Política

Câmara aprova texto-base de projeto da autonomia do BC

10 fev 2021, 17:39 - atualizado em 10 fev 2021, 18:25
Camara dos Deputados
A instituição financeira seguirá atuando pela estabilidade do poder de compra da moeda, seu objetivo principal (Imagem: Michel Jesus/Câmara dos Deputados)

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira o texto-base de projeto que confere autonomia formal ao Banco Central, de forma a garantir à instituição financeira que execute suas tarefas sem risco de interferência político-partidária.

Simbolicamente pinçada como a primeira medida a ser votada sob a gestão do novo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a proposta seguirá à sanção presidencial caso não seja alterada pela Casa durante a análise de emendas ao texto.

Deputados devem votar, ainda nesta quarta, pelo menos cinco emendas em votações separadas.

O capital político de Lira neste início de mandato foi atestado, ainda que sob protestos e manobras de obstrução da oposição, pelo placar de aprovação do texto principal: foram 339 votos favoráveis e 114 contrários.

Já analisado pelo Senado, o projeto inicialmente tratava da nomeação e demissão do presidente e diretores do Banco Central do Brasil.

Mas durante a votação, senadores alteraram a proposta para também abordar a autonomia e os objetivos do BC.

A proposta também estabelece que o Banco Central terá o status de “autarquia de natureza especial”, sem subordinação a qualquer ministério.

A instituição financeira seguirá atuando pela estabilidade do poder de compra da moeda, seu objetivo principal.

O texto elenca, dentre os objetivos secundários do BC, a tarefa de zelar pela estabilidade e eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego.

“Esta é, sem dúvida, mais uma grande conquista para as trabalhadoras e os trabalhadores brasileiros, que se verão protegidos por um órgão governamental autônomo e que, doravante, terá por objetivo zelar pela adequada oferta de empregos na economia”, diz o relator, deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), no parecer.

Há ainda a previsão de um escalonamento para a indicação do presidente e diretores do BC. O mandato do presidente do Banco Central do Brasil terá duração de quatro anos, com início no dia 1º de janeiro do terceiro ano do mandato do Presidente da República.

Dois diretores terão mandatos com início no dia 1º de março do primeiro ano de mandato do presidente da República; dois a partir de 1º de janeiro do segundo ano do mandato do residente da República; outros dois em 1º de janeiro do terceiro no do mandato do presidente da República; e mais dois diretores com mandatos a partir do quarto ano do mandato do Presidente da República.

Banco Central
Esta é, sem dúvida, mais uma grande conquista para as trabalhadoras e os trabalhadores brasileiros, que se verão protegidos por um órgão governamental autônomo (Imagem: Leonardo Sá/Agência Senado)

Por trás do estabelecimento de mandatos fixos para o presidente e para os diretores da autarquia com mandatos não coincidentes com o do presidente da República, está a ideia de afastar qualquer ingerência política sobre as decisões do BC em sua missão de controlar a inflação.

Há ainda dispositivo no texto que trata da exoneração de presidente e diretores do BC, que poderá ocorrer a pedido, por enfermidade que incapacite o titular para o cargo, diante de condenação por improbidade administrativa ou crimes que impeçam o acesso a cargos públicos em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, ou quando “apresentarem comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos do Banco Central do Brasil”.

Judicialização

Para o relator na Câmara que preferiu não sugerir mudanças ao texto de forma a evitar uma segunda análise no Senado Federal, o projeto oferece “maior previsibilidade, clareza de regras e de segurança jurídica”.

O deputado argumentou, ainda, que as dificuldades econômicas agravadas pela crise do coronavírus conferem urgência à aprovação da proposta.

“Nosso nível de endividamento encontra-se bastante alto e nos cabe, neste momento, contribuir para tentar solucionar ou reduzir ao máximo os impactos que podem advir de um nível tão elevado de endividamento. Neste difícil cenário, cuidar do quadro institucional de nossa economia configura-se como de fundamental importância para a minoração dos efeitos do lado financeiro desta grave crise”, defende Costa Filho, no parecer.

A autonomia formal do BC é considerada há anos crucial pela autoridade monetária, tendo sido formalmente colocada na agenda prioritária do BC na gestão do ex-presidente Ilan Goldafajn, no governo Michel Temer.

Antes, a então presidente Dilma Rousseff chegou a se posicionar a favor da autonomia “relativa” do Banco Central.

O presidente anterior da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já afirmava que o projeto poderia ir a voto. Mas o tema ganhou prioridade e chegou à pauta com a eleição de Lira, que, a partir de uma reunião do colégio de líderes, o elegeu como primeiro teste de fogo para seu capital político.

A discussão da medida teve início na terça-feira, em sessão marcada por embates. A oposição tentou adiar a votação, por meio de requerimentos, e defendeu que o tema precisava de mais discussão.

A deputada Fernanda Melchionna (PSOL- RS), argumentou que a resolução em vigor na Câmara, com votações de forma remota, estabelece prioridade a temas de enfrentamento à crise do coronavírus na pauta da Casa.

“Não é matéria que diz respeito à pandemia, não tem nenhuma urgência senão a ganância dos mercados. Não tem nenhum sentido votar essa matéria”, argumentou a deputada, em questão de ordem negada pelo presidente da Câmara.

Até mesmo o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), identificado com as pautas de direita e declaradamente favorável à autonomia do BC, alertou para o risco de judicialização dessa proposta específica.

Segundo ele, há um “vício insanável”. O parlamentar explicou que a iniciativa direcionada ao BC não poderia ter partido do Senado, justamente por se tratar de matéria que interfere na organização administrativa do Executivo, tarefa que caberia ao chefe do Poder.

“Minha posição evidentemente é favorável à autonomia do Banco Central”, disse o deputado do DEM, da tribuna.

“Porém, existe, sim, um vício insanável que esse Congresso Nacional e o governo federal vão reclamar posteriormente, porque o Supremo Tribunal Federal infelizmente, por vício deste Congresso Nacional, vai derrubar a autonomia do Banco Central e isso por jurisprudência muito bem firmada, já, pelo Supremo Tribunal Federal”, disse.

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