Assessor de investimentos: Qual é a real diferença entre um sócio e um empregado?
Com a edição da Resolução n. 178 pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que entrou em vigor em 1º de junho de 2023, criou-se a possibilidade das sociedades de assessores de investimento (nova denominação das sociedades de agentes autônomos) contratarem assessores sob o regime celetista.
Essa inovação é significativa, pois, há mais de dez anos, a regra previa apenas a existência de vínculo societário, razão pela qual todos os agentes autônomos vinculados a determinada sociedade deveriam ser obrigatoriamente sócios. E esse é o motivo capaz de explicar o porquê de boa parte dos processos trabalhistas movidos pelos agentes autônomos até então terem sido julgados improcedentes.
Com a mudança na regulação, o cenário agora é outro, muito embora a CVM não tenha extinto a relação societária originariamente concebida, admitindo a coexistência simultânea desses dois regimes jurídicos. Nesse sentido, existem diferenças claras e importantes entre o regime celetista e o regime societário.
O primeiro pauta-se pela existência dos quatro elementos caracterizadores do vínculo, quais sejam: subordinação, pessoalidade, não eventualidade e remuneração. O segundo pressupõe a existência de comunhão de vontades em busca de uma finalidade comum.
Assessor de Investimentos: Qual a real diferença entre empregado e sócio?
Nesse contexto, questiona-se: qual a diferença entre uma relação de emprego e uma relação societária? A pergunta não é singela, porque há zonas de intersecção entre os elementos caracterizadores do vínculo de emprego e a própria relação societária, tais como a remuneração, a pessoalidade e, por vezes, até mesmo a não eventualidade, isto é, a prestação habitual do serviço. Além disso, não podemos esquecer de que sociedades de assessores de investimento são — e continuarão sendo — prestadoras de serviço.
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Ao nosso ver, a questão fundamental que diferencia a natureza da relação consiste na existência de subordinação, porque o regime societário não admite tal requisito. O fato de haver um sócio majoritário pode acarretar, como consequência, o exercício do poder de controle, mas isso não implica uma relação de subordinação. Portanto, sócio não pode ter jornada de trabalho, controle de horário, tampouco receber ordens habituais.
A liberdade de um sócio é muito diferente da liberdade de um empregado. Isso não quer dizer que a relação societária não admita regras próprias, tampouco ajustes entre os próprios sócios, mas a subordinação, na acepção trabalhista, não pode ser encontrada.
Por fim, as sociedades e os assessores de investimento são livres para definir qual o melhor regime jurídico a ser aplicado, o que dependerá das particularidades do caso concreto. Porém, quando os quatro elementos da relação de emprego acima indicados forem encontrados, a relação poderá ser caracterizada como celetista, mesmo que instrumentalizada sob a forma societária.
Em situações como essa, via de regra, aplica-se o princípio da “primazia da realidade” muito utilizado na Justiça do Trabalho. E mais: nesse caso, o risco da “escolha equivocada” recairá sobre a sociedade que terá de arcar com as consequências derivadas do reconhecimento de vínculo, tais como contribuição previdenciária, FGTS, horas extras, 13º salário, férias e assim por diante.
Desse modo, é necessário que as sociedades de assessores de investimento revejam seu modelo de gestão, assim como a estrutura jurídica. Do contrário, poderão ser surpreendidas com reclamatórias trabalhistas, situação essa que era inédita para a maior parte delas.