Caixa muda lógica para não perder seu principal ativo: 148 milhões de clientes
Enquanto bancos digitais quebram a cabeça para manter a expansão da base de clientes em um mundo onde conquistá-los ficou mais caro, a Caixa Econômica Federal (CEF) ostenta 148 milhões deles, atraídos por produtos como o crédito imobiliário e a distribuição de recursos de programas do governo federal.
Menos de 10%, porém, têm um relacionamento bancário recorrente com a instituição.
Uma das ambições da nova presidente, Daniella Marques, é mudar esse quadro, e o foco no cliente é a principal aposta, diz o vice-presidente de rede de varejo do banco, Julio Volpp, ao Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado. “Quando pego esses 148 milhões de clientes que têm na Caixa essa primeira oportunidade (de ter um banco), e a quantidade de correntistas que movimentam suas contas, vejo que o cliente que entrou pela porta não está escolhendo a Caixa como seu primeiro banco de relacionamento”, diz Volpp. Para ele, o foco em produtos é a causa desse “funil severo”.
A concorrência com fintechs tornou mais desafiador para os bancos obter receitas nos produtos isolados, diante de rivais que oferecem contas sem taxas e cartões sem anuidade.
Isso tem feito as instituições migrarem o foco para o relacionamento com o cliente, para que ele resolva a maior parte de sua vida financeira ali, da conta corrente ao seguro de vida.
O banco estatal já deu um primeiro passo: o Caixa pra Elas, lançado em agosto. As mulheres são 53% dos clientes, mas não chegam a 2% do público de alguns produtos.
Para aumentar essa presença, a Caixa agregou produtos que já possuía sob uma oferta mais adequada a empreendedoras, público a que Daniella Marques dedicava esforços desde quando era secretária do Ministério da Economia.
Além da reconfiguração das agências para o programa, com espaços dedicados ao atendimento para mulheres, a Caixa criou um acesso no aplicativo Caixa Tem – essa seção já teve mais de 13 milhões de acessos.
Não à toa
A experiência com os canais de atendimento é um dos principais pontos que satisfazem ou aborrecem os clientes, segundo Silvio Marote, sócio da consultoria Bain & Company, além das tarifas ou do acesso a crédito. “O que é mais sustentável é um atendimento menos organizado por produtos e mais organizado por necessidades de clientes”, diz Marote.
Volpp, da Caixa, reconhece que repaginar a experiência dos clientes não é um processo rápido. Primeiro porque envolve pensar cada grupo de clientes: a ideia da Caixa é separar a base em diferentes nichos para pensar suas necessidades detalhadamente e criar ofertas específicas.
Ele diz que um grupo a que a lógica pode ser aplicada é o dos microempreendedores individuais (MEI), por exemplo.
Segundo, porque depende de uma readequação de todos os canais, entre eles o físico, fundamental para a CEF. “Iniciamos uma discussão de modelos de atendimento para que todos sejam encerrados em uma mesma estação (mesa)”, conta Volpp.
Bruno Diniz, sócio da consultoria de inovação Spiralem, ressalta que, na Caixa, a agência física tem um papel crucial. “Para o público que a Caixa atende, ter uma rede de agências faz toda a diferença. Por mais que ele esteja se digitalizando, ainda sente necessidade de contato físico.”
A Caixa acredita que a proximidade com públicos “distantes” do sistema financeiro pode ajudá-la no relacionamento com os clientes que se assustam com o “bancarês”. “O perfil do cliente da Caixa é talvez invertido ao do resto dos bancos, quase reflete a pirâmide da população”, diz Volpp. “Esse cliente acha que banco não é lugar para ele e vê a Caixa como possibilidade de relacionamento por ter esse vínculo com o FGTS, seguro desemprego, Casa Verde e Amarela ou Auxílio Brasil.”
Para Marote, da Bain & Company, o principal desafio para o sucesso dos bancos na estratégia de olhar mais para o cliente é cultural: é preciso convencer cada área a agir de acordo com a nova orientação. O que coloca um desafio adicional para um banco com 90 mil funcionários e 26 mil pontos de atendimento.
Vantagem
Um trunfo da Caixa nessa disputa, segundo Volpp, é o aplicativo Caixa Tem, que teve crescimento exponencial com o pagamento do auxílio emergencial, em 2020, e “bancarizou” 38 milhões de pessoas. Em julho, segundo dados da SensorTower compilados pelo Bank of America, a plataforma tinha 126 milhões de downloads e 21 milhões de usuários ativos, o maior total entre os grandes bancos.
Diniz, da Spiralem, afirma que nessa arena a Caixa concorre com pesos-pesados: além das fintechs, rivaliza com carteiras digitais, como PicPay e Bitz. Nesse segmento, o foco é o público de baixa renda, justamente o maior alvo da CEF.
Ainda na gestão anterior, o banco começou a utilizar a plataforma para distribuir produtos que seriam inviáveis na rede de agências, como o microcrédito. “O que ouvimos de pessoas da Caixa é de que a ideia é, com o passar do tempo, transformar (o Caixa Tem) em uma espécie de superapp social”, diz Diniz.
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