Brasil vê profusão de pesquisas eleitorais e encara diferenças nas metodologias
A ampliação do número de pesquisas eleitorais divulgadas publicamente, algumas contratadas por corretoras de investimentos também em busca de visibilidade, intensifica o debate sobre as diferentes metodologias no momento em que alguns levantamentos mostram queda na distância entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) na corrida ao Palácio do Planalto.
Enquanto institutos como Ipec (sucessor do Ibope), Datafolha e Quaest –contratado pela corretora Genial Investimentos– optam pelo modelo tradicional de entrevistas presenciais, também existem aqueles que optaram por entrevistas telefônicas, que tiveram seu auge na pandemia, e até pela coleta de respostas pela internet.
Ipespe, contratado pela XP Investimentos, FSB Pesquisa, que faz levantamentos para o banco BTG Pactual, e PoderData fazem seus levantamentos por telefone, por exemplo. Por outro, lado, o instituto AtlasIntel escolheu a coleta online.
Na mais recente rodada das principais pesquisas, todas divulgadas entre os últimos dias de julho até esta quarta-feira, a vantagem de Lula, que lidera a corrida ao Planalto, nos levantamentos telefônicos é de 7 pontos, na pesquisa BTG/FSB, e de 8 pontos na Poder Data.
Em sondagens presenciais, Lula tem frente de 12 pontos, na Genial/Quaest, e 18 pontos, pelo Datafolha. Todas os levantamentos têm margem de erro de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.
Questionados pela Reuters, responsáveis por institutos veem todas as metodologias como válidas, desde que sejam utilizadas ferramentas para compensar a desvantagem de cada um dos modelos.
“Esse é um falso dilema”, disse Felipe Nunes, CEO da Quaest. “O inimigo real da sociedade são as pesquisas falsas, as que são inventadas ou compradas para distorcer a realidade.”
Márcia Cavallari, CEO do Ipec, explica porque seu instituto só divulga os resultados de pesquisas presenciais. “Preferimos divulgar apenas as pesquisas eleitorais de forma presencial porque entendemos que maximizamos as possibilidades para representar o eleitorado como um todo, além de podermos usar recursos visuais (discos, cartelas, simulação de urna, etc) que facilitam a tarefa dos entrevistados”, disse ela à Reuters, por e-mail.
Entre os argumentos pró-modelo presencial estão o acesso à população de menor renda e a possibilidade de apresentar os nomes dos candidatos em um disco, o que elimina um possível viés de uma lista de um questionário online ou de uma voz listando os candidatos.
Ao mesmo tempo, há maior dificuldade em coletar dados de eleitores de renda mais elevada, que muitas vezes moram em condomínios que dificultam o acesso do entrevistador ou que raramente transitam por pontos de fluxo nas cidades, preferindo locomover-se de carro.
Mas, na avaliação do CEO da Quaest essa aparente deficiência pode até contar a favor do modelo presencial.
“Se a gente olha para o padrão de votação e de abstenção na sociedade brasileira, você vai ver que o eleitor que mais falta na eleição é o eleitor de renda média, de grandes cidades do Sudeste, e as pesquisas presenciais são justamente as que têm dificuldade de falar com esse público”, disse.
“Ou seja, quando a gente opta por fazer a pesquisa domiciliar com essa metodologia, a gente garante uma alta cobertura no tipo de eleitor que tem mais chance de ir votar no dia da eleição”, afirmou Nunes.
Na outra ponta, os adeptos das pesquisas telefônicas e pela internet apontam o alto custo dos levantamentos presenciais –com remuneração de entrevistadores e locomoção em um país continental– e também argumentam que a coleta online ou telefônica –muitas vezes por robôs– torna a entrevista mais impessoal.
“Não existe no último ciclo eleitoral no Brasil (pleito municipal de 2020) comprovação de que as pesquisas presenciais são mais precisas do que as pesquisas telefônicas ou que as pesquisas web”, disse à Reuters o CEO da AtlasIntel, Andrei Roman.
“O que é mais importante não é a metodologia em si, mas a experiência que um instituto tem em usar bem e desenvolver essa metodologia, e isso é construído ao longo do tempo. Por isso que eu acho importante olhar a trajetória dos institutos e não simplesmente considerar que uma metodologia específica seria superior”, avaliou.
Censo ausente e preferência pelas presenciais
À parte das diferenças metodológicas, um desafio aparentemente mais latente para os diversos institutos neste ano especificamente é a realização das amostras para as pesquisas, diante da não realização do Censo em 2020.
Embora alguns institutos apontem que os dados do eleitorado do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) Contínua permitam a formulação de amostras fidedignas, analistas ouvidos pela Reuters concordam que o Censo faz falta.
“Por ora digamos que estamos trabalhando com uma informação incompleta e potencialmente imperfeita”, disse o analista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.
Diante de várias possibilidades de coleta de dados, o modelo presencial parece ter uma ligeira vantagem, ao menos na preferência de analistas. O Eurasia Group, por exemplo, afirmou em relatório recente a clientes que as sondagens telefônicas têm um viés favorável a Bolsonaro.
Cortez, da Tendências, conta que acompanha todos os levantamentos independente da metodologia, mas vê a coleta presencial tem um peso maior.
“A presencial me parece que tem um peso por conta da amostragem pegando mais os vulneráveis, que é uma parcela importante do eleitorado.”
O também analista e CEO da Dharma Political Risk, Creomar de Souza, aponta a proximidade com o eleitor, presente na modalidade presencial, como importante na coleta de dados.
“Para colher a opinião de uma pessoa, quanto mais próximo você está dessa pessoa, quanto mais neutro você apresenta aqueles dados, melhor você colhe as informações”, disse.
Ainda assim, ele também opta por observar todos os levantamentos disponíveis quando realiza análises e traça cenários.
“Mesmo que do ponto de vista metodológico a gente possa ter uma ressalva com uma pesquisa ou outra, todas as pesquisas nos dão algum tipo de insight, porque as perguntas muitas vezes são diferentes.”
Além das diferenças no método de coleta, é justamente na forma de perguntar que pode estar a explicação para algumas das diferenças de resultados vistas em algumas pesquisas, não necessariamente para o pleito presidencial ainda, mas já para as disputas estaduais, que ainda estão menos presentes no radar do eleitorado.
Por exemplo, as pesquisas divulgadas no mês passado por Quaest e AtlasIntel para o governo da Bahia. O primeiro apontou ACM Neto (União Brasil) com 61% à frente de Jerônimo Rodrigues (PT) com 11%. O segundo instituto apontou vantagem bem menor do ex-prefeito de Salvador: 39,7% a 32,6%.
“A nossa pesquisa colocou na lista de candidatos também os partidos de cada um. Quando você pergunta: ‘você votaria no Jerônimo, do PT?’ é totalmente diferente de você perguntar ‘você votaria no Jerônimo'”, disse Roman, da AtlasIntel.
“Na pesquisa Quaest eles colocaram os dois dados. Não colocaram ‘candidato do PT’, mas colocaram ‘apoio do Lula'”, disse.
No levantamento da Quaest, quando Rodrigues é apontado como candidato de Lula, ACM Neto aparece com 43% contra 38% do petista.
“Duas pesquisas que aparentemente são muito discrepantes, de fato não são nada discrepantes. É só uma questão de como você pergunta”, disse Roman.
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