Bettina Rudolph: Sobre o que é o dia de hoje?
Chego no escritório às 7h e começo a deslizar a tela pelo feed. Vejo mulheres defendendo o feminismo, frases como “não queremos flor, queremos respeito”, homens postando foto com as namoradas e muitas mensagens bonitas neste 8 de março. Não consigo me pronunciar antes de refletir… Sobre o que é o dia de hoje?
Nessa reflexão e pesquisando informações sobre o papel da mulher no empreendedorismo, no mercado de trabalho e nos investimentos, me lembrei do contexto lá de casa e percebi o quanto ele representa a realidade das famílias brasileiras.
Mamãe passou 10 anos numa intensa tentativa de engravidar, foram algumas dezenas de médicos e métodos malucos para finalmente realizar o sonho de virar mãe.
Ao engravidar do meu irmão aos 34 anos, ela teve o privilégio de poder pedir demissão e se dedicar exclusivamente à maternidade, algo que ela faz até hoje, mesmo que nós já tenhamos saído de casa.
Por conta disso, ela nunca mais teve sua renda e, com a dinâmica controladora do meu pai, ela nunca mais ficou sabendo de nada que acontecia no âmbito financeiro lá em casa.
Pergunta: quantas mulheres você conhece que cuidam das finanças de casa? Outra pergunta: quantas famílias endividadas temos hoje no Brasil. Segura na cabeça essas duas respostas um pouquinho!
Thomas e eu crescemos nessa dinâmica: papai cuidando das finanças, mamãe nos levando para a escola e cozinhando o dia inteiro (só quando vamos morar sozinhos descobrimos como demora preparar almoço, jantar e arrumar toda a cozinha… ah, se eu soubesse antes que ela tinha razão, quantos beijos a mais teria dado na bochecha dela ao sair da mesa…)
Lembro bem quando, aos 15 anos e recém mudado de São Paulo para Santa Catarina por conta de dificuldades financeiras, perguntei à minha mãe por que ela não ajudava meu pai com as finanças… ela respondeu que o assunto “dinheiro” em casa era uma caixa preta, só papai sabia quanto ganhava, quanto gastávamos e o que tínhamos. Isso me inconformava. Não estava claro o suficiente de que uma mudança de estado por motivos financeiros significava que o “método” não tava dando certo?
Foi nesse inconformismo e preocupada com a minha própria situação financeira que resolvi assumir as rédeas da minha vida.
Eu comecei a trabalhar aos 14 anos e, com isso quando completei meus 19, já tinha uma grana pra começar a investir. Formada pelo meu próprio esforço e suor. Me apaixonei pelo mundo dos investimentos em poucos meses e, cursando administração, já comecei a fazer planos de seguir carreira no mundo financeiro.
Num desses jantares em casa com um amigo de infância do meu pai, compartilhei o meu desejo de ir para a área da economia.
Para a minha surpresa, o homem me apoiou e contou sobre algo interessante: a origem da palavra economia. O elemento “eco” vem do grego oikos e significa “casa, lar, domicílio”.
Na sua origem, portanto, economia é a arte de bem administrar a casa, uma tarefa feminina desde a Grécia Antiga. Olha só: eu tava certa… papai era muito bom em tantas coisas, porque a tarefa de cuidar das finanças não se juntava ao restante das domésticas que mamãe já dominava tão bem?
A vantagem das mulheres não se restringe ao âmbito das finanças pessoais, mas também existe nos investimentos: temos traços comportamentais que nos tornam potencialmente melhores investidoras porque somos menos acometidas por um comportamento comum ao investidor masculino: o excesso de confiança.
Ainda assim, somos apenas 26% dos cpfs cadastrados na B3, bolsa de valores brasileira. Quão maior será que esse número não seria caso pudéssemos abrir conta em banco sem autorização do pai ou do marido desde muito antes de 1962?
Mas vamos falar de um problema ainda maior do que a falta de representatividade da mulher no mundo dos investimentos?
