Argentina ganha tempo para enfrentar crise de dívida com congelamento de pagamentos
A Argentina conseguiu para si mesma um espaço muito necessário para respirar, depois que o surto do coronavírus interrompeu as negociações de reestruturação com credores internacionais, ao congelar os pagamentos de dívidas denominadas em dólares, mas cobertas pela lei local até 2021.
A medida –que crucialmente atrasaria grande parte dos 7 bilhões de dólares em pagamentos em moeda estrangeira com vencimento em maio– dá ao país mais tempo para chegar a um acordo em relação ao ônus da dívida o qual o governo tem afirmado, repetidamente, que não pode pagar.
“A contagem regressiva acabou de ser reiniciada”, disse José Echague, chefe de estratégia da Consultatio Investments, em Buenos Aires. “O que foi dito aqui é que vamos demorar um pouco, dar uma volta no quarteirão e começar a conversar novamente.”
A moratória parcial, que alguns economistas chamaram de default seletivo, amparava os preços dos títulos nesta segunda-feira, com investidores esperando que isso dê ao governo mais poder de fogo para lidar com a dívida externa emitida sob lei internacional.
Em nota, o JP Morgan disse que o congelamento tornou os pagamentos em dólares mais gerenciáveis no curto prazo e poderia permitir que a Argentina continuasse “honrando a dívida estrangeira enquanto as negociações se desenrolam”.
O banco de investimento acrescentou que também destacou uma mudança de prioridades para a Argentina em meio à pandemia, com a reestruturação sendo adiada à medida que o país lida com a crise da saúde.
O ministro da Economia da Argentina, Martín Guzmán, disse nesta segunda-feira que a medida ajudará o país a voltar a uma posição mais firme e a proteger os mais vulneráveis no momento em que a economia, atingida pela recessão, enfrenta o impacto do coronavírus.
“Essa decisão faz parte do plano elaborado para restaurar a sustentabilidade da dívida”, disse Guzmán no Twitter, acrescentando que isso ajudaria a Argentina “a deixar para trás as duras circunstâncias do Covid-19”.
A suspensão por parte da Argentina da dívida local em dólar ocorre porque o país estava enfrentando mais de 22 bilhões de dólares em pagamentos de capital em moeda estrangeira e mais de 10 bilhões de dólares em pagamentos de juros em moeda estrangeira neste ano, principalmente em instrumentos emitidos sob a lei local.
Enquanto isso, as reservas estrangeiras vêm caindo desde meados do ano passado, quando a Argentina as utilizou para pagar o serviço da dívida e sustentar a sua moeda, o peso.
Por enquanto, o congelamento não cobre os quase 70 bilhões de dólares em títulos estrangeiros que a Argentina está tentando reestruturar com credores internacionais, depois que perdeu um prazo autoimposto –final de março– para fechar um acordo.
Seria mais difícil adiar unilateralmente o pagamento de dívida a credores que poderiam acionar tribunais nos Estados Unidos, Japão e Reino Unido.
Miguel Kiguel, ex-subsecretário de Finanças, disse que o país ainda pode fazer um acordo com credores estrangeiros com uma oferta razoável, que pode ficar entre 30% e 40% acima dos preços atuais, já em níveis de inadimplência entre 20 e 30 centavos de dólar.
“Acho que hoje os detentores de títulos, se você lhes der uma saída, eles estarão felizes”, disse ele, acrescentando que isso tinha que “fazer sentido”.