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Anjos e CVCs, uni-vos!

16 mar 2021, 17:06 - atualizado em 16 mar 2021, 17:06
Os anjos têm dois especiais interesses em investir. O primeiro deles é o retorno financeiro e, portanto, vislumbram em algum momento chegar a uma saída recompensadora (Imagem: Unsplash/@austindistel)

De um lado estão os executivos C-Level com uma longa estrada no comando de grandes empresas, sedentos por beber na fonte da inovação e de olho em novas oportunidades de investimento.

Do outro, empresários cientes da urgência de se conectarem com negócios destrutivos que possam ser estratégicos para acelerar a transformação digital de suas organizações.

Os primeiros integram o universo crescente de investidores-anjo que vêm aportando cada vez mais capital semente e conhecimento em startups com claro potencial de escala e boas chances de alcançar uma saída rentável.

Segundo a Anjos do Brasil, eles são responsáveis por mais de R$ 1 bilhão dos investimentos feitos em startups no país, com um tíquete médio de R$ 129 mil em 2019.

No front empresarial a tendência chegou para ficar, colocando também o Corporate Venture Capital (CVC) como uma das principais fontes de capital para o ecossistema brasileiro de startups, especialmente após a pandemia.

Segundo o estudo Distrito Corporate Venture Capital 2020, em 2019 os CVCs investiram R$ 884 milhões em startups no Brasil. A pesquisa BR Angels / FirstCom indicou que sete em cada 10 empresas aumentaram o interesse em investir em startups em 2020, e quatro em cada 10 planejam implementar um programa de CVC nos próximos 2 anos.

Se, aparentemente anjos e CVCs, têm propósitos diferentes na hora de investir em startups, o ponto que trazemos aqui é que faz total sentido uma aproximação entre os dois universos para fomentar a economia da inovação. Por quê?

Bem, a conta é simples: 1+1 = 3. Como?

A equação é esta: ao integrar os dois universos, todos os três só têm a ganhar: anjos, CVCs e startups.

Para ficar mais claro, vamos analisar os papéis de cada um.

Os anjos têm dois especiais interesses em investir. O primeiro deles é o retorno financeiro e, portanto, vislumbram em algum momento chegar a uma saída recompensadora, seja com a venda para um CVC da participação que adquiriram quando a startup ainda dava seus primeiros passos ou com um sonhado IPO caso decidam permanecer por mais tempo no negócio.

O segundo é aprendizado, já que ao se aproximar das empresas novatas eles têm a oportunidade única de trocar conhecimento com quem está na crista da onda da inovação.

Como estamos falando de executivos de alto escalão, muito experientes e bem relacionados, além de smart money há ainda um terceiro ativo não menos importante que entregam aos empreendedores: network.

Da mesma forma, o CVC também atua nestas mesmas três frentes. Mas em dimensões bem maiores. Além, claro, da diferença no valor do tíquete na medida em que o corporate entra no jogo quando a startup já está mais madura e passou pela prova de conceito, o anjo vislumbra uma saída adiante.

O CVC não necessariamente, já que mais importante do que o possível ganho financeiro com uma venda é o valor estratégico em si que a startup pode agregar ao negócio.

Sua visão é, então, muito mais de integração para acelerar o crescimento de ambas, a startup trazendo inovação, tecnologia, disrupção, e a empresa aportando a trilogia capital, conhecimento e mercado.

Assim, é mais provável que o CVC coloque toda a sua máquina e dinheiro para anabolizar a startup, manter a sua posição e partir para uma aquisição de 100% com o claro objetivo de garantir a sua sobrevivência no mercado.

Os anjos podem abençoar as startups naquele momento ainda de muitas incertezas e escassez de recursos, financeiros e de gestão (Imagem: Agência Câmara dos Deputados/Ilustração)

As empresas que já acordaram para o novo mundo, ainda mais agora após a pandemia, sabem que se não construírem uma simbiose com o ecossistema de startups correm o grande risco de perder o market share conquistado com muito suor ao longo de anos para uma empresa com sufixo tech muito mais jovem, mas também muito mais preparada para as demandas em constantes mutações da economia digital.

E é justamente por atuarem em momentos e dimensões diferentes que a aliança entre anjos e CVCs pode fazer toda a diferença na jornada empreendedora de uma startup.

Os anjos podem abençoar as startups naquele momento ainda de muitas incertezas e escassez de recursos, financeiros e de gestão. Estão ali desde os primeiros dias para nutrir o negócio com tudo que precise; são como padrinhos.

Quando seus bebês crescem e alcançam a adolescência, já mais vividos e preparados, chega a hora do CVC assumir suas criações para que virem gente grande. O anjo pode não vender todas as suas ações e continuar acompanhando seu crescimento para ter uma saída ainda melhor, quem sabe até uma abertura de capital.

Para que esta relação gere bons frutos para todos, Eduardo Guimarães, associado da BR Angels, profissional de carreira no mercado financeiro, faz sua recomendação:

“O alinhamento entre anjos e CVCs pode trazer benesses para todos, especialmente às startups, que em seus primeiros dias recebem smart capital para iniciarem suas caminhadas, e, quando ganham porte, dão um novo salto com a chegada do corporate venture. Mas é essencial que potenciais conflitos de interesse sejam administrados e regrados nos documentos de entrada dos CVCs de forma a não obstruir o crescimento da startup, como, por exemplo, para mitigar o risco de perda de clientes que sejam concorreres da empresa patrocinadora do CVC. É fundamental também evitar que as regras de transferência de ações não restrinjam a liquidez da startup em potencial evento de liquidez, o que poderia comprometer o retorno dos empreendedores, anjos e demais acionistas”.

Temos visto uma maior disposição para o compartilhamento do dealflow entre investidores, uma prática que no Silicon Valley foi essencial para construção do ecossistema desde os anos 90. Por aqui, a cultura do co-investimento é recente, trazendo a necessidade de uma estruturação mais transparente das informações sobre as startups e seus mercados de atuação para disseminar conhecimento entre investidores e empreendedores através de iniciativas como as conduzidas pela Distrito, ABVCAP e FGVnest.

Somente assim, com transparência e integração, iremos construir a estrada da inovação no Brasil para startups e grandes empresas.

E foi por isso que decidimos aproximar nosso grupo de anjos do BR Angels do Alfa Collab, o programa de open innovation e CVC do conglomerado Alfa, fortalecendo uma parceria para aumentar o volume e a qualificação de potenciais empresas aptas a serem aceleradas e a possibilidade da realização de co-investimentos.

Se anjos e CVCs estiverem próximos, as chances de dar luz à novos unicórnios serão sempre maiores. E é isso que todo mundo quer, não é mesmo?

Orlando Cintra é Membro do Conselho de empresas como SMARTIe (Solvi Ambiental) e HyperloopTT, além de Founder & CEO do BR Angels, grupo de investimento-anjo formado por CEOs e empreendedores. Como Executivo de grandes corporações como SAP, HP e Informatica Corp, atuou em diversas posições como Presidente e Vice-Presidente Sênior para América Latina.

Francisco Perez é Diretor de Novos Negócios Responsável pelo Alfa Collab – Programa de Open Innovation e Corporate Venture Capital com foco na realização de negócios com startups capazes de apoiar os desafios da transformação digital do conglomerado Alfa.