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Chuvas recuperam hidrelétricas e conta de luz deve manter bandeira tarifária verde

28 fev 2020, 8:48 - atualizado em 28 fev 2020, 8:49
Se confirmadas as atuais projeções otimistas, os lagos das hidrelétricas do Sudeste poderiam alcançar o melhor nível desde 2016 (Imagem: Pixabay)

Os reservatórios das hidrelétricas, principal fonte de geração de energia do Brasil, estão em franca recuperação e devem fechar abril com o maior volume armazenado para essa época em anos, o que representaria significativa reversão frente ao cenário visto no início do ano, quando as principais represas chegaram a operar no menor nível desde 2015.

A trajetória, que deve-se à intensificação das chuvas na região das usinas a partir do final de janeiro e a um consumo de eletricidade abaixo das expectativas iniciais, deve representar alívio no bolso dos brasileiros, ao manter as contas de luz sem cobranças adicionais geradas pelas chamadas bandeiras tarifárias, disseram especialistas à Reuters.

Se confirmadas as atuais projeções otimistas, os lagos das hidrelétricas do Sudeste poderiam alcançar o melhor nível desde 2016 ao fim do período tradicional de chuva na região das usinas, que vai de novembro a abril, enquanto no Nordeste os volumes ficariam próximos do registrado em 2012.

As precipitações têm sido fortes no Brasil neste ano, mas até a reta final de janeiro a água ainda caía principalmente em pontos distantes dos principais reservatórios hídricos, o que gerava algum temor de que fosse necessário acionar termelétricas de custo mais elevado para atender à demanda, gerando impactos para os consumidores.

“Tivemos um pequeno susto em janeiro, um pequeno atraso, mas sem sombra de dúvidas houve uma compensação no mês de fevereiro e no que é esperado para março. Do final de janeiro para a entrada de fevereiro, a chuva realmente ‘encaixou'”, disse à Reuters o sócio da comercializadora de energia True, Gustavo Arfux.

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Em março as precipitações no Sudeste, onde estão os maiores reservatórios, poderiam superar 110% da média histórica para o mês (Imagem: Unsplash/@cdubo)

Ele projetou que em março as precipitações no Sudeste, onde estão os maiores reservatórios, poderiam superar 110% da média histórica para o mês, contra apenas 74% em janeiro e 102% em fevereiro.

Nesse cenário, os custos da energia para os consumidores não seriam elevados pelas bandeiras tarifárias, disse o presidente da comercializadora Bolt, Gustavo Ayala. O mecanismo gera cobranças adicionais quando sai do patamar verde para o amarelo ou vermelho, o que é definido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de acordo com a oferta de geração no sistema.

“A bandeira tarifária será verde agora para março. E também, principalmente para abril, maio, a tendência é que seja bandeira verde, porque haverá uma ‘poupança’ nos reservatórios”, afirmou.

O início negativo do período de chuvas havia levado a Aneel a definir a bandeira tarifária como vermelha em novembro e amarela em dezembro e janeiro. Em fevereiro, com previsões mais otimistas, o mecanismo ficou no patamar verde, sem custos extras.

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O início negativo do período de chuvas havia levado a Aneel a definir a bandeira tarifária como vermelha em novembro e amarela em dezembro e janeiro (Imagem: Agência Brasil)

“Pelo que temos de previsão de chuva até 6 de março, que é uma previsão mais certeira… já segura a bandeira verde até junho, pelo menos”, disse o presidente da Focus Energia, Alan Zelazo.

Um consumo de eletricidade mais fraco no primeiro trimestre, devido a um clima mais ameno que no ano passado, também tem contribuído para recuperar as represas.

“A carga está ‘performando’ abaixo (do esperado). E com o coronavírus ela deve vir mais baixa ainda. Não tem nenhuma questão de falta de abastecimento (de energia). Você vê que os reservatórios subiram mais rápido do que estava previsto”, acrescentou Zelazo.

O consumo de eletricidade no Brasil recuou 4,3% em janeiro e 1,9% na primeira quinzena de fevereiro, apontou a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). No início de janeiro, a CCEE projetava avanço de 4,2% no consumo em 2020, o que seria a maior alta anual desde 2013.

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No Nordeste, o nível avançou de 39,5% em meados de janeiro para quase 59% atuais, já o melhor no atual período desde 2012 (Imagem: REUTERS/Paulo Whitaker)

Além do consumo mais fraco de energia e das chuvas, a expansão da geração eólica no Nordeste e a operação a plena carga da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, também têm ajudado as usinas do Sudeste e Nordeste a acumular água.

A Focus vê reservatórios do Sudeste em 54% da capacidade ao final de abril, contra 38% atualmente e cerca de 58% em abril de 2016. Em meados de janeiro, a região havia registrado 21,5%, pior nível para o mês desde 2015.

No Nordeste, o nível avançou de 39,5% em meados de janeiro para quase 59% atuais, já o melhor no atual período desde 2012. A Focus projeta avanço para 70% do volume ao final do período úmido, ante quase 79% em abril de 2012.

Déficit menor

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O “risco hidrológico”, têm sido inclusive alvo de uma longa disputa judicial entre empresas de energia, o governo e a Aneel (Imagem: Unsplash/@manpritkalsi)

Além de evitar cobranças adicionais para os consumidores de energia com as bandeiras tarifárias ou o acionamento de termelétricas, que depois têm custos repassados para as contas de luz, a recuperação dos reservatórios também é uma notícia positiva para empresas com portfólio de geração hídrica.

Isso porque operadores de hidrelétricas precisam comprar energia no mercado para cumprir seus compromissos quando as usinas não geram conforme o previsto por questões como o baixo nível das represas.

Esses custos, conhecidos como “risco hidrológico”, têm sido inclusive alvo de uma longa disputa judicial entre empresas de energia, o governo e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

“Essas chuvas com certeza aliviam bastante a necessidade de compra (de energia) por parte dos geradores para suprir o risco hidrológico. Tende a reduzir a exposição dos geradores. Se esse ano começou com uma expectativa, a previsão de déficit hidrológico agora é bem menor”, disse Ayala, da Bolt.

Atualmente, a Aneel tenta cobrar dos geradores uma conta de 8,24 bilhões por custos passados com o risco hidrológico, após empresas terem obtidos liminares na Justiça para evitar o pagamento.

O governo tem buscado viabilizar um acordo para que as empresas retirem as liminares e acertem os débitos em troca de uma compensação parcial desses custos por meio da prorrogação de contratos de concessão de usinas. O acerto, no entanto, depende da aprovação de um projeto de lei no Congresso.

Em paralelo, a disputa segue nos tribunais. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) previa analisar ações sobre o caso na semana passada, mas o assunto acabou retirado de pauta, sem previsão de retorno.

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