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BitClave vs. SEC: a saga de uma ICO fracassada

05 jun 2020, 15:17 - atualizado em 05 jun 2020, 17:05
Confira a saga que levou ao fracasso da BitClave, que havia prometido uma plataforma onde usuários poderiam compartilhar suas informações de forma segura e ganhar dinheiro visualizando anúncios (Imagem: Twitter/BitClave)

“Em algum momento, castelos feitos de areia irão se desfazer no mar.” — Jimi Hendrix

Segundo Stephen Palley, em artigo ao The Block, cada acordo de oferta inicial de moeda (ICO) firmado com a SEC, Comissão de Valores Mobiliários dos EUA, parece ser o último que ele irá escrever.

Ele afirma que, a certo momento, é apenas mais do mesmo, mas ele discute sobre o acordo mais recente da BitClave e da SEC, enviado no último dia 28.

Existem algumas formas de a SEC ir atrás de pessoas que emitem valores mobiliários não registrados. A agência pode mover um processo (assim como os casos Telegram e Kik).

Outra alternativa é um procedimento administrativo, que não tem o mesmo valor precedente como um caso de tribunal, mas pode ter troca de farpas, como é o caso da Bitclave.

Em resumo:

BitClave é uma empresa de serviços de blockchain em estágio inicial que opera por meio de uma empresa em Cingapura e mantém um local principal de operações em San Jose, Califórnia.

De junho a novembro de 2017, BitClave ofereceu e vendeu valores mobiliários na forma de tokens digitais para financiar o desenvolvimento de uma plataforma de pesquisas baseada em blockchain para anúncios específicos para clientes.

Como parte desse processo, BitClave realizou uma oferta inicial de moeda (“ICO” ou “oferta”) em que arrecadou aproximadamente US$ 25,5 milhões com a emissão de ativos digitais chamados Consumer Activity Tokens (“CAT”) para aproximadamente 9,5 mil investidores, incluindo cidadãos americanos.

BitClave possui um escritório em San Jose mas, aparentemente, aceitou o conselho de operar em Cingapura porque… bom, não faltaram motivos.

Em junho de 2017, começou a divulgar o BitClave Active Search Ecosystem (“BASE”), que permitiria que pessoas fossem pagas em tokens CAT por assistir a anúncios.

Empresa prometia que dados de cliente “trabalhassem por eles”, mas nada disso foi cumprido (Imagem: BitClave)

Em seguida, lançou um whitepaper, promoveu a venda nas redes sociais e não registrou a oferta com a SEC ou pediu por uma isenção. O whitepaper afirmava que o dinheiro seria “agrupado” na “angariação de fundos” e usados para criar a plataforma BASE.

A oferta incluía uma pré-venda, um programa de caça a bugs e uma oferta pública final em que “611 milhões de CATS seriam distribuídos para aproximadamente 8,5 mil compradores durante a etapa final da oferta, incluindo cidadãos nos EUA, o equivalente a US$ 24 milhões em ativos digitais. BitClave anunciou que atingiu seu objetivo de arrecadar US$ 25,5 milhões em 32 segundos desde o início oficial dessa etapa da venda”.

A venda pública aconteceu em novembro de 2017, em meio à febre das ICOs. Na época, muitos lamentaram por terem tentado, mas falhado em comprar esses tokens, com a expectativa de que o token seria listado em uma corretora e revendido por um preço maior.

Na época, a plataforma ainda não existia. O whitepaper afirmava que os fundos agrupados e arrecadados seriam usados para desenvolver a plataforma e destacava que o desenvolvimento resultaria em um aumento no preço do token:

“Em seus materiais de oferta, BitClave declarava que CAT seria usado ‘internamente para com a BASE entre os participantes’ quando a plataforma fosse desenvolvida e pudesse incentivar usuários a participar dela.

Porém, não identificou qualquer meio específico onde detentores do token poderiam usar CAT no ‘ecossistema’ BASE.

Em vez disso, BitClave afirmou que tokens seriam negociados em plataformas de ativos digitais e que a BitClave planejava tornar a negociação de CATs disponível nas plataformas de negociações de criptoativos após completar a distribuição do token.

Compradores de CAT esperaram por uma oportunidade de lucrarem com a venda dos tokens após sua distribuição.”

BitClave não foi listada nas corretoras, a plataforma nunca foi criada e o castelo feito de areia foi levado pelas águas do mar (Imagem: BitClave)

BitClave buscou a listagem em algumas plataformas e não impôs quaisquer restrições para a negociação. No mínimo, pediu uma tarifa padrão.

Mas houve alguns obstáculos. Após arrecadar US$ 25 milhões em 32 segundos, as coisas esfriaram entre os dois cofundadores. BitClave processou um antigo funcionário, diretor e fundador pelo desvio de fundos da empresa arrecadados pela ICO.

Após um julgamento de três semanas em novembros, um júri decidiu que ele deveria pagar US$ 12,6 milhões. Devido à distração causada pelo processo e os custos de encargo, a BitClave decidiu interromper suas atividades.

Dependendo da estrutura familiar do “teste de Howey”, a justiça diz que os tokens CAT eram contratos de investimento e valores mobiliários não registrados, que não se qualificam para uma isenção.

Como uma sanção, a SEC impôs uma penalidade maior: US$ 25,5 milhões, com juros de US$ 3.444.197 e outra penalidade civil de US$ 10 milhões.

Resumindo, foram arrecadados US$ 25 milhões para, em seguida, ter um processo judicial horrível — talvez porque não tinham opção —, foram alvo de uma investigação pela SEC e, agora, têm que pagar mais do que arrecadaram com a ICO e tentaram mover uma ação contra o cofundador enquanto isso.

BitClave não foi listada em corretoras, a plataforma nunca foi criada e o castelo feito de areia foi levado pelas águas do mar.

Muito aconteceu. A incorporação em Cingapura forneceu zero proteção, o “ecossistema” muito promovido e o whitepaper prova para que existe o “teste de Howey”.

Alguns desses aspectos estão à altura. A questão é o impacto das garantias e do processo com o cofundador sobre a investigação e a ordem da SEC.

Um dos principais desafios em processos privados relacionadas a ICOs é que, ao enviar uma moção pública, você está expondo detalhes da sua ação — e, possivelmente, emissão ilegal — para o mundo todo (inclusive a SEC) ver.

Dada a quantidade de dinheiro em questão, pode ser que não tivessem outra opção. De qualquer forma, parece que os US$ 25 milhões em 32 segundos acabaram custando a todos os envolvidos mais do que o arrecadado — e resultou no desenvolvimento de praticamente nada.