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China vai encarecer o pãozinho, mas pode incentivar o Brasil a ser exportador de trigo

01 abr 2021, 15:45 - atualizado em 01 abr 2021, 16:07
Produção de trigo tende a se elevar com os produtores visualizando oportunidades externas (Imagem: Pixabay)

A fome chinesa pelo trigo, que já está nos preços internacionais e deverá se acentuar, vai fazer o brasileiro pagar cada vez mais caro pelo pãozinho, mas também oportunizará a possibilidade de crescimento expressivo da produção doméstica. E o Brasil pode virar um exportador líquido.

Para aqueles que se acostumaram a ouvir do déficit nacional do cereal, que obriga as indústrias a dobrar, ou mais que dobrar, as importações sobre o volume produzido, como em 2020, pode soar estranho. Ainda mais quando se está pagando entre R$ 15 e R$ 18 o quilo do pão francês em São Paulo, como atualmente.

Mas para Marcelo De Baco, CEO da De Baco Corretora de Mercadorias, não é. Os preços de Chicago, acima de US$ 6/bushel (nesta quinta, 1, o maio caiu 7 pontos), já estão tendo o suporte do crescente volume comprado pela China. O trigo do Mar Negro, baseado em Rússia e Ucrânia, já carrega R$ 35 a mais pela tonelada, também ajudado pela taxação extra das exportações promovidas no primeiro país.

No Brasil, essas “boas notícias” chegaram, onde a intenção de aumento de área de plantio do grão já está sendo anunciada pelos produtores. De Baco acredita em mais 1,1 milhão de hectares no Rio Grande do Sul, para serem colhidos a partir de setembro, que elevaria a capacidade do estado a 4 milhões/t. No Paraná, principal produtor, as projeções também são de alta.

Portanto, alcançar mais 5 a 6 milhões/t, sobre as cerca de 6,4 milhões/t em média por safra, não é algo fora da curva, segundo o analista e trader. 12 milhões/t não seria uma meta de muito longo prazo.

Claro, precisa combinar com o clima, com a conjuntura econômica interna e sanados alguns gargalos sanitários.

Mas, na visão da De Baco Corretora, do Rio Grande do Sul, ainda não se contabiliza o trigo do Cerrado, “futuro Eldorado”, com solo e clima oferecendo boas produtividades quando alguns gargalos técnicos forem solucionados, o que parece não demorar dado o avanço científico da Embrapa Trigo.

Voltando à China, temos o sintoma bastante nítido. O gigante produz muito, 140 milhões/t, cerca de 50% dos estoques globais, mas tem desovado cada vez mais para suprir a ração animal. A ideia é substituir mais o milho e não tanto o farelo de soja, ao contrário do que a Bloomberg noticiou usando fontes chinesas. “A margem do esmagador de farelo diminuiu bastante, mas ainda é um produto barato”, diz Marcelo De Baco.

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Demanda asiática

Em 2019, os importadores chineses buscaram 9 milhões de toneladas no exterior. Em 2020, deve ter chegado a 10/12 milhões, fazendo uma projeção a partir do resultado dos nove primeiros meses, de 6 milhões/t, o último número oficial conhecido. “Este ano, eles devem comprar entre 18 e 19 milhões”, estima o analista.

A demanda do país asiático pode chegar ao Brasil já neste ano, se consolidadas as previsões de mais área e maior produção internas, mesmo que ainda falte para o consumo interno e o complemento precise ser importado. Bom, mas aí é outra história e o mercado é livre para fazer com o trigo o mesmo que os arrozeiros fizeram em 2020, quando o Brasil entrou na lista dos grandes exportadores.

De Baco lembra que o trigo americano que é colhido em junho/julho já está comprometido e a safrinha de primavera é de trigo hardy, premium, que além de pouco é muito mais caro para ser transformado em comida de bicho.

A safra brasileira é colhida a partir de setembro. A produção russa encolherá, sob pressão de área menor, depois de Vladimir Putin resolver encarecer o produto para exportação. Aí, entramos numa janela de interesse dos chineses.

Até lá, o Brasil está tendo que buscar trigo nas mesmas portas que os chineses estão batendo, Estados Unidos, Austrália, Canadá e Argentina.

E o pãozinho ficará mais caro – e o resto dos produtos derivados do farináceo também.

A Abitrigo, entidade que reúne as indústrias, não superestima essa situação no curto prazo, olhando pelo lado dos estoques, mas crê que essa demanda chinesa em ascensão vá pressionar para cima os preços no futuro, conforme explicou o presidente Rubens Barbosa.