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Bruno Dequech: Ecossistema de Fintechs encara as dores do crescimento com fusões e aquisições

21 jun 2021, 17:14 - atualizado em 21 jun 2021, 17:15
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O Open Banking representa uma alteração com potenciais ainda mais profundos no clima de competitividade (Imagem: Divulgação)

Unicórnios, decacórnios e enormes campos inexplorados. Parece conto de fadas, mas se trata de algo bem palpável: o ecossistema das 1.150 fintechs brasileiras. Elas receberam US$ 1,15 bilhão nos primeiros cinco meses de 2021, um momento histórico em termos de investimento no setor.

Tem notícia quase todo dia: uma das mais recentes é o investimento de US$ 430 milhões da Advent International na empresa de pagamentos Ebanx com o objetivo de financiar crescimento na preparação para uma abertura e capital mais para frente.

Há alguns dias foi anunciada a conclusão da série G de investimentos do Nubank, que contou com aportes do Berkshire Hathaway e de um grupo de investidores liderado pela Sands Capital.

Somada aos valores levantados em janeiro, essa se tornou a maior rodada de captação de recursos por uma empresa de tecnologia da América Latina, de acordo com a fintech, chegando a US$ 1,15 bilhão. O valor de mercado da companhia subiu para impressionantes US$ 30 bi. Que animal é esse, um tri-decacórnio?!

O Nubank reportou crescimento de 50% em 12 meses terminados em março deste ano. Neste período de um ano da pandemia, a base de clientes foi de 23 milhões para 35 milhões e agora já está em torno de 40 milhões.

Com isso, a empresa, fundada em 2013, com um investimento de US$ 3 milhões, passou XP, BTG Pactual e até o Banco do Brasil em capitalização de mercado, perdendo apenas para Itaú Unibanco, Bradesco e Santander, este último com valor de US$ 34 bi. Mais adiante deverá vir o tão aguardado IPO.

Esses números do Nubank são o sinal mais contundente da explosão de consumo de tecnologia causada no setor financeiro pela pandemia.

As novas soluções de meios de pagamento estão trazendo cada vez mais eficiência e redução de custos, com benefícios diretos à população, que passou a utilizar mais os bancos digitais, cartões e carteiras digitais.

O número de brasileiros não bancarizados, embora tenha sido reduzido em 10 milhões ano passado, ainda é considerado alto. Segundo o instituto Locomotiva Pesquisa & Estratégia, dois em cada 10 adultos do país não haviam utilizado uma conta bancária no mês anterior à pesquisa, feita em janeiro.

Dos que possuem acesso aos serviços bancários, 39% declararam ter conta em bancos digitais, percentual que chega a 48% na faixa de 18 a 29 anos.

As fintechs, com foco em usabilidade e acesso, cumprem um papel importante para incluir esse público ainda “desbancarizado”.

Se o front B2C vai bem, o B2B não tem do que reclamar. Dados preliminares de uma pesquisa realizada pela EY com 126 pequenas empresas brasileiras mostraram que 25% já têm algum tipo de relacionamento com fintechs.

O ASAAS Gestão Financeira foi autorizado pelo Banco Central a funcionar como instituição de pagamento, condição na qual se encontram hoje apenas 31 entes jurídicos no país.

A empresa desenvolveu uma ferramenta que automatiza pagamentos para empreendedores e pequenos negócios. O serviço fornece à empresa a capacidade de cobrar seus clientes de qualquer maneira, seja via PIX, boleto ou Cartão, acessar um software de gestão financeira e ainda cobrar clientes automaticamente.

Depois de cobrar, os usuários conseguem usar seu dinheiro de várias formas, seja via PIX, pagamento de boletos e contas de consumo, até usando um cartão de crédito que funciona com o saldo em conta de pagamentos como limite.
As ações do BC ainda compõem a paisagem do “Vale das Oportunidades”.

Falo aqui de ações de regulamentação, do Open Banking e do Pix. O profundo processo de modernização do sistema financeiro tem trazido ao setor novos produtos e serviços em busca de fomentar a competitividade.

O Pix é o melhor exemplo. Lançado em novembro de 2020, o sistema já é um dos mais bem-sucedidos no mundo, tendo movimentado em seis meses mais de R$ 1 trilhão, tornando-se o responsável por metade das transferências em dinheiro no Brasil.

O Open Banking representa uma alteração com potenciais ainda mais profundos no clima de competitividade.

No último ano, pudemos observar também uma primeira onda de consolidação de fintechs no Brasil, da qual os dois exemplos mais recentes foram a aquisição de 4,99% do Banco Inter  (Imagem: CafeCredit.com/Creative Commons)

Será um verão longo?

Mas nem só de vales férteis vive o ecossistema de fintechs nacional.

O crescimento rápido provoca algumas dores. Uma delas é no front do atendimento ao consumidor. Por mais que as ferramentas tecnológicas sejam acessíveis e possam ter impacto positivo na bancarização, a indústria enfrentou um público mais inexperiente e teve problemas de atendimento, performando em alguns casos pior que os bancões.

No último ano, pudemos observar também uma primeira onda de consolidação de fintechs no Brasil, da qual os dois exemplos mais recentes foram a aquisição de 4,99% do Banco Inter pela Stone por R$ 2,5 bi e da Base ERP pelo Asaas.

No contexto de um mercado bastante fragmentado sem grandes líderes consolidados, as operações têm, na maioria das vezes, o objetivo de adquirir as tecnologias, os produtos e principalmente os times. Até agora não se tratou muito de disputa por market share, liderança ou ganho de escala.

Acontece que os bancos tradicionais não vão ficar do alto de seus picos observando a guerra na planície sem se mexerem.

Pelo tamanho e poder de fogo, eles podem mudar a dinâmica dos processos de M&A que vêm acontecendo, fazendo um hedge contra o crescente assédio das fintechs por sua base de clientes, mas que, em condições normais, não seria uma preocupação tão imediata. Não custa relembrar que entre o Nubank e o Santander só há US$ 4 bilhões em diferença de valor de mercado.

Não podemos esquecer que varejistas, Big Techs e marketplaces também entraram nessa disputa com os bancões.
Concordo quando José Securato, fundador da Saint Paul Advisors, afirma que as operações de M&A serão uma caminho para enfrentar os desafios do segmento, em termos de liquidez, escalabilidade, relacionamento com o cliente, ao mesmo tempo em que também funcionam como saída para as instituições financeiras tradicionais que estiverem interessadas em continuar relevantes.

Que venham mais decacórnios!

*Bruno Dequech Ceschin é Co-Fundador & Presidente do Conselho de Administração da JUPTER