Ata do Copom: Tom duro ou neutralidade? Mercado debate futuro da Selic
A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada na manhã desta terça-feira (4), dividiu opiniões no mercado financeiro. Enquanto alguns analistas interpretam que o Banco Central manteve um “tom duro” sobre a política monetária, outros avaliam que a comunicação foi mais “neutra”.
Os diretores atribuíram tanto a alta de 1 ponto percentual (p.p.) da Selic em janeiro quanto a projeção de um aumento similar em março ao câmbio depreciado, à inflação alta e à piora de expectativas. Além disso, o Comitê alertou quanto à desaceleração da atividade, a qual é parte do processo de transmissão de política monetária e elemento necessário para a convergência da inflação à meta.
“Os dados mais recentes oferecem sinais incipientes de que alguma moderação do crescimento, em linha com o cenário-base, possa estar se iniciando, em particular no setor de bens e em setores mais sensíveis a crédito. No entanto, alguns elementos atenuadores sugerem parcimônia nas conclusões”, diz o texto.
Eles ressaltaram ainda que, como o mercado de trabalho segue aquecido, é difícil avaliar em que medida uma eventual desaceleração refletiria enfraquecimento da demanda ou pressões de oferta — “portanto, com impactos diferentes sobre a inflação”.
O Copom também alertou sobre a efetivação de determinadas políticas nos Estados Unidos, que pode pressionar os preços de ativos domésticos. “O ambiente externo permanece desafiador, em função, principalmente, da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos, o que suscita mais dúvidas sobre os ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre a postura do Fed“.
O tom duro do Copom prevaleceu?
Para Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, a ata manteve a rigidez da política monetária, alinhando-se à decisão da semana anterior, quando a Selic foi elevada para 13,25% ao ano.
“Havia uma expectativa significativa em torno da argumentação que o documento adotaria em relação a uma possível desaceleração econômica, já que alguns sinais de fragilidade na atividade vêm sendo observados, como os dados mais fracos de emprego”, diz.
O Copom reconheceu um ambiente externo desafiador e reiterou que os riscos seguem assimétricos para o lado altista da inflação. Ao mesmo tempo, a ata trouxe ajustes em relação aos riscos de baixa, refletindo a percepção de uma economia doméstica que pode desacelerar mais do que o esperado.
“Me parece difícil sustentar uma Selic a 16% se o país entrar em recessão”, afirma o analista, indicando que o BC poderá continuar o ciclo de aperto monetário em maio, mas com menos intensidade.
Além disso, Spiess destaca a atenção dada à desancoragem das expectativas inflacionárias. “Esse elemento recebeu mais destaque agora, e isso reforça o comprometimento do Banco Central com a convergência da inflação para a meta”.
Uma postura mais neutra na ata
Por outro lado, Leonardo Costa, economista do ASA, acredita que a ata procurou um tom mais neutro. “Sem grandes alterações em relação ao comunicado da semana passada, o Banco Central elaborou mais sobre os riscos para a economia local e o contexto externo”, diz Costa.
A leitura do economista destaca que o Copom alertou quanto à resiliência da atividade econômica, impulsionada pelo mercado de trabalho aquecido, política fiscal expansionista e crédito amplo.
No entanto, há sinais iniciais de desaceleração. “O Banco Central pondera a necessidade de arrefecimento da demanda para conter a inflação, mas busca equilibrar essa comunicação diante das preocupações do mercado sobre um possível excesso de restrição monetária”, afirma.
Outro ponto importante é a falta de um guidance claro para os próximos meses. “O Copom manteve a previsão de elevação de 1% na reunião de março, mas sem sinalizar movimentos futuros. Isso sugere que a autoridade monetária aguardará novos dados antes de definir o rumo da política monetária”.
A ata do Copom também trouxe preocupações sobre o cenário fiscal, reforçando a necessidade de harmonia entre as políticas fiscal e monetária. “O Copom foi claro ao apontar que a desancoragem das expectativas inflacionárias tornou o cenário mais adverso, aumentando o custo do controle da inflação”, diz Costa.