Política

Campanha de Lula elabora plano para política cambial mais intervencionista

21 jul 2022, 8:09 - atualizado em 21 jul 2022, 9:10
Maço de notas de 5 dólares
Para ele, o dólar próximo a 4 reais desde 2018 estava em seu ponto de equilíbrio, mas saltou para em torno de 5,50 reais em 2020 e 2021 com pouca ação da autoridade monetária (Imagem: REUTERS/Gary Cameron)

A equipe por trás do programa econômico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva elabora planos para uma política cambial mais agressiva, incluindo uma busca por maior intervenção na moeda e regulamentação mais rígida de derivativos para conter volatilidades.

Após as diretrizes preliminares do programa de Lula, lançadas em junho, terem descrito a postura do BC como passiva no câmbio, com efeito nocivo sobre a inflação, o economista Pedro Rossi, que coordena o Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas (NAPP) nas áreas monetária e cambial, afirmou que o câmbio é um instrumento de desenvolvimento e deve ser tratado como um preço estratégico.

“Evidentemente ela (taxa de câmbio) deve se conformar às condições, ou seja, deve se adequar ao equilíbrio da economia brasileira, não gerar desequilíbrios importantes. Mas ela deve corrigir as falhas do mercado, a disfuncionalidade, a má formação de preços. Não faz sentido ter a moeda com a maior volatilidade entre as mais importantes e não fazer nada a respeito”, disse.

O real teve a maior volatilidade implícita de três meses entre as moedas latino-americanas desde a pandemia, segundo dados da Refinitiv.

Na região, a queda de 17% da moeda brasileira em relação ao dólar nesse período fica atrás apenas do peso colombiano.

Rossi afirmou ser necessário corrigir desvalorizações excessivas, sendo possível lançar mão de ferramentas de política cambial -como os swaps, subutilizados pela autoridade monetária em sua opinião-, e instrumentos regulatórios.

Ele avaliou que o mercado de derivativos é “completamente desregulado” na comparação com o mercado à vista, e que essa assimetria é disfuncional em determinados momentos.

Rossi lembrou que o governo já adotou no passado políticas voltadas para esse mercado, como IOF sobre posições vendidas em derivativos cambiais, em 2011, quando o governo da ex-presidente Dilma Rousseff buscava evitar a apreciação excessiva do real diante de políticas monetárias expansionistas adotadas pelas principais economias do mundo.

“A regulação pode ir no sentido de transferir parte dessa liquidez do mercado de derivativos para o mercado de câmbio primário, evitar excesso de posições de determinados agentes, evitar o excesso de posições especulativas que sejam identificadas como distorcivas para a taxa de câmbio”, completou.

A avaliação coloca a equipe de Lula em desacordo com a atual gestão do Banco Central, cujo presidente Roberto Campos Neto tem mandato até 2024.

O ex-ministro Guido Mantega, que inclusive cunhou o termo “guerra cambial” quando o real enfrentava os desafios da sobrevalorização, disse à Reuters que o BC “soltou o câmbio” nos últimos anos, com menos intervenções que o necessário.

Para ele, o dólar próximo a 4 reais desde 2018 estava em seu ponto de equilíbrio, mas saltou para em torno de 5,50 reais em 2020 e 2021 com pouca ação da autoridade monetária.

“O Banco Central não deveria ter permitido essa desvalorização excessiva”, disse.

A perda de valor da moeda brasileira tem ajudado a alimentar as pressões inflacionárias num momento em que o mundo se confronta com uma nova configuração produtiva após os choques causados pelo coronavírus e mais recentemente pela guerra da Ucrânia.

Para Rossi, o BC não tem procurado identificar as causas do comportamento do real, apoiando-se na crença majoritária de que o mercado está buscando sozinho seus equilíbrios.

Apesar de a independência do BC assegurar que a instituição adentrará o novo governo com os mesmos dirigentes e com sua atuação resguardada, ele disse que o governo pode definir diretrizes mais intervencionistas por meio do Conselho Monetário Nacional (CMN), onde o Executivo conta com dois votos, contra um voto do BC.

“O BC vai responder ao CMN. BC não é autônomo à definição dos objetivos de política econômica. Ele é autônomo na condução dos instrumentos”, afirmou.

Crítico à independência formal da autarquia, Mantega avaliou ser difícil alterar a regra atual, ressaltando que a campanha de Lula trabalha com a hipótese de que esse status permanecerá.

O ex-ministro, que presidiu o Conselho Monetário por quase nove anos, vê com ressalvas a estratégia de usar o colegiado para pressionar uma mudança de rumo na atuação do BC.

“É função do Conselho Monetário estabelecer regras e a estratégia da política monetária, mas um Banco Central independente tem como fazer um estrago se for mal administrado. O Conselho pode atenuar (disfunções), mas não pode resolver”, afirmou.

Mantega defende que Lula, se eleito, busque diálogo com Campos Neto para encontrar convergências entre a autoridade monetária e as prioridades da próxima gestão.

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