Brasil perde chance de lucrar com falta de gás na Europa por falta de infraestrutura; entenda
Com o inverno no Hemisfério Norte começando hoje aumentam-se as preocupações com o agravamento da escassez energética na Europa.
Apesar do êxito em preencher cerca 90% das reservas de gás natural, assegurando para este inverno um suprimento estável, líderes da União Europeia não parecem convictos de que esse cenário se repita no ano que vem.
Dada a necessidade de reabastecimento no médio-prazo, produtores de gás natural liquefeito (GNL) estão posicionados para se beneficiar do mercado de combustível altamente inflacionado na Europa.
O Brasil, apesar de possuir reservas de gás com alto potencial de exploração, não é considerado é um exportador relevante, o que retira das companhias aqui alocadas a possibilidade de competir com países do norte da África, o Catar e o próprio Estados Unidos.
Segundo Pedro Rodrigues, sócio e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a ausência do Brasil na arena mundial é motivada pela falta histórica de ifraestrutura adequada para o transporte de GLN.
O diretor explica que “a exportação de gás é um processo mais dificultoso que o do petróleo, sendo necessário facilities específicas, como plantas de liquefação hoje amplamente ausentes”.
“Nem que as empresas quisessem, a custosa infraestrutura produtiva não seria construída a tempo de atender o mercado europeu nesse momento”, completa.
Compõe o cenário desenhado por Pedro Rodrigues o ‘desperdício’ de cerca de 70 milhões de metros cúbicos de gás natural diariamente, que são reinjetados pela Petrobras (PETR4) nos poços offshore para aumentar o fator de recuperação destes campos.
O diretor do CBIE critica que a reinserção do gás como intermediário do processo de prospecção tiram uma possibilidade mais rentável do seu uso.
“Hoje o preço do gás na Europa equivale a um barril de petróleo cobrado a US$ 300. Estamos jogando fora um produto que custa US$ 300 para vender outro que vale menos de US$ 90”, coloca.
Mesmo olhando para a produção onshore [sobre o continente], feita por ‘petroleiras júniores’ como a Petrorecôncavo (RECV3) e a 3R Petroleum (RRRP3), o representante do CBIE aponta que não há uma produção em escala adequada para atender as demandas internas, prioritárias e deficitárias, e externas.
Atualmente, o suprimento do mercado do Brasil ocorre via importações da Bolívia por dutos e dos Estados Unidos via GNL, gasificado posteriormente em plantas de descompressão.
Em comparação com os Estados Unidos, que chegaram a responder por mais de 70% dos embarques de GNL para a Europa entre os meses de janeiro e setembro, o Brasil possui uma rede de dutos cem vezes inferior.
Europa já pagou US$1,06 tri a mais em energia
A crise energética pela qual atravessa o Velho Continente já levou a um aumento de US$1,06 trilhão nos custos de energia pagos por famílias e negócios do Velho Continente. O estudo, produzido pela think tank Bruegel, foi republicado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
De acordo com os analistas do Bruegel, a inflação de energia pode custar até 6% do PIB anual da União Europeia, caso a ação dos governos seja somente a de subsidiar os custos dos entes privados.
A justificativa estaria na ideia de que “o apoio estatal poderia causar um atraso no ajuste das condições de mercado, criando necessidade para ainda mais suporte”. Ao invés disso, o think tank sugere que os Estados europeus firmem um acordo de “barganha”, que estimule um menor consumo energético na mesma medida que se procure formas de aumentar a oferta.
Brasil de lado: apetite da Ásia e o fim do fornecimento russo pressionam Europa em 2023
O reabastecimento dos estoques depende de um planejamento complexo, que deverá considerar qual será o volume de combustível que sobrará após o inverno de 2022/2023 e, principalmente, se a Europa continuará conseguindo importar volumes recordes de GNL (gás natural liquefeito).
Para manter esse ritmo, os Estados europeus precisarão superar a demanda projetada dos mercados asiáticos, que se preparam para um aumento de consumo de energia, conforme a China se afasta progressivamente das medidas mais restritivas contra a covid-19.
De acordo com um relatório recente da Agência Internacional de Energia (EIA, na sigla em inglês), a recuperação da procura por GNL da China aos níveis de 2021, combinada à completa interrupção do fornecimento de gás russo, pode levar a um ‘gap’ de oferta da ordem de 27 bilhões de metros cúbicos no mercado europeu em 2023.
Com o projeto do Nord Stream 2 amulado, e o Nord Stream 1 fechado, sobraram poucos dutos operacionais ligando a Rússia à Europa.
Novos desdobramentos das sanções econômicas e uma deterioração do cenário da guerra na Ucrânia podem catalisar o fim dos contratos de transporte de gás em 2023.
Na opinião de analistas consultados pelo portal OilPrice, o cenário de escassez deverá obrigar a Europa a manter preços elevados para o gás, a fim de continuar atraindo os transportadores em direção aos seus portos, ao invés de outros destinos competitivos.