Cadastro Positivo: como a nota de crédito vai melhorar a sua vida e a de todos os brasileiros
Por Renata Velloso – Para o Terraço Econômico
Já se foram 50 dos primeiros 100 dias do governo Bolsonaro. Entre tretas e escândalos pouca coisa andou na prática. Talvez a medida que mais tenha chamado a atenção foi a flexibilização do acesso a posse de armas no país, mas a medida que, de fato, pode ter mais efeitos positivos para todos foi pouco divulgada.
Trata-se da aprovação da Câmara no dia 20 de fevereiro do projeto de lei complementar PLP 441/17 que cria o novo cadastro positivo de crédito. O projeto foi gestado ainda pela equipe econômica do governo Temer, mas detém apoio também da atual equipe encabeçada por Paulo Guedes.
Na realidade o cadastro positivo de crédito já existe desde 2011, o que muda com o novo projeto (que agora segue para apreciação do Senado) é que as pessoas físicas e jurídicas que tomam empréstimos serão incluídas automaticamente nesse cadastro. Antes a pessoa que queria participar do cadastro positivo tinha que pedir para ter seu nome incluído, com a aprovação desse projeto a lógica se inverte, ou seja, quem não quer fazer parte precisa pedir para sair.
A nota de crédito já é utilizada nos EUA desde o início da década de 70, e hoje mais de 200 milhões de estadunidenses tem uma nota de crédito avaliada por um dos três bureaus de crédito que atuam no país: a TransUnion, a Equifax e a Esperian. Vários outros países como Austrália, China, Índia, Reino Unido, Alemanha, entre outros, usam sistemas semelhantes ao dos EUA e que deve ser implantado no Brasil.
A nota de crédito é um número de três dígito calculado através de algoritmos estatísticos que tem como objetivo avaliar o risco de crédito de cada indivíduo ou empresa. Quanto maior a sua nota de crédito, menor é o risco de calote percebido por quem irá lhe emprestar dinheiro. O cálculo da nota de crédito leva em conta o seu histórico de pagamentos, ou seja, toda vez que você paga uma dívida em dia, seja com o cartão de crédito, seja com um banco ou uma seguradora, a sua nota é impactada positivamente, demonstrando que você é um bom pagador. Quando você atrasa ou deixa de pagar uma dívida, por outro lado, a sua nota diminui.
É importante ressaltar que o cadastro negativo já existe no Brasil faz muito tempo. Ou seja, quando você deixa de pagar uma dívida ninguém lhe pergunta se pode ou não colocar seu nome no Serasa ou no SPC, o que muda agora é que os seus pagamentos em dia também passam a ser considerados no seu histórico, o que deve melhorar a sua nota final.
Do ponto de vista das instituições financeiras que emprestam dinheiro a nota de crédito facilita a alocação mais eficientes de riscos, além de proporcionar um processo de decisão mais rápido e barato. Essa informação deve também aumentar a concorrência no mercado de crédito, hoje muito concentrado nos grandes bancos varejistas. Os grandes bancos têm hoje concentrada as informações de pagamento dos seus clientes, isso gera uma assimetria de informações que o cadastro positivo deve quebrar. Com isso, como ocorre toda vez em que a concorrência aumenta, o custo do crédito, ou seja, os juros pagos pelos consumidores deve cair.
Já para os consumidores o cadastro positivo deve não apenas diminuir o custo do empréstimo como também facilitar o acesso, principalmente entre os mais pobres. Nos EUA o acesso ao crédito dos 20% mais pobres da população aumentou em 70% entre 1970 (quando o cadastro positivo foi implementado por lá) e 2001.
Para as empresas, principalmente as pequenas e médias que têm dificuldade de acessar o mercado de capitais o cadastro positivo também aumenta o acesso ao crédito, reduz os juros e facilita a administração de risco em momentos de crise financeira. Nos EUA foi calculado que o custo para concessão de crédito para empresas despencou de uma média de $500 a $1.000 dólares para $48 – $95 após a implementação das notas de crédito.
A implementação do cadastro positivo também apresenta benefícios macroeconômicos, uma vez que diminui a restrição de liquidez em momentos de crise econômica suavizando a volatilidade dos ciclos econômicos.
Além dos grandes bancos, que passarão a ter mais concorrência de instituições menores como as fintechs no mercado de crédito, os cartórios são outros que podem perder com essa medida, já que hoje ganham muito com a burocratização necessária para concessão de crédito no Brasil.
Apesar de a nota de crédito não afetar o sigilo bancário propriamente dito, o principal risco dessa medida está no vazamento de informações. A Equifax, por exemplo, uma das três grandes empresas de nota de crédito dos EUA teve seu sistema invadido em 2017 com vazamento de informações confidenciais dos seus clientes. Até hoje não se sabe exatamente como esses dados vazaram, mas há suspeitas inclusive de envolvimento de espionagem internacional.
Com isso, apesar de todos os benefícios é fundamental que se estabeleça medidas de segurança eficientes para evitar vazamento de dados que podem prejudicar milhões de consumidores e colocar em risco a confiança de todo o sistema.
Renata Kotscho Velloso
Médica pela Unicamp, também com graduação em administração pública pela EAESP-FGV, vive e trabalha na Califórnia.
Referências
http://www.perc.net/wp-content/uploads/2013/09/Latin_America.pdf
http://www.perc.net/wp-content/uploads/2013/09/fcra_report.pdf
https://www.nber.org/papers/w8087
http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download;jsessionid=FDF2BFFF97136FE86C912AC30872D656?doi=10.1.1.111.3481&rep=rep1&type=pdf
https://www.extremetech.com/internet/285827-the-equifax-breach-might-have-been-a-foreign-intelligence-operation
As três pautas no Congresso que interessam a Paulo Guedes