Boeing 747, o jumbo original, se prepara para despedida final
O jato 747 da Boeing, o “jumbo” original que revolucionou as viagens aéreas, se prepara para ver seu reinado de mais de cinco décadas ser encerrado por aviões mais eficientes de dois motores.
O último jumbo comercial da Boeing será entregue na próxima terça-feira à Atlas Air na sua sobrevivente versão cargueira, 53 anos depois que o primeiro 747 chamou a atenção mundial como uma aeronave para transporte de passageiros da extinta Pan Am.
“No solo, é majestoso, é imponente”, disse Bruce Dickinson, vocalista do Iron Maiden que pilotou um 747 com design especial apelidado de “Ed Force One” durante a turnê da banda de heavy metal britânica em 2016.
“E no ar, é surpreendentemente ágil. Para esse avião enorme, você realmente pode jogá-lo ao redor se precisar.”
Projetado no final da década de 1960 para atender à demanda por viagens em massa, o primeiro jato bimotor de corredor duplo do mundo tornou-se também o clube acima das nuvens mais luxuoso do mundo.
Mas foram as fileiras aparentemente intermináveis na parte traseira do avião que fizeram o 747 transformar as viagens aéreas.
“Este foi o avião que introduziu o voo para a classe média nos Estados Unidos”, disse o presidente-executivo da Air France-KLM, Ben Smith. “Antes do 747, uma família média não podia voar dos EUA para a Europa de forma acessível”, disse Smith à Reuters.
O jumbo também deixou sua marca nos assuntos globais, simbolizando guerra e paz, desde o posto de comando nuclear do “Avião do Juízo Final” dos EUA até visitas papais em 747s fretados chamados de Shepherd One.
Agora, dois 747s entregues anteriormente estão sendo adaptados para substituir os jatos presidenciais norte-americanos conhecidos globalmente como Air Force One.
Como comissária de bordo de 747s da Pan Am, Linda Freier atendeu passageiros que iam de Michael Jackson a Madre Teresa.
“Era uma diversidade incrível de passageiros. Pessoas bem vestidas e pessoas que tinham muito pouco e gastaram tudo o que tinham naquela passagem”, disse Freier.
Transformador
Quando o primeiro 747 decolou de Nova York em 22 de janeiro de 1970, após um atraso devido a uma falha no motor, ele mais do que dobrou a capacidade de aviões de passageiros para 350 a 400 assentos, obrigando uma remodelagem no design dos aeroportos.
“Era a aeronave para o povo, aquela que realmente oferecia a capacidade de ser um mercado de massa”, disse o historiador da aviação Max Kingsley-Jones. “Foi transformador em todos os aspectos da indústria”, acrescentou o consultor sênior da Ascend by Cirium.
O nascimento do jumbo tornou-se o material de mitos da aviação.
O fundador da Pan Am, Juan Trippe, procurou cortar custos aumentando o número de assentos. Em uma viagem de pesca, ele desafiou o presidente da Boeing, William Allen, a fazer algo que superasse o 707.
Allen colocou o lendário engenheiro Joe Sutter no comando. Levou apenas 28 meses para a equipe de Sutter, conhecida como “Os Incríveis”, desenvolver o 747 antes do primeiro vôo em 9 de fevereiro de 1969.
Embora tenha se tornado uma vaca leiteira, os primeiros anos do 747 foram repletos de problemas e os custos de desenvolvimento de 1 bilhão de dólares quase levaram a Boeing à falência. Na época, a empresa acreditava que o futuro das viagens aéreas estava nos jatos supersônicos.
Depois da crise do petróleo da década de 1970, o auge do avião chegou em 1989, quando a Boeing lançou o 747-400 com novos motores e materiais mais leves, tornando-o perfeito para atender à crescente demanda por voos transpacíficos.
“O 747 é o avião mais bonito e fácil de pousar… É como pousar em uma poltrona”, disse Dickinson, que também preside a empresa de manutenção de aviação Caerdav.
Era da economia
A mesma onda de inovação que fez o 747 decolar significou seu fim, pois os avanços possibilitaram que os jatos bimotores replicassem seu alcance e capacidade a um custo menor.
No entanto, o 777X, definido para ocupar o lugar do 747 no topo do mercado de jatos, não estará pronto até pelo menos 2025, após sofrer atrasos de desenvolvimento.
“Em termos de tecnologia impressionante, grande capacidade, grande economia… (o 777X) infelizmente faz o 747 parecer obsoleto”, disse o diretor administrativo da AeroDynamic Advisory, Richard Aboulafia.
No entanto, a versão mais recente do 747-8 deve enfeitar os céus por anos ainda, principalmente como um cargueiro, tendo superado o jato de passageiros A380 de dois andares da Airbus em produção.
A entrega final do 747 desta semana deixa dúvidas sobre o futuro da gigantesca, mas agora subutilizada fábrica de fuselagens largas da Boeing que fica próxima de Seattle, em um momento em que a companhia ainda enfrenta impactos da pandemia e da crise desencadeada por duas quedas do 737 MAX que mataram centenas de pessoas.
O presidente-executivo da Boeing, Dave Calhoun, disse que a companhia pode não projetar um novo avião por pelo menos uma década.
“Foi uma das maravilhas da era industrial moderna”, disse Aboulafia, “mas esta não é uma era de maravilhas, é uma era de economia.”