Carne bovina se torna mais rentável do que frango em pandemia
A barata carne de frango deveria ser a proteína favorita da pandemia. Mas empresas com maior foco em carne bovina têm mostrado melhor desempenho do que os que dependem mais de aves.
Produtores de frango dos Estados Unidos e Brasil enfrentam excesso de oferta, preços baixos e demanda fraca. Analistas dizem que cortar a produção pode ser necessário para sustentar os preços e defender as margens. Já fornecedores de carne bovina se beneficiam de preços e demanda comparativamente mais fortes.
Nos EUA, a produção de carne se recuperou das paralisações causadas pelo coronavírus. Com isso, a oferta supera a demanda em meio às vendas ainda fracas em serviços de alimentação. Com a produção normalizada, a carne bovina deve competir com o frango nas vendas em supermercados.
“Vamos ter uma enxurrada de carne vermelha chegando ao mercado norte-americano”, disse Peter Galbo, analista do Bank of America, acrescentando que as opções de carne bovina no varejo devem aumentar “drasticamente” no quarto trimestre.
Mas os preços do frango estão muito baixos e a demanda muito fraca para justificar promoções que possam ajudar a gerar vendas.
Na semana passada, a Sanderson Farms, terceira maior produtora de frango dos EUA, estimou queda de 5% de sua produção total no quarto trimestre fiscal de 2020 em relação ao ano anterior. O CEO Joe Sanderson previu “menor demanda durante a temporada de fim de ano para todos os nossos produtos”.
No Brasil, maior exportador de carne de frango, uma menor produção ou um reajuste de preços podem ser inevitáveis para compensar o forte aumento dos custos com ração, disse Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Os preços do milho e do farelo de soja no mercado doméstico subiram para máximas históricas em meio à forte demanda e à alta do dólar frente ao real, o que torna as exportações mais competitivas. Com oferta restrita, os preços do milho devem se manter altos neste ano, segundo Ana Luiza Lodi, analista da StoneX. O governo avalia isentar temporariamente as importações de fora do Mercosul de tarifas para reduzir custos. A ração responde por quase 80% do custo de produção de aves no país.
Processadoras de aves brasileiras enfrentam demanda fraca tanto nas exportações como no mercado interno. Importadores tradicionais como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos reduziram significativamente as compras neste ano. Em agosto, os preços de exportação caíram 20% em relação ao ano anterior.
A China é exceção: as exportações do Brasil para o país asiático mostram alta de 28% neste ano até julho. Mas o país asiático representa apenas 17% das exportações brasileiras de carne de frango. No caso da carne bovina, o cenário é diferente. Os embarques bateram recordes neste ano puxados pela China, que responde por quase 60% das exportações brasileiras nesse segmento.
Embora a alta do dólar impulsione as receitas de exportação, esse fator não tem sido suficiente para compensar o aumento dos custos, comprimindo as margens de exportadores desde maio, segundo César de Castro Alves, consultor de agronegócios do Itaú BBA. Em agosto, as margens da produção de carne de frango ficaram negativas em 5%.
O mercado doméstico não tem ajudado, e o consumo se mostra estável apesar dos preços mais baixos. O desconto da carne de frango em relação à bovina nunca foi tão alto. Embora a demanda por serviços de alimentação comece a dar sinais de recuperação, o movimento em restaurantes ainda é fraco e as escolas permanecem fechadas.
“Enfrentamos uma encruzilhada no setor de aves, que vem trabalhando em ritmo elevado de produção em meio à fraca demanda de exportação e custos crescentes”, disse Alves, do Itaú BBA, em entrevista por telefone. Os produtores precisam reduzir a oferta para elevar os preços e retornar à rentabilidade, afirmou.