Blog do PQ?: Por que precisamos de políticas mais horizontais?
Recentemente, em um evento do setor agrícola, Bolsonaro pediu ao presidente do Banco do Brasil que baixasse os juros para os produtores rurais. Diversos analistas manifestaram preocupação com as palavras do presidente, que ecoaram as políticas da época da presidente Dilma, as quais tentaram forçar a baixar “na marra” a taxa de juros brasileira. Mas isso só fez a inflação crescer, resultando em subidas posteriores nos juros (justamente em um período recessivo).
Mas há algo mais sombrio na fala de Bolsonaro. Ele pede que os juros caiam especificamente para o setor agrícola. A taxa de juros brasileira é de fato muito alta para padrões internacionais. Mais que isso, o spread bancário (diferença entre juros cobrados de tomadores e juros pagos a emprestadores) é ridiculamente elevado. Isso significa que os juros que chegam a quem toma emprestado são pornográficos.
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Não se resolve isso com uma canetada. São necessárias ações para desincentivar a inadimplência, reduzir taxas de empréstimos compulsórios, aumentar a concorrência entre bancos etc. Isso faria que os juros caíssem para todo mundo – e não só para os agricultores. É o que chamamos de “políticas horizontais”.
Entretanto, Bolsonaro parece mais preocupado em ajudar um grupo determinado. Já vimos ações recentes do governo em favor de grupos – ao conceder de crédito subsidiado a caminhoneiros e ao intervir para manter a proteção tarifária a produtores locais de leite, por exemplo.
Na verdade, o Estado brasileiro sempre foi utilizado em benefício de grupos. Os exemplos incluem subsídios, desonerações, contratos públicos, aposentadorias gordas, proteção contra competição externa. Em geral, isso é direcionado a uma categoria ou setor. Queremos incentivar a produção de determinada indústria? Daremos crédito subsidiado, proibiremos a importação etc. Certa categoria profissional precisa de incentivo? Colocaremos uma miríade de burocracias para dificultar a entrada de outras pessoas que possam fazer o mesmo trabalho.
Isso traz uma série de problemas econômicos. Em primeiro lugar, porque essas políticas geram benefícios concentrados nos grupos favorecidos, mas há custos substanciais que são espalhados em um conjunto grande de indivíduos.
Por exemplo, ao barrar a entrada de produtos de fora ou colocar entraves burocráticos em algum setor, estamos tornando o ambiente menos competitivo, prejudicando um sem número de consumidores que acabam pagando preços mais elevados e tendo acesso a uma menor variedade de produto. Se concedemos um subsídio ou uma desoneração de impostos, jogamos o custo para o conjunto de contribuintes. Muito provavelmente por causa dessa configuração (benefícios concentrados em poucos e custos distribuídos entre diversas pessoas), tais políticas são tão difíceis remover.
Em segundo lugar, políticas que beneficiam grupos específicos tendem a gerar ineficiência econômica. Proteção contra competição ou subsídios só são necessários caso determinado conjunto de empresas seja incapaz de andar com as próprias pernas, ou seja, elas tendem a ser pouco eficientes. Isso promove má alocação de recursos na economia, na medida em que recursos escassos são direcionados a firmas pouco eficientes, que continuam em operação graças à ajuda dessas políticas.
Note que políticos, gestores e empresários reagem a um ambiente em que o favorecimento faz parte do jogo. Empresários tentarão influenciar políticos e gestores, argumentando que sua empresa ou setor são “especiais” e merecem um incentivo que outros não recebem. Políticos e gestores certamente podem ser persuadidos, seja por meios legais ou ilegais.
Em outras palavras, não necessariamente os empresários mais eficientes e inovadores são os que têm sucesso, mas sim aqueles mais bem conectados com o mundo político, ou até que estejam dispostos a “sujar as mãos”. E o incentivo para o empresário é investir em cultivar conexões com o poder público, em vez de aumentar eficiência, inovar e oferecer produtos melhores ao consumidor.
Assistimos a uma explosão dessas benesses a setores específicos no início da presente década. Volumes absurdos de crédito subsidiado, muitas vezes para beneficiar empresas grandes muito próximas do poder público; desonerações de impostos para um conjunto específico de setores; políticas de conteúdo nacional para ajudar empresas domésticas; contratos públicos superfaturados, beneficiando amigos do rei.
Nada disso é novidade em nossa história. Não é exclusivo do governo da presidente Dilma. Mas aparentemente chegou ao limite. O estado brasileiro está virtualmente quebrado. Temos uma economia ineficiente, cuja produtividade agregada está estagnada há décadas.
A adoção de políticas mais horizontais – isto é, que não discriminem tanto entre indivíduos ou empresas – com regras simples e transparentes não é apenas algo mais justo. Ajuda também a economia a se tornar mais produtiva. Várias promessas de campanha do presidente Bolsonaro seguem tal linha, como abrir a economia, tornar impostos mais simples e reduzir a burocracia. Passos nessa direção foram tomados na semana passada, com a edição da MP da Liberdade Econômica, que visa diminuir entraves burocráticos e melhorar o ambiente de negócios.*
No entanto, os pronunciamentos e ações do governo – e, em particular, do próprio presidente – frequentemente contradizem essa lógica. Muitas vezes passam a impressão que o estado continua favorecendo amplamente grupos específicos – apenas trocaram-se os favorecidos.
*Isso não quer dizer, entretanto, que não haja atividades que mereçam tratamento diferenciado. Esse é o caso de setores em que estão associados a externalidades. Por exemplo, faz sentido subsidiar a produção de vacinas (que envolvem externalidades positivas) e desincentivar atividades que estão associadas à poluição e à agressão ao meio ambiente (externalidades negativas). Mas para tal é preciso critérios bem claros e objetivos.