André Gordon traça cenário positivo ao mercado com Alckmin-Bolsonaro no 2º turno
Engana-se quem pensa que os 10% em caixa mantidos, atualmente, pela gestora GTