Opinião

Bolsonaro: Um Produto Petista

21 set 2018, 9:54 - atualizado em 21 set 2018, 10:04
(Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Por Álvaro Frasson, economista

É de se assustar. Se alguém ousasse falar dessa possibilidade há um ano, daria gargalhadas. Não é possível que o povo brasileiro não aprenda com seus próprios erros ou, como diz Eduardo Bueno, “povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la”. Pois bem, o clichê é mais que atual: define o recente quadro sucessório da Presidência da República.

Não tínhamos notícia de um provável segundo turno tão desastroso para o Brasil desde 1989, quando Lula, nada paz e amor, e Brizola, um órfão getulista, rivalizavam a disputa com o filho do assassino Arnon de Mello. Após os incidentes da época, o Brasil caminhou para uma tentativa socialdemocrata; não obstante, um período próspero para o país, não fosse um pequeno e desapercebido detalhe, mas que provocou constantes rachaduras na sociedade brasileira: o caudilhismo de Luís Ignácio Lula da Silva.

De origem espanhola, porém ungida em terras latino-americanas no século XIX, o caudilho nada mais é que um líder carismático e autoritário, perpetuando-se através de programas populistas, garantindo-o adesão entre seus seguidores. No Brasil, Getúlio Vargas foi a primeira experiência nestes termos: governou ininterruptamente por 15 anos (30-45), se “retirou” em São Borja até 1950, quando retornou aos braços do povo sob o título de “o pai dos pobres”. Se de um lado fez a CLT, iniciou a industrialização e deu voto às mulheres, doutro; perseguia partidos, matava opositores e refundava a república em um centralismo ideológico típico dos caudilhos.

Lula, por sua vez, teve sorte em perder as eleições de 1989 até 1998, dando-lhe a possibilidade de governar o Brasil no período mais próspero do que os antecessores receberam: inflação estabilizada, contas públicas entrando em ordem e, principalmente, os bons ventos chineses da demanda por commodities. Peessedebistas invejavam. Dos seus méritos, a ampliação dos programas sociais como o Bolsa Família (impensável para as contas públicas dos últimos 20 anos) deram a Lula a figura do “pai dos pobres” do século XXI.

Aproveitando a boa maré, Lula iniciou um discurso de reedição da memória nacional, assim como Getúlio fez nos anos 30. Vociferando o bordão “nunca antes na história deste país”, Lula não apenas negava todo o árduo trabalho de Itamar e FHC em ressuscitar um governo moribundo, mas desejava exclusivamente para si o sucesso temporário da economia brasileira. Lula incitava a cada discurso o culto à sua personalidade, sabedor que esta era uma ferramenta de empatia e, portanto, apego popular para novos pleitos eleitorais. Contrário a sua narrativa e de seus seguidores, Lula nunca unificou o Brasil; pelo contrário: mesmo presidente, sempre adotou um discurso de palanque sindical em tom provocativo “às elites”, ainda que não passasse de uma peça teatral.

Lula é apenas uma faceta moderna de Getúlio Vargas.

Passou o tempo, a corrupção emergiu, a sucessora meteu os pés pelas mãos e todo o trabalho petista foi jogado pelo ralo: 13 milhões de desempregados e a maior recessão da história brasileira. Autocrítica nunca foi o forte do PT – aliás, uma das principais características caudilhistas.

A narrativa de beatificação de Lula em meio a um processo de corrupção é, portanto, o oxigênio do sentimento antipetista. Como já disse Ciro Gomes, o PT finge que sofre um golpe, já que se submete às decisões desse mesmo regime. Se o PT realmente acreditasse que o impeachment da Dilma fosse o primeiro passo de uma confabulação entre congresso nacional e STF para prender Lula, seu grupo teria fugido do país.

Logo, o PT usa desta narrativa para, além de retornar ao poder após 14 anos nele, transformar o eterno caudilho em mártir. Alguém ainda tem dúvidas da origem da raiva antipetista?

Há um ano, quando Bolsonaro ainda era uma piada da política brasileira, a derrocada do petismo dava sinais de uma eleição plural e imprevisível para 2018. Ainda que Joesley tenha colocado a pá de cal no fraco governo Temer, seus aliados temiam seu futuro eleitoral pela enorme rejeição do vice: melhor não andar próximo. Foi a brecha para o retorno, e para uma antítese.

O ano vira, Lula é preso e o que o PT fará nas eleições presidenciais?

A insistência é irmã da perseverança, mas a postura do partido em 2018 é de um autoritarismo que remonta a postura dos governos militares. A negação das leis foi um ato covarde, que apenas jogou querosene em um país já inflamado desde as últimas eleições. O PT brinca com o futuro da sociedade da mesma forma que Lula brincou e quis reinventar a história do Brasil.

As rachaduras por Lula e o PT, portanto, abriram o caminho para a raiva e o ódio, exemplificado no ato fratricida de Adélio.

No entanto, o brasileiro é um eterno refém do seu sentimentalismo. Crê, na figura de Bolsonaro, que a antítese é o remédio de cura imediata para nossos problemas, quando resulta na mesma saída caudilhista de outros tempos. A personificação não é solução, mas sim a mesma dose dos problemas que nos trouxeram até aqui. Aliás, a personificação do líder é o oposto de uma democracia saudável. Neste aspecto, tanto Bolsonaro quanto PT (lê-se Lula) representam a continuidade do erro. Só há vida em Bolsonaro como candidato à presidência, pois ainda há vida no caudilhismo de Lula, ou lulismo.

Bolsonaro deve sua vida ao PT. O Brasil, não.

Aos que ainda pensam que o primeiro turno de 2018 é uma inevitável escolha entre PT ou Bolsonaro, sinto dizer que, infelizmente, são órfãos do caudilhismo de Getúlio Vargas. Eu, não.

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