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Caso Americanas (AMER3): Proteção ao investidor minoritário é quase zero no Brasil; entenda

05 set 2023, 18:15 - atualizado em 06 set 2023, 10:54
Lojas Americanas Americanas
Para professor, caso Americanas ainda mostra que a justiça é lenta e cara, enquanto acionistas minoritários ficam expostos (Imagem: Flávya Pereira/Money Times)

“No Brasil, o investidor minoritário não é protegido. A proteção era zero”. A frase é do professor do Insper e advogado na área de governança corporativa, André Camargo.

A declaração de Camargo, em entrevista ao Money Times, tem a ver com um dos maiores rombos contábeis registrados por uma empresa brasileira: o caso Americanas (AMER3).

“Ela está no Novo Mercado da B3. Esperava-se total transparência, total controle e olha no que deu. Agora, para os acionistas minoritários receberem alguma coisa, será lá para frente e olhe lá. Ainda mais com a empresa em recuperação judicial“, comenta.

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Investidor desprotegido é caso antigo

O professor e advogado ressalta que a falta de proteção aos acionistas minoritários é um problema histórico, que o Brasil tenta resolver há décadas.

“É um mercado com o poder muito concentrado nas mãos de poucos grupos empresariais. Por conta dessa concentração, a gente tem uma tensão muito grande entre quem tem esse poder e investidores. No caso, investidor pessoa física e investidor institucional, as pessoas jurídicas especializadas”, diz.

Desde janeiro, quando a Americanas disse ao mercado que havia identificado uma “inconsistência contábil” de R$ 20 bilhões, investidores minoritários se movimentam com processos judiciais coletivos contra a varejista. Posteriormente, o rombo contábil foi declarado em mais de R$ 40 bilhões.

Enquanto isso, a investigação contra a gigante do varejo pode terminar sem o desfecho que muitos esperavam: com nomes de quem levou a companhia a uma das maiores crises financeiras declaradas no Brasil.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), da Câmara dos Deputados, que investigava o caso, divulgou ontem (04) o relatório final. Porém, sem apresentar um parecer conclusivo. Sendo assim, o documento de 338 páginas e sete capítulos reconhece a existência de uma fraude, mas não imputa responsabilidades a indivíduos ou instituições.

Uma luz no fim do túnel no caso Americanas

Contudo, Camargo lembra que o país tem um histórico de movimentos regulatórios para, de alguma forma, proteger pequenos investidores.

“Tivemos algumas ondas de melhorias regulatórias para investidores minoritários, sendo a mais recente a ‘lei do Ambiente de Negócios’, de 2021. Agora, tramita o Projeto de Lei 2925/2023, que pode ser luz no fim do túnel”, pondera.

O PL aprimora a proteção dos investidores minoritários no mercado de capitais contra danos causados por atos ilícitos de acionistas, controladores e administradores, para aumentar a segurança jurídica dos investimentos. O projeto foi apresentado após o caso Americanas e tramita no Congresso Nacional.

“O documento ainda sugere que o minoritário poderá se juntar em grupo e entrar com uma ação civil contra a empresa e seus administradores. Isso sem precisar esperar alguma investigação em curso que, sabe-se lá quando vai conseguir andar”, explica Camargo.

A proposta atende acionistas minoritários e debenturistas que se sentirem lesados. A medida é parecida com a já consagrada pelo Código de Defesa do Consumidor para a tutela coletiva de direitos.

O professor do Insper reforça que há um movimento antigo, porém, atual de melhoria da posição de segurança jurídica desses investidores. “Enquanto o investidor controlador tem medidas muito mais protetivas para ele”, acrescenta.

Caso Americanas sugere paciência e espera

Praticamente oito meses após o estouro da bomba envolvendo a varejista, Camargo sugere que os acionistas minoritários precisarão de paciência e cadeira, uma vez que a espera deverá ser grande.

“Os minoritários têm que esperar uma investigação. Daí, será apresentado aos acionistas os resultados dessa investigação. Esses investidores devem entrar com uma ação judicial contra todos os administradores da época em que foram registradas movimentações atípicas do rombo contábil. Aí, começa o processo deles”, destaca.

O advogado especialista em governança corporativa ressalta que o funcionamento da Justiça no Brasil é lento e caro. O que ajuda a dificultar uma entrada maior de investidores estrangeiros no país.

“Por isso, eu digo que o investidor não é protegido. Já foi zero e agora, é um pouco melhor. Contudo, a gente precisa dar uma boa melhorada. Do contrário, o investidor nacional ou estrangeiro não vai querer investir aqui”, observa.

O professor do Insper diz ainda que o Projeto de Lei 2925/2023 é importante e deverá trazer ferramentas de proteção aos minoritários, uma vez que existe uma pressão interna e externa para o Brasil ingressar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

“No entanto, para ingressar, precisa melhorar o ambiente de negócios. São precisos mecanismos rápidos e justos. E no Brasil, a Justiça não é nem rápida, nem barata e, muitas vezes, não é justa. Mas não é uma briga perdida [para o minoritário]“, finaliza Camargo.