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Caos em Hong Kong nos anos 1960 guarda lições para 2019

21 ago 2019, 18:14 - atualizado em 21 ago 2019, 18:14
Hong Kong
Atualmente, Hong Kong enfrenta dois meses de agitação — centenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas, sitiaram o aeroporto, atearam fogo perto de delegacias e atiraram bombas de gasolina contra policiais (Imagem: Justin Chin/Bloomberg)

Foi por 5 centavos. Foi este o reajuste na tarifa para passageiros das barcas Star Ferry que desencadeou os protestos em Hong Kong. Carros e edifícios eram incendiados. A tropa de choque patrulhava as ruas. Bombas de gás lacrimogêneo eram disparadas. E mesmo assim a multidão só crescia.

Isso aconteceu em 1966. Não parou por aí. Um ano depois, manifestantes inspirados pelo Partido Comunista de Mao Tsé-Tung deflagraram revoltas e explosões que mataram 51 pessoas na então colônia britânica.

A polícia de Hong Kong e as forças armadas do Reino Unido lançaram mão de legislação emergencial, buscas e prisões em massa, por vezes sob acusação de uso de força excessiva. Ainda assim, o que veio em seguida foi um conjunto mais amplo de medidas que inaugurou uma época de ouro na cidade.

O governo colonial se empenhou em obras de infraestrutura, incluindo moradia para a população de baixa renda, para tratar dos conflitos sociais subjacentes. Foi adotada uma abordagem mais colaborativa para aliviar as tensões com manifestantes, o que construiu confiança e, eventualmente, ajudou a restaurar a paz.

Atualmente, Hong Kong enfrenta dois meses de agitação — centenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas, sitiaram o aeroporto, atearam fogo perto de delegacias e atiraram bombas de gasolina contra policiais. É difícil não notar as semelhanças com o que aconteceu na década de 1960.

No entanto, até o momento, o que veio do governo de Carrie Lam, que tem apoio de Pequim, foi apenas um reconhecimento mais generalizado da necessidade de reconciliação. “Este é meu compromisso político muito sério e minha responsabilidade perante o povo de Hong Kong “, disse Lam a repórteres na terça-feira, acrescentando que agiria “depois que a violência parar”.

Quando Hong Kong voltou à soberania chinesa, em 1997, foi alterado o delicado equilíbrio entre o público e a polícia que havia sido estabelecido depois da década de 1960. Isso vem impedindo que Lam consiga arquitetar uma solução pacífica para os protestos.

Nas últimas semanas, a polícia tem empregado o rigoroso estatuto contra tumultos que foi raramente usado desde sua aprovação, no auge do caos em 1967, acusando dezenas de manifestantes de crimes com penas de até 10 anos de prisão. Isso agravou as relações tensas entre manifestantes e policiais, que ainda não tinham sido reparadas após os embates durante o Movimento dos Guarda-Chuvas, em 2014, em prol da democracia.

“Na fase final do domínio colonial britânico, o policiamento tinha se tornado bastante cooperativo e comunitário, e não de confronto”, disse Andreas Fulda, professor assistente da Universidade de Nottingham e autor do livro “The Struggle for Democracy in Mainland China, Taiwan and Hong Kong” (“A Luta por Democracia na China Continental, Taiwan e Hong Kong”, em tradução livre).

Nos últimos anos, ocorreu um “distanciamento das estratégias contidas de policiamento da colônia britânica, no sentido de esfriar os ânimos, e houve uma migração para uma rápida politização e militarização da polícia de Hong Kong”, avalia o professor.

Um oficial da polícia declarou a repórteres na quinta-feira que as forças policiais podem lidar com infrações por manifestantes, mas não com queixas mais profundas. Questões políticas precisam de soluções políticas, além da polícia, disse o oficial.

Os protestos deste ano começaram em junho, tendo como estopim um polêmico projeto de lei que teria permitido extradições para a China continental. Manifestantes citam outras motivações, como o fato de os imóveis residenciais na cidade serem os mais caros do mundo e o aumento da desigualdade social.

Lam suspendeu a tramitação do projeto de lei, mas se recusou a retirá-lo formalmente. Pequim e o governo de Hong Kong também se negaram a ceder a qualquer uma das exigências dos manifestantes, incluindo uma investigação sobre as táticas policiais, nem trataram das causas mais amplas da insatisfação popular.