A dependência financeira que muitas mulheres têm dos maridos e até que ponto isso pode chegar. Você sabia que, a cada sete segundos uma mulher é vítima de violência no Brasil? A maioria dentro da própria casa.
E sabe qual o maior motivo apontado por aquelas que não saem debaixo do mesmo teto que o agressor? Dependência financeira.
E é aqui que eu começo a enxergar um motivo para falarmos sobre o dia 8 de março. Podemos discutir se o homem deve abrir a porta do carro para nós, se deve pagar a conta do restaurante bacana ou se deve nos entregar flores outro dia. Hoje é sobre algo muito mais importante, muito mais vital: a liberdade de vivermos nossa própria vida.
E isso o dinheiro pode fazer por nós. É disso que liberdade financeira se trata.
Quando a gente educa uma mulher pra ser independente financeiramente damos a ela uma alternativa, uma rota, um passe para a liberdade.
E isso vale pra todas, não apenas em casos de abusos. Ou vai falar que você não conhece ninguém infeliz no casamento mas que não sai de casa porque não teria o mesmo padrão de vida sem o marido? Em muitos casos, não teriam renda nem para comer.
Qual a saída? é uma fórmula de 3 elementos, na minha opinião:
1) Aumento da renda, seja empreendendo ou gerando mais valor para a empresa. Nada se faz se não há renda, precisamos fazer dinheiro entrar para nos tornarmos livres.
2) Criação de um mindset. De nada adianta gerar renda se não conseguirmos pegar parte dela e colocar pra trabalhar pra nós. Aqui, precisamos falar sobre finanças pessoais, sobre gastar menos do que se ganha, sobre a importância de abrir mão de certas coisas no curto prazo em troca de um futuro mais confortável.
3) Investir parte da renda. Essa é a minha missão de vida. Já são mais de 50 mil alunos no meu curso de educação financeira e, se você tem curiosidade de conhecer a proposta na próxima turma, que abre em abril, não deixa de me seguir no meu instagram @berudolph.
Somente com essas 3 “caixinhas” podemos ter um mapa rumo à liberdade financeira. Ganhar mais, gastar bem, fazendo sobrar uma parte todos os meses para investirmos no nosso futuro, nos aproximando cada vez mais da nossa liberdade.
Pra mim, o dia de hoje não é sobre diminuir os homens… sobre disseminarmos – muitas vezes com ódio – lições para aqueles que ainda estão numa etapa anterior no aprendizado que a sociedade vem tendo sobre o assunto.
Olhemos para a frente. Para onde estamos indo. O que podemos fazer para termos um mundo melhor para todos. Como podemos ajudar uma mulher ao nosso redor a se aproximar da sua liberdade.
Como vocês, homens, podem pedir ajuda às mulheres que, há séculos, mandam bem com o dinheiro. Nas contas de casa e nos investimentos.
Olhemos para, como esse compartilhamento de funções pode refletir em avanços na sua família, seja a sua família no formato que for: o homem ajudando mais nas tarefas domésticas e a mulher ajudando mais com a grana.
Vamos incluir essas pautas até o próximo 8 de março? Que tal em vez de um jantar em casa hoje os casais sentarem à mesa e organizarem as finanças dividindo funções? Pode ser com um vinho junto!
Meu desejo para o dia de hoje é que nos preocupemos menos com o post do feed no dia 8 de março e mais com o que acontece entre o 8 de março de um ano até o mesmo dia do ano seguinte.
Como um impulso, a Empiricus está presenteando as mulheres que chegarem hoje com uma assinatura essencial totalmente gratuita durante 6 meses.
Ah, e como boa mandona, ops, mulher… já deixo aqui também uma tarefa para o papai: o senhor deveria deixar a mamãe cuidar das contas de casa a partir de hoje.
Provavelmente sobraria um pouquinho para vocês investirem na aposentadoria e poderem morar em Búzios como sempre sonharam e até quem sabe terminarem a churrasqueira que está dando o que falar no grupo da família…