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As diversas faces da inteligência artificial

09 nov 2022, 16:11 - atualizado em 09 nov 2022, 16:11
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(Imagem: Pixabay/ geralt)

A inteligência artificial é um dos principais fatores de transformação da nossa vida e terá um impacto cada vez mais profundo na construção do futuro da sociedade.

Ela já está presente nos serviços das assistentes digitais Siri, Google e Alexa, na gestão de tráfego das vias públicas, no reconhecimento dos sistemas de segurança que usamos, na personalização das plataformas de streaming, na recomendação das ofertas por social commerce, na gestão de preços dinâmicos, no funcionamento de veículos e eletrodomésticos autônomos, na otimização de processos fabris, logísticos e administrativos, entre tantas coisas.

Em síntese, inteligência artificial é uma área da ciência da computação que busca construir sistemas e máquinas que simulem a capacidade do ser humano de pensar, tomar decisões, realizar tarefas, e com a possibilidade de aperfeiçoamento a partir dos dados.

Há muitas décadas, o mundo da ficção vem imaginando a vida humana impulsionada pela inteligência artificial, nos presenteando com livros de Isaac Asimov, a criação de Kubric e Arthur C. Clarke “2001, Uma Odisseia no Espaço”, os desenhos dos Jetsons, e tantas obras significativas como Blade Runner de Ridley Scott, AI de Spielberg, Ex Machina de Alex Garland ou Her de Spike Jonze.

Já na academia, o tema ganhou impulso nos anos 1950. O termo “inteligência artificial” foi batizado pelo cientista John McCarthy em 1955, nas preparações para a primeira conferência desta área realizada no Dartmouth College em 1956 com a visão de criar máquinas inteligentes que pudessem elaborar pensamento abstrato, solucionar problemas e se autodesenvolver de maneira similar a um ser humano.

A chapa foi aquecendo durante a década de 1960 quando o departamento de defesa dos EUA deu pontapé em pesquisas para que computadores emulassem pensamentos humanos básicos.

À medida que a tecnologia avançava, os estudos se aceleraram e receberam enorme impulso no século XXI quando as organizações se informatizaram e passaram a deter uma enorme quantidade de dados passíveis de serem combinados com a programação de algoritmos.

Durante tempos, sonhamos que a inteligência artificial substituiria muitas de nossas atividades operacionais, repetitivas, inseguras, com maior produtividade.

E o que faríamos nós humanos?

Teríamos tempo para realizar tarefas mais interessantes, complexas, nobres, criativas. Migraríamos para novas profissões que surgiriam, o que nos exigiria caminhar eternamente nas trilhas do reskilling e upskilling.

Isso não chega a ser novidade revolucionária. No último século, acompanhamos a extinção de inúmeras profissões como condutores de charretes, operadores de telégrafo, telefonistas e maquinistas, bem como o desaparecimento de indústrias inteiras como as antigas fazendas de gelo, as locadoras de filmes e as fabricantes de máquinas de escrever, parquímetros e orelhões.

Outro dia sofri para achar uma banca de jornal para comprar figurinhas da copa e foi quase impossível encontrar uma loja de revelação de fotos, dois negócios que inundavam shopping centers e ruas centrais de qualquer cidade há 30 anos.

Confirmando essa tendência, o Fórum Econômico Mundial, em seus estudos sobre o futuro do trabalho, estima que a inteligência artificial está criando milhões de novos empregos. Mas fica a dúvida se o ritmo de criação de trabalhos superará o pique da destruição de profissões, especialmente quando olhamos a incompetência generalizada das sociedades em eliminar fome, desigualdade e miséria, em qualquer latitude.

É inerente que as organizações busquem incansavelmente ganhos de produtividade e invistam na automação de operações repetitivas, redundantes. As colheitadeiras substituíram os boias-frias, robôs tomaram lugar dos montadores de automóveis.

Dentro de nossa própria expectativa como cidadãos usuários de serviços, ao lidarmos com bancos, lojas, órgãos públicos e operadoras de telefonia, adoramos sistemas inteligentes que funcionem bem, intuitivos, velozes, intermediados por aplicativos robustos, nos dando previsibilidade, respostas imediatas, informações adicionais e outros benefícios com poucos cliques e sem variabilidade.

A cada dia, aumentaremos nossa confiança em apostar nas inteligências artificiais para nos proporcionar pareceres jurídicos, diagnósticos em saúde, cirurgias robóticas, gestão de sistemas de mobilidade, manutenções preventivas de equipamentos e tanto mais. Nesse cenário, é urgente nos atirarmos em águas profundas de aprendizagem contínua.

Outro ponto bastante repetido é que, no futuro, o ser humano desenvolveria e aplicaria talentos socioemocionais como seu grande diferencial em relação às máquinas.

Sou um professor especialista em criatividade e sorria de maneira entusiasmada quando apontavam para essa oportunidade de deixarmos de apertar parafusos para usarmos nosso potencial criativo. No entanto, há sistemas de IA que já geram obras criativas no universo da música, pintura, desenho, literatura, poesia, design.

Esses dias, comecei a brincar no DALL-E 2 do Open AI, que cria imagens completamente novas a partir das informações de centenas de milhões de imagens, permitindo que qualquer um “encomende” e produza uma peça de comunicação, uma arte cenográfica, uma capa de uma revista digital, uma imagem para a parede de uma loja, simplesmente escrevendo uma descrição do que se deseja. Claro que ainda não é perfeito, mas espere só alguns meses.

Lembro de amigos me mostrando a rede StyleGAN que cria fotos extremamente realistas de pessoas que nunca existiram enquanto o site Sudowrite ajuda autores a escrever livros.

O Boomy é um dos sites que utiliza a IA para composição de músicas. Eu, que também sou músico, vejo a competição complicada, mas curioso para as possibilidades de apertar um botão e parir uma canção em 30 segundos que combine Beethoven com Jackson do Pandeiro, com letra em formato de enredo de carnaval sobre direitos humanos.

Há um mês, a imprensa noticiou que uma empresa chinesa de games nomeou uma inteligência artificial como CEO da organização para alcançar maior eficiência operacional, tomar melhores decisões, desenvolver talentos e criar um melhor ambiente de trabalho.

Pode ser apenas a tal famosa ação midiática. Mas faz sentido?

Queremos mesmo ser liderados por uma inteligência artificial?

Eu já tenho minha resposta convicta. E você?

Um dia, viajando por Madri, lembro de ter escutado um jovem executivo de um unicórnio brasileiro explicar empolgadamente que já estavam usando IA para recrutar vendedores com grande assertividade e bons resultados para a produtividade de vendas.

Uma parte de mim, como poetizaria Ferreira Gullar, achou incrível a tomada de decisões com base em dados gerando contribuições para os resultados; a outra parte que vive em mim se arrepia com essa possibilidade de deixar a Técnica no comando isolado de tudo, com a obstinação pela otimização, sem considerar potenciais impactos nocivos que certamente ocorreram naquele caso.

E olha que àquela altura eu nem tinha visto conteúdos importantes como o filme Coded Bias e sua referência à preciosa Liga da Justiça Algorítmica.

Vivemos um paradoxo. A Inteligência Artificial, com seu impacto massivo, avança para fazer nossa vida melhor, previsível e com mais acuracidade. Por outro lado, ao mesmo tempo, pode tornar a sociedade ainda mais vulnerável, desigual, não democrática.

Como escreve com grande propriedade minha amiga Dora Kaufman, especialista a quem recomendo acompanhar para entender melhor o tema, uma governança de IA alinhada ao conceito de IA responsável requer que as organizações definam seu modelo e o atualizem permanentemente em torno de atributos técnicos – acurácia dos resultados, confiabilidade, robustez, resiliência de segurança -, atributos sócio-técnicos – explicabilidade, interpretabilidade, privacidade, correção de viés -, e atributos de gestão – equidade, responsabilidade, transparência.

Se o poder de pisar no acelerador tecnológico da IA vem principalmente dos pés (e bolsos) de grandes empresas turbocapitalistas na maior parte do mundo, cabe aos governos junto com a mobilização dos diversos stakeholders atuantes na sociedade (como eu e você) achar o equilíbrio entre proteger direitos humanos sem erguer obstáculos exagerados à inovação, entre ganho de produtividade e desemprego, entre a desigualdade entre países, empresas e pessoas, e entre a liberdade de expressão e a manipulação dos processos democráticos.

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