Guerra Comercial

China precisa de “explosão” de compras dos EUA para cumprir meta agrícola

01 ago 2020, 16:00 - atualizado em 02 ago 2020, 13:06
China EUA Bandeiras
A rápida deterioração nas relações entre EUA e China preocupa os analistas (Imagem: Reuters)

Após quase sete meses, uma ambiciosa meta de 36,5 bilhões de dólares definida pela China para importações de produtos agrícolas dos Estados Unidos neste ano pode não estar totalmente fora de alcance, mas parece cada vez mais um enorme desafio.

Até o final de maio, as importações estavam abaixo dos níveis de 2017 –enquanto precisariam ter crescido em 50%. Embora os chineses tenham começado a elevar compras de soja, o atingimento da meta exigiria níveis pesados de aquisições.

Analistas acreditam que o desafio pode ser grande demais se considerados ainda a rápida deterioração nas relações entre EUA e China, uma eleição se aproximando nos EUA, uma pandemia global e dúvidas sobre a real necessidade da China por importações de soja.

“Apenas não parece provável para mim”, disse o corretor de futuros e opções da Daniels Trading em Chicago, John Payne. “Se a economia global estivesse mais normal, talvez, mas você tem todo esse problema da Covid.”

Pequim e Washington fecharam um acordo comercial de Fase 1 em janeiro, após dois anos de guerra comercial e uma forte queda nas importações da China, um dos principais compradores de produtos agrícolas norte-americanos.

Já na ocasião analistas expressaram reservas quanto à meta para os produtos agrícolas, que representaria aumento de 25% em relação à máxima história de 29 bilhões de dólares registrada em 2013.

Ainda assim, chineses têm aumentado neste ano as compras de uma série de bens agrícolas, registrando negócios recordes para importação de milho e carne, o que gera algum otimismo.

“Se eu tivese que dar uma nota para eles agora, sairia de um C- para B, e se isso continuar talvez possamos começar a ver níveis melhores”, afirmou o presidente da AgResource em Chicago, Dan Basse.

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Olho na soja

Após um início lento, os importadores chineses registraram mais de US$ 2,5 bilhões em compras de soja nos EUA (Imagem: Reuters/Paulo Whitaker)

As chances de atingir a meta ficarão mais claras nos próximos meses. A soja é responsável por cerca de metade das importações agrícolas da China junto aos EUA e a grande maioria das compras ocorre nos últimos três meses do ano, com uma redução nos suprimentos do Brasil, maior produtor.

Após um início lento, os importadores chineses registraram mais de 2,5 bilhões de dólares em compras de soja nos EUA nas últimas oito semanas.

“Podemos estar à beira de realmente começar a aumentar as vendas para a China. Acho que você começará a ver essas grandes vendas de soja acontecendo bem em breve, porque o Brasil já vendeu quase tudo”, disse John Baize, presidente de consultoria John C. Baize & Associados.

Não está claro, no entanto, se a China manterá seu apetite nos próximos cinco meses depois que suas processadoras de soja adquiriram volumes recordes do Brasil.

A demanda também dependerá da recuperação da China da peste suína africana, que matou centenas de milhões de porcos, reduzindo a necessidade de ração.

Para que a soja represente metade da meta de 36,5 bilhões de dólares, compradores chineses teriam que adquirir 2,8 bilhões de dólares por mês de julho a dezembro, segundo cálculos da Reuters.

Tal ritmo de compras mensais nunca se sustentou por mais de dois meses consecutivos e só foi registrado no quarto trimestre, sendo a ocasião mais recente em 2016.

Preços de commodities em queda devido à pandemia de coronavírus ainda representam uma dificuldade adicional, uma vez que o acordo está atrelado ao valor das importações. Os preços da soja neste ano estão em média 10% abaixo dos registrados em 2016.

Vontade política

Os chineses podem querer evitar se tornar um alvo maior de críticas do presidente norte-americano Donald Trump (Imagem: Reuters/Carlos Barria)

A China pode não violar o pacto comercial mesmo sem cumprir a meta, devido ao impacto do coronavírus. O acordo concede flexibilidade no caso de “um desastre natural ou outro evento imprevisível”.

Ao mesmo tempo, a política entrará em jogo.

Com as relações bilaterais entre EUA e China enfrentando turbulência, os chineses podem querer evitar se tornar um alvo maior de críticas do presidente norte-americano Donald Trump durante a campanha eleitoral dos EUA.

Os volumes finais das compras de soja na China provavelmente dependerão da uma decisão de Pequim sobre reabastecer ou não estoques do governo.

Em geral, a China normalmente demanda de 7 milhões a 8 milhões de toneladas por mês de soja, observou um processador de soja no nordeste da China.

“Seria uma história diferente se os grãos fossem para reservas estatais”, disse ele.

Fontes chinesas disseram que a China vai querer evitar se possível os danos à reputação associados ao não cumprimento das metas.

“Vamos morder os dentes e implementar o acordo comercial. Caso contrário, não pareceremos bem no cenário internacional”, disse um gerente comercial de uma empresa estatal.

“Mas precisaríamos comprar de uma maneira explosiva”.