Comprar ou vender?

“Bolsa é para cima”, diz Daniel Alberini, que compara cenário ao pós-Lula em 2004

21 set 2017, 14:50 - atualizado em 05 nov 2017, 13:55

Daniel Alberini

Daniel Alberini driblou o ruído político logo quando vazou a delação de Joesley Batista, dono da J&F, em maio deste ano. Sócio-fundador e gestor da CTM Investimentos, sediada em Curitiba (PR), ele zerou os 25% de caixa do fundo e comprou “tudo”. Otimista pelos sinais de retomada, inflação controlada e Selic caminhando para 7% ao ano, ele crê que a Bolsa pode até triplicar caso a eleição de 2018 confirme um nome que dê continuidade à agenda de reformas.

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“Quando olho para ano que vem, 2019, 2020, eu faço um paralelo com 2004, o pós-Lula. A Bolsa subiu 97% quando o Lula assumiu em 2003. Falavam, na ocasião, que tinha ficado caro. Nos quatro anos seguintes a Bolsa dobrou novamente. Creio que estamos nesse caminho”, disse Alberini em conversa com o Money Times, por telefone, nesta semana.

Na entrevista, o gestor, que é professor na Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UTFPR) e participa do conselho de administração e fiscal de empresas de capital aberto, também falou sobre teses de investimento atuais da CTM. E fez um alerta ao investidor pessoa física: “Não dá para ser conservador e deixar o dinheiro na poupança, mas também não dá pra tirar o dinheiro e ir para o Bitcoin. Precisa de um meio do caminho.”

Leia, abaixo, os principais trechos da entrevista:

A CTM é uma gestora com foco fundamentalista que preza o longo prazo. Possivelmente com viés até agnóstico ao Ibovespa, que tem alcançado pontuações inéditas. Como tem visto o momento atual da Bolsa? Está caro ou pode andar mais?

Na ocasião da delação da JBS, em maio, pouco importava se continuaria Temer como presidente, se entraria Rodrigo Maia, Eunício Oliveira ou qualquer outro. O risco naquele episódio era que houvesse alguma guinada maluca a uma espécie de Diretas Já, coisas assim. Como não havia, deliberadamente, predisposição para isso, o risco, na minha visão, era mitigado.

Havia muito ruído político, uma nuvem fazendo preço no mercado, um mal-estar generalizado. A bagunça envolvendo Temer iria piorar a economia e teríamos um double dip? Eu perguntava às pessoas: ‘o que mudou no seu dia a dia? Sendo uma pessoa bem informada, o que você parou de consumir a partir disso?’ Então qual era o sinal de fato? O juro estava caindo, a inflação caminhava para a meta e a atividade começaria a melhorar.

Nós tínhamos 25% de caixa no fundo quando ocorreu esse evento da delação. Zeramos o caixa, compramos tudo que podíamos. Independentemente de Temer, Maia ou Eunício, a economia vai melhorar. Depois os sinais apareceram e o mercado como um todo melhorou.

Agora ficou caro?

Precisa dar uma respirada, é natural. É saudável ao mercado subir respirando. Se surgir algum outro episódio, do mesmo jeito que sobe, volta. Entendo que, no curtíssimo prazo, pode ter alguma correção. Mas quando olho para ano que vem, 2019, 2020, eu faço um paralelo com 2004, o pós-Lula. A Bolsa subiu 97% quando o Lula assumiu em 2003. Falavam, na ocasião, que tinha ficado caro. Nos quatro anos seguintes a Bolsa dobrou novamente. Creio que estamos nesse caminho. Estão subestimando os resultados, achando as empresas caras. Estão olhando somente para o P [preço], mas não estão olhando para o L [lucro]. Falava isso em março.

Olhando para o fim de 2018, salvo alguma reviravolta, creio que já começamos a ver um cenário de eleições um pouco mais favorável. A Bolsa é para cima depois de sete anos sofrendo. Com o juro a 7% você vai colocar o dinheiro onde? Vemos espaço enorme para melhora de preços. Estamos discutindo lucro passado, de 12 meses. Eu estou animado, bem otimista.

Esse descolamento entre economia e política tem sido o pano de fundo de muitas análises.

Tem tudo para caminhar de maneira saudável daqui para frente. A partir da possibilidade de um presidente mais de centro-direita. Alguém que dê continuidade às coisas que estão sendo feitas. Assim a Bolsa pode dobrar, triplicar. A questão fundamental é que, diferentemente de 2012 e 2013, quando Dilma Rousseff colocou o juro a 2,5% real na marra, agora ao que tudo indica caminhamos para um cenário de juro real novamente nesse patamar, mas com sustentabilidade, sem marreta, sem segurar preço, sem segurar câmbio. É claro que tem a questão da Previdência, e daí o ponto de uma eleição saudável para prosseguir com isso. Eu creio que o mercado olha para este contexto geral, e não se apega o numero ruim do fiscal de hoje achando que ninguém fará nada. Alguém dará continuidade. Esse conjunto é muito saudável para a Bolsa.

Quais seriam hoje os principais cases de investimento da CTM?

Gostamos bastante de Movida, temos uma posição relevante para os nossos fundos. É um setor muito positivo para essa retomada econômica. Uma empresa que abriu capital recentemente, as pessoas ainda estão receosas em relação ao potencial da companhia sobre capacidade de entregar resultados, e nós acreditamos que esses componentes estão todos ali. O que precisa é uma evolução em casa, ou seja, melhorar processos internos. Mas o aspecto de estratégia, concorrencial, macro, tudo isso vem sendo feito. Tem tudo para ser uma empresa com potencial muito positivo no médio e longo prazo.

Além disso, temos coisas que o mercado não olha muito, como Energisa Mato Grosso e Rede Energia, que são subsidiárias da Energisa. Gostamos muito do Grupo Energisa. A Energisa pode ser uma empresa de destaque no cenário de distribuição de energia no futuro. Equatorial é exemplo financeiro disso, e vejo a Energisa como um exemplo operacional disso. As distribuidoras da Energisa ainda não capturaram toda a melhora que a própria Energisa tem feito.

Temos há algum tempo uma posição de Alupar. Entendemos que o mercado de transmissão de energia requer investimentos significativos no futuro. Considerando os desenvolvimentos recentes de Eletrobras, Taesa e outros players que entraram no mercado, a Alupar é uma candidata muito forte a participar e ganhar novos leilões ou novos projetos. Com a taxa básica de juros em 7%, 6%, a empresa tem um potencial fabuloso de gerar valor ao acionista.

Você é membro do conselho fiscal de algumas empresas e a CTM tem no ativismo uma de suas premissas. A JBS foi por várias vezes recomendada por analistas, contou com auxílio de bancos de investimento na abertura de capital – às vezes, fica a impressão que só contou com a mão do governo. O que sugere a investidores que procuram uma recomendação de investimento?

Estudar bastante. Não tem ‘diquinha’. A diquinha é o primeiro passo para a pessoa perder dinheiro. Podemos voltar também ao caso de OGX, todo mundo recomendava, mandava comprar, falava que era fantástico. Não dá pra ser muito ‘Alice’. Precisa lembrar também que o mercado e os bancos vivem de seus business, então exercem o papel de rentabilizar sua própria operação. Vai abrir o capital da empresa, cobrar um fee e a vida segue. Dentro disso, eventualmente, tem um pacote de recomendação de compra, venda ou neutro. Às vezes não manda comprar, mas diz que é neutro e a empresa é bonitinha e está tudo caminhando.

Também acho que governança é algo muito mais prático do que rótulos. Em quantas empresas do Novo Mercado já observamos exemplos péssimos de governança corporativa? Em contrapartida, eventualmente, vemos empresas sem nenhum nível de governança, porém com processo interno, coisas funcionando. É fato que hoje no Brasil poucas empresas possuem uma governança real que funciona. No fim do dia, sempre restam alguns embates em prol de um mínimo de governança.

É preciso olhar histórico, ver como as pessoas se comportam frente aos conflitos que aparecem e a partir daí entender como é aquela governança. E não simplesmente tratar o Novo Mercado como sinônimo de governança.

Este ano tem se notabilizado pela retomada significativa de ofertas de ações. Discute-se no mercado se as estreantes chegam ou não caras à Bolsa ao longo do processo de abertura de capital. Qual é a sua opinião?

Particularmente não participamos de IPOs. Entendemos que os valuations são relativamente caros. Preferimos esperar para depois tomar uma decisão, como fizemos com Movida, por exemplo. Mas vejo de forma muito saudável essa abertura de capital de várias empresas. Hoje o numero de empresas abertas é muito pequeno, então o mercado precisa evoluir. Acredito que, juntamente com a questão do juro baixo e de uma evolução natural dos investidores no Brasil, precisamos de uma evolução do empresário nesse sentido de trazer boas empresas para a Bolsa.

Evidentemente, em um cenário de euforia como esse, vão aparecer aquelas novatas despreparadas para tentar aproveitar o fluxo. Cabe ao investidor fazer a lição de casa e estudar a empresa, fazer contas, ter mais informação antes de investir.

As pessoas voltaram a ouvir falar em recorde da Bolsa no noticiário. Como vê o perfil do investidor brasileiro nesse interesse por aplicações mais arriscadas?

Veja: 99% dos brasileiros se intitulam conservadores. Só temos 1,5% das pessoas físicas com cadastro na Bovespa. Esses conservadores colocam o dinheiro na poupança ou nos bancos. Mas quando surge uma notícia de alta de 5% do Bitcoin, a pessoa põe o dinheiro lá como se não houvesse amanhã. É um paradoxo. São coisas muito antagonistas. Precisaríamos amadurecer muito como investidores.

Acredito que isso vai acabar acontecendo, naturalmente, quando conseguirmos manter uma taxa de juros estruturalmente baixa. Se as reformas, de fato, acontecerem, migrarmos para um patamar de juro real de 3% ao ano, com uma Selic de 7%, 6% ao ano, isso vai estimular uma visão diferente. Não dá para ser conservador e deixar o dinheiro na poupança, mas também não dá pra tirar o dinheiro e ir para o Bitcoin. Precisa de um meio do caminho.

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