Opinião

Atas do Fed mostram hesitação e viés oportuno para a flexibilização

21 nov 2019, 14:04 - atualizado em 21 nov 2019, 14:06
Federal Reserve EUA
Os analistas temiam que as atas da reunião de política monetária do Fed divulgadas na última quarta-feira com o atraso de três semanas, se tornassem improfícuas (Imagem: Reuters/Leah Millis)

Por Darrell Delamaide/Investing.com

Costuma-se atribuir a Mark Twain uma frase sobre o clima em New England, embora ela também seja usada em praticamente todos os estados americanos: se você não está gostando do tempo, espere alguns minutos que ele vai mudar.

Os investidores podem estar tendo essa mesma sensação com a perspectiva econômica, devido às flutuações no acordo comercial entre EUA e China e a indicadores mistos. O mercado de trabalho está forte, mas o investimento empresarial está fraco.

O mercado acionário registra novos recordes sempre que aumenta o otimismo com as tratativas comerciais e derrapa quando esse otimismo desaparece.

Os analistas temiam que as atas da reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed) – divulgadas na quarta-feira com o atraso-padrão de três semanas – se tornassem improfícuas, pois o viés de flexibilização presente no pronunciamento oficial vinha sendo ofuscado por mais notícias altistas.

Mas essa euforia se deu antes das últimas informações de que está havendo um impasse nas tratativas comerciais. As preocupações manifestadas há três semanas parecem agora oportunas novamente.

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Muita hesitação e elevado risco de queda econômica

As atas, de fato, mostram bastante hesitação. As coisas não estavam indo muito bem nas primeiras semanas após a reunião anterior em setembro, mas depois pareciam estar indo melhor na segunda metade do período, pois se considerava que o acordo comercial era imprescindível e o Brexit aparentava avançar para uma resolução. No entanto, uma parte da letargia econômica no exterior ameaçava se disseminar pelos EUA.

As tratativas comerciais sofreram um duro revés, e não sabemos ao certo como essas questões vão se resolver. Os otimistas veem o copo meio cheio, apesar de todas as incertezas, enquanto os pessimistas veem a metade meio vazia do copo esvaziando-se completamente.

Uma linha de pensamento defende que os ventos contrários já passaram, que haverá uma retomada do crescimento na Europa e nos mercados emergentes e que os EUA vão desacelerar, mas não tanto. Nesse cenário, o Fed provavelmente não tomaria qualquer ação em 2020.

Os participantes do mercado, entretanto, estão precificando uma chance de 50% de que haverá mais uma redução de juros até junho, de acordo com as negociações dos futuros dos fundos federais na CME.

As atas de outubro mostram que as autoridades do Fed encaixam-se na categoria do copo meio vazio, ao revisarem para baixo suas previsões econômicas e julgarem que os riscos ao crescimento tendem a desencadear um ciclo de baixa.

Eles se mostraram pessimistas com as tensões comerciais e a possibilidade de que uma desaceleração do crescimento mundial tenha impacto negativo na economia norte-americana, algo difícil de sanar através da política monetária.

As autoridades do banco central dos EUA também demonstraram não acreditar muito na alta da inflação.

Os formuladores da política monetária concordaram em grande parte com essa avaliação e consideraram “elevados” os riscos de queda da atividade econômica. Tudo isso os fez acreditar que mais um corte de 25 pontos-base em outubro até que não seria má ideia.

Houve dissensão entre os membros, já que alguns argumentaram que os cortes anteriores ainda não haviam surtido efeito e que uma acomodação maior poderia ensejar uma tomada de risco excessiva.

O comitê decidiu que os dados teriam que motivar uma “reavaliação material” da perspectiva econômica para que o Fed tomasse alguma nova ação nos juros após o corte de outubro.

Essa foi a frase que Jerome Powell, presidente da instituição, fez questão de frisar na coletiva de imprensa após a reunião de outubro, quando a empregou por diversas vezes não só no discurso de abertura, mas também nas respostas às perguntas. Powell a repetiu mais uma vez em seu depoimento à Comissão Mista de Economia do Congresso, na semana passada, ao responder sobre o que levaria o Fed a agir novamente.

Jerome Powell, fez questão de frisar na coletiva de imprensa após a reunião de outubro, quando a empregou por diversas vezes não só no discurso de abertura (Imagem: REUTERS/Sarah Silbiger)

Será que tudo isso cria um viés para o afrouxamento? O diretor do Fed de Nova York, John Williams, fez uma sinalização nesse sentido quando afirmou que os riscos à economia ainda tendiam para a queda. Um arrefecimento da atividade econômica ou um movimento sustentado da inflação na “direção errada” poderiam justificar uma acomodação maior.

Enquanto isso, as chances de um corte de juros até julho estão diminuindo nas negociações de futuros. As preocupações que o Fed expressou há três semanas mais uma vez são bastante pertinentes e estão longe de ser improfícuas.