeda de troca para os russos para pressionaram os países do ocidente em relação às sanções impostas. Recentemente, o risco de uma guerra civil na Rússia foi motivo de incertezas. Um eventual conflito interno no maior importador global do cereal teria impactos significativos sobre o mercado”, diz.
O analista ressalta que a Rússia tem muito trigo e precisa vender para ajudar no financiamento da guerra.
“Até o momento, mercado não tem faltado. Eventuais problemas que prejudiquem a logística e a segurança dos navios na região seriam sentidos no mercado”, conclui.