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Bolsonaro apoia privatizações e embala sonhos e pesadelos sobre futuro da Petrobras

07 ago 2019, 14:42 - atualizado em 07 ago 2019, 14:42
Jair Bolsonaro
Os planos de privatização da Eletrobras podem ser o “o grande teste” de viabilidade de uma eventual proposta similar para a Petrobras (Imagem: REUTERS/Adriano Machado)

O recente apoio do presidente Jair Bolsonaro à privatização de gigantes estatais como Correios e Eletrobras (ELET3) começou a alimentar entre alguns investidores e especialistas a esperança de que sua gestão possa em algum momento colocar na mesa planos de desestatização da maior e mais emblemática empresa do país.

Fundada em 1953 pelo presidente Getúlio Vargas após uma campanha sob o slogan “O Petróleo é Nosso!”, a Petrobras (PETR4) foi vista por décadas como orgulho nacional, até que um enorme escândalo de corrupção descoberto nos últimos anos ameaçou sua imagem e saúde financeira e disparou um processo de reestruturação que tem passado por diversas vendas de ativos.

As descobertas da operação Lava Jato, que ficou famosa ao redor do mundo, também ajudaram o Brasil a eleger Bolsonaro no ano passado, em campanha marcada por discurso antiestabilishment e pelo destaque dado ao atual ministro da Economia, Paulo Guedes, um liberal formado na Universidade de Chicago que já defendeu em público a venda de todas estatais.

“A gente vai somando um comentário aqui, outro ali, de pessoas, logicamente, que são protagonistas nesse processo de decisão, e essa ideia da privatização (da Petrobras) eventualmente começa a ganhar algum tipo de força”, disse à Reuters o analista do banco suíço UBS, Luiz Carvalho.

Carvalho assinou relatórios recentes nos quais convidou investidores a especularem sobre a possibilidade de a petroleira entrar nos planos de desestatização do atual governo. “Pense grande, sonhe grande”, escreveu ele, ainda em maio.

Citando “pistas” como uma fala de Bolsonaro a jornalistas de que seria contrário apenas à venda do Banco do Brasil e da Caixa, Carvalho defende que a desestatização poderia ocorrer com a venda de papéis do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na petroleira e o governo diluindo sua fatia com uma unificação de classes de ações, o que levaria a União a ficar com menos de 50% da empresa e garantiria sua ida para o Novo Mercado, que exige o mais alto nível de governança.

Esse modelo, pelo qual a Petrobras “deixaria de ser uma estatal para se tornar uma empresa privada controlada pelo governo”, ainda poderia evitar a necessidade de aprovação legislativa para o negócio, segundo relatório do UBS em julho.

O formato lembraria o adotado pela petroleira para se desfazer do controle da BR Distribuidora, desestatizada em julho com uma oferta de ações em bolsa, definida como “histórica” pelo presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.

O atual CEO, inclusive, já se manifestou a favor de uma Petrobras privada antes de assumir a companhia, neste ano. À frente da estatal, no entanto, ele afirmou que não possui mandato para privatizar a empresa, mas irá acelerar vendas de ativos para concentrar o foco em reservas do pré-sal.

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Sem atalhos?

A Lei do Petróleo, de 1997, determina que a Petrobras deve ter ações ordinárias e preferenciais, com a União detendo “no mínimo, 50 por cento das ações, mais uma ação, do capital votante”, o que dificultaria o caminho sugerido pelo UBS, disse o sócio da área de Óleo e Gás do Veirano Advogados, Ali Hage.

“Sem alteração legislativa, não vejo como”, afirmou ele, destacando que, por outro lado, a estatal teve recente aval do Supremo Tribunal Federal (STF) para vender subsidiárias mesmo sem autorização do Congresso.

Para Hage, seguir com os desinvestimentos poderia ser mais interessante para a empresa e para o governo, até devido ao “desgaste” que uma proposta de privatização poderia gerar.

O sócio da área de petróleo e gás do escritório TozziniFreire, Leandro Miranda, disse que é difícil pensar na venda da Petrobras por meio de uma “ginástica societária”, sem aprovação no Congresso, mesmo que houvesse tal possibilidade.

“Não é uma empresa qualquer, você está falando da Petrobras.”

Além disso, um movimento de mudança no controle da companhia exigiria outras alterações legais, como o fim do direito de preferência concedido a ela em leilões de petróleo, por exemplo.

“Se a pergunta é: o governo vai fazer o possível e o impossível para privatizar a Petrobras nesse mandato? Eu acho que sim… mas não acredito que tenha alguma viabilidade de aprovação que não seja por meio do Congresso, de fato”, afirmou.

Nesse sentido, os planos de privatização da Eletrobras, aprovados por Bolsonaro na semana passada, que preveem envio de projeto de lei ao Congresso, podem ser o “o grande teste” de viabilidade de uma eventual proposta similar para a Petrobras.

Assim como a petroleira, a Eletrobras teve a criação proposta por Vargas nos anos 1950 –embora tenha saído de fato do papel mais tarde, em 1962– e é vista por muitos como estratégica devido a seu predomínio na geração e transmissão de energia no Brasil.

“A gente enxerga que (a Petrobras) é sim um sonho grande do time do Ministério da Economia, talvez o maior de todos. Mas teria um longo caminho… Tem a Eletrobras aí na fila e outras, que vão dar mais ou menos um ‘cheiro’ para o mercado sobre o que esperar de Petrobras nesses quatro ou talvez oito anos de Guedes e Bolsonaro”, disse o diretor da gestora de recursos BlackBird, Bruno Di Giacomo.

Guedes já falou em uma meta de arrecadar até 1 trilhão de reais com privatizações para reduzir o déficit fiscal do país. A Petrobras tem um valor de mercado de 357 bilhões de reais, segundo dados da Refinitiv.

Sonho ou pesadelo?

Vista como um “sonho” por analistas e muitos investidores, a venda do controle da Petrobras é encarada como pesadelo por outros, que consideram a companhia estratégica.

O próprio Bolsonaro defendeu essa visão no passado –em 2005, ele afirmou aos risos em entrevista ao apresentador Jô Soares que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ser “fuzilado” por “entregar nossas reservas petrolíferas para o capital externo” e “o que ele fez com as privatizações.”

Neste ano, no entanto, Bolsonaro tem dado sinais de uma nova posição –ele afirmou por meio de seu porta-voz em abril que “em tese” teria “simpatia inicial” pela desestatização da petroleira. Na terça-feira, Bolsonaro ainda disse que teve um “passado estatizante” e destacou estar “aprendendo muito”.

O vice-diretor do Instituto de Energia e Meio Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP), Ildo Sauer, que foi diretor de Gás e Energia da Petrobras no governo Lula, avaliou que a estatal será reduzida a uma fração do que já foi no atual governo, em meio à continuidade dos desinvestimentos, mas disse que não se surpreenderia com uma privatização.

“Obviamente o esforço do governo vai nesse sentido, por razões ideológicas… mas eu acho que vai haver resistência”, afirmou ele à Reuters.

“Se não puder vender o CNPJ, fica ele e o prédio, ou talvez só o andar onde fica a diretoria… o resto ela pode vender. É um desastre da maior proporção.”

Sauer, para quem o Brasil deveria controlar a produção de óleo para influenciar preços, como fazem países da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), ainda disse que a Lava Jato ajudou a vender o argumento de que privatizar a petroleira teria efeitos positivos, visão da qual discorda.

“Há uma imagem construída contra a Petrobras a partir dos lamentáveis e criminosos episódios que existiram. Mas é como se arrombassem uma porta da sua casa. E aí você vende a casa para morar de aluguel”, comparou.

A luta contra uma eventual privatização da Petrobras também é encampada por sindicatos de trabalhadores, que lançaram a campanha “O Petróleo tem que ser nosso!”, que ecoa o antigo slogan que levou à criação da empresa, defendendo que ela continue “100% estatal e pública”.