Cisne negro na bolsa de valores
Paulo Gala é economista e diretor geral da Fator Administração de Recursos
Um dos maiores equívocos da teoria de finanças moderna tem sido tratar o retorno dos ativos como gaussiano, ou seja, seguindo padrões normais. Ao ignorar o que agora se chama de “fat tails”, toda classe de modelos do tipo VAR causou estragos consideráveis em portfólios mundo afora.
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O problema de se usar a curva normal para representar retornos financeiros está na baixíssima probabilidade atribuída a eventos extremos, ou “cisnes negros”, em homenagem a N. Taleb. Os eventos extremos são muito mais comuns do que imaginamos no mundo financeiro e achar que num longo período de tempo 95% dos retornos de ativos financeiros estará a dois desvios padrão da média para cada lado (curva normal) é um pouco ingênuo.
Aliás, as grandes fortunas e quebras espetaculares vem mesmo desses eventos extremos, que ocorrem com muito mais freqüência do que um gaussiano gostaria. Vejamos abaixo o comportamento do ativo INEP4 (Inepar Indústria e Construções, empresa listada em bolsa) em 2009, um belo exemplo de comportamento não gaussiano. No primeiro gráfico podemos observar que o ativo triplicou de preço em 2009. Começou o ano valendo R$2,00 e terminou na casa dos R$6,00 (a rigor houve um “split” no preço da ação em 13/11 que o dividiu por 7).
Repare que o movimento da ação está longe de ser linear. As subidas se dão em dois grandes saltos. Um em junho, quando INEP4 pula para R$4,00 e outro no final de outubro e começo de novembro quando pula de novo para R$6,00. Grosso modo, pode-se dizer que a ação anda de lado de janeiro a maio (5 meses) para dobrar em duas semanas. Depois anda de lado de novo até novembro (mais 4 meses) e pula para um patamar 50% maior. O investidor que ficou fora do ativo nos meses de junho e novembro perdeu toda a valorização do ano! Ou seja, em 12 meses a ação triplicou de preço, só que o movimento se deu em apenas dois meses. Nos outros 10, só marasmo.
Uma maneira interessante de se observar esse comportamento é olhar para o histograma de retornos da ação. Ele mostra as frequências relativas de retornos ao longo do ano. Se seguisse um comportamento normal, 95% das dos retornos deveriam estar em torno da média (0,45%). Mas não estão.
Repare que existe um agrupamento a direita significativo, ou seja, os eventos extremos de aumentos de mais de 6% num dia são relativamente freqüentes. Alias, são esses que provocam os saltos de junho e novembro e conferem a não-linearidade do comportamento do ativo, ou se quiserem, sua “não gaussianidade”. Temos no caso dessas 245 observações um desvio padrão de 2,78%. Nos extremos da cauda direita e esquerda não é difícil perceber que eventos maiores do que 2 desvios padrão ocorrem com maior freqüência do que em 5% de todas observações. Nesse exemplo somam aproximadamente 9% das ocorrências (14/245).
Bom, está claro então que temos aqui um belo exemplo de eventos extremos freqüentes. Moral da história, se você é um investidor que acredita em Bolsa e for viajar esse ano, fique comprado, pois um mês pode te custar o retorno do ano inteiro.