Brasil

Clamor por golpe militar mobiliza bolsonaristas em bloqueios pelo país

02 nov 2022, 9:12 - atualizado em 02 nov 2022, 9:12
Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro em Belo Horizonte 01/11/2021 REUTERS/Washington Alves

“Nós não viemos para rua pelo que o presidente ia dizer ou não. Nós viemos porque nós precisamos de uma intervenção”, disse Sandro Rogerio, um dos bolsonaristas que fechavam na tarde desta terça-feira três das quatro faixas da rodovia Castelo Branco, a principal via que liga São Paulo ao sul do Brasil.

O bloqueio na estrada era um dos quase 200 que seguiam ativos no país mesmo após o discurso de Jair Bolsonaro (PL), no qual o presidente não reconheceu a derrota nas urnas para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas autorizou que o processo de transição para o próximo governo comece e defendeu que as manifestações deveriam respeitar o “direito de ir e vir”.

Sandro Rogerio não pareceu interessado em interpretações da fala do mandatário. Para ele, que se definiu como “patriota”, “nada muda”. “O presidente falando ou não se pronunciando, o povo ia vir para a rua, o caminhoneiro ia vir para rua para continuar aqui até o Exército intervir. Isso no Brasil inteiro”, disse.

“O presidente falou o que ele tinha que falar”, encerrou o manifestante, um dos cerca de 80 integrantes do protesto que resistiam na Castelo Branco após o protesto ser parcialmente dissolvido pela Polícia Militar.

Frases de teor semelhante se repetiram em protestos em outro ponto da Grande São Paulo, em Curitiba e Belo Horizonte, constatou a Reuters.

Em comum, a rejeição absoluta a Lula e pedidos por uma ilegal intervenção das Forças Armadas, que impediria o petista de voltar ao poder em janeiro.

A crença no possível golpe militar se alimenta de uma interpretação equivocada do artigo 142 da Constituição que permitiria uma “intervenção militar”, uma ideia já defendida por Bolsonaro e que é estimulada há anos em círculos do movimento de extrema direita.

O artigo 142 diz que as Forças Armadas estão “sob a autoridade suprema do presidente da República, e destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

O Supremo Tribunal Federal (STF) já julgou, em diferentes casos, que o artigo não permite a atuação das Forças Armadas como uma espécie de “poder moderador” para restaurar a ordem, mas isso não tem impacto nos pontos de bloqueio e nas redes sociais, estimuladas pela desinformação.

Faixas pedindo “intervenção federal” e “intervenção militar” são vistas nos protestos, a maioria delas em rodovias federais e estaduais, com os casos mais agudos de bloqueio em Mato Grosso do Sul e em Santa Catarina.

Em Belo Horizonte, manifestantes faziam reivindicações antidemocráticas em frente ao quartel do Exército na região central da cidade. Uma delas, Raquel Lemos Del Sarto, consultora de imagem de 64 anos, segurava uma faixa pedindo “intervenção federal”.

“Eu como brasileira não posso aceitar um ex-condenado, um prisioneiro como presidente do meu país, eu prezo pela liberdade, eu prezo pela família, eu prezo pela religião cristã, nós não podemos brincar”, disse Sarto.

“É hora de luta, nós não podemos deixar um ex-condenado assumir a Presidência, essa eleição ela não foi justa, não houve democracia”, afirmou a manifestante, sem oferecer provas.

O protesto em frente a um quartel não era uma iniciativa isolada. Além dos protestos dos caminhoneiros, circulam em grupos de mensagens e em outras redes sociais convocatórias a ir protestar em frente a quartéis — algumas das mensagens conclamam que essa concentração de atos se dê no feriado de 2 de novembro.

“Agora tem que ser Bolsonaro, não existe outra opção, é Brasil, é Bolsonaro”, disse um corretor de imóveis que se apresentou como Câmara. “Não podemos ficar a mercê de um partido que só roubou, quebrou a Petrobras, acabou com o futuro dos brasileiros.”

Ao longo de seus quatro anos de mandato, Bolsonaro lançou por diversas vezes suspeitas infundadas contra o sistema eleitoral e fez alegações falsas sobre as urnas eletrônicas.

O segundo turno da eleição, em que além de Lula foram eleitos 12 governadores de Estado, foi reconhecido como limpo e justo por autoridades de dentro e de fora do Brasil, e não houve qualquer relato de fraude durante a votação.

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