Caio Mesquita: Sem chance de vitória
Em uma missão de treinamento, a nave aproxima-se de uma zona neutra, território de entrada proibida a um veículo militar.
A jovem capitã aplica serenamente os conhecimentos recém-adquiridos na academia, orientando a execução de uma rota parabólica tendo a zona neutra como referência à trajetória.
Os experientes oficiais da ponte de comando, veteranos de inúmeras expedições, executam a manobra com precisão, deslizando a nave na direção planejada.
De repente, a tranquilidade é abruptamente interrompida. A oficial responsável pela comunicação reporta o recebimento de sinais de perigo. A pedido da capitã, o sinal é imediatamente colocado no viva-voz.
Apesar da baixa qualidade do sinal, não há dúvida de que se trata de um pedido de socorro urgente. Em meio a bastante interferência, é possível entender que se trata de um problema grave envolvendo uma embarcação civil.
Sob claro estresse, o interlocutor consegue reportar sua localização. Familiarizada com a área, a capitã indica o local como dentro da zona neutra.
Enquanto isso, o computador de bordo processa a identificação do objeto. São mais de 380 vidas a bordo, entre tripulação e passageiros.
Serena até este momento, a capitã sussurra para si mesma uma palavra de frustração. Segundos depois, recuperando rapidamente a postura, ordena a efetivação do resgate.
Depois de alertarem para os riscos do resgate, os oficiais da ponte redirecionam a nave e rapidamente entram na zona neutra.
A tensão aumenta drasticamente como se a tripulação já antecipasse o que estava para acontecer.
Instantes depois, a voz metálica do computador de bordo aponta para a aproximação de naves inimigas. São três, como mostra o monitor principal.
Após frustradas tentativas de comunicação com os adversários, resta pouco a se fazer a não ser levantar os escudos de proteção contra o ataque iminente.
Numa última tentativa de evitar o pior, a jovem capitã ordena a fuga imediata. Infelizmente, é tarde demais e torpedos inimigos furam os escudos de proteção e atingem a ponte de comando.
Os ataques são devastadores, atingindo mortalmente a tripulação. Em segundos, todos os oficiais perdem a vida, com exceção da capitã, que, desolada, contempla o macabro cenário.
A cena de destruição é interrompida repentinamente pela entrada de um oficial de alta patente. A luz acende e os oficiais, os mesmos que pareciam mortos instantes antes, levantam-se e cumprimentam a chegada do almirante com um leve sorriso.
E assim se encerrou a tentativa de resgate do Kobayashi Maru, a prova de treinamento para jovens oficiais da lendária série de ficção científica “Star Trek”, apresentada nas cenas iniciais do filme de 1982, “Star Trek 2 – A Ira de Khan”.
Caso queira assistir à cena, protagonizada pela bela vulcana Kirstie Alley, clique aqui.
A maravilhosa série fascinou minha infância e juventude. Entre suas inúmeras qualidades, “Jornada nas Estrelas”, como ficou conhecida por aqui, tinha a capacidade de apresentar com naturalidade situações e temas da condição humana, sem perder o dinamismo da ficção científica.
Voltando ao Kobayashi Maru, o episódio traz um cenário sem chance de vitória, “no-win scenario”. A ideia é observar como os jovens oficiais reagiriam dentro deste contexto, avaliando sua capacidade de decisão.
No posto de comando do Banco Central, Roberto Campos Neto busca resgatar seu Kobayashi Maru, domando a inflação, que, impertinentemente, segue subindo.
Ao elevar juros, o Bacen faz o que tem que ser feito. Assim como a jovem capitã entendeu que não podia dar as costas a um navio com centenas de vidas em perigo, a autoridade monetária sabe que precisa agir para conter a inflação. O descontrole de preços é cruel, especialmente para as faixas mais carentes da população.
Por outro lado, a economia mostra sinais incômodos de frouxidão, haja vista os recentes números fracos do varejo, divulgados nesta semana. Subir juros é entrar na zona neutra onde terríveis klingons armam a emboscada.
Na série, o único que conseguiu superar o desafio do Kobayashi Maru foi o próprio Capitão Kirk, cuja estratégia passou pela reprogramação do próprio desafio.
Esperamos que o nosso Roberto Campos, por sinal com boa pinta para o papel, também tenha sucesso na sua missão de resgate da nossa economia.
Um abraço,
Caio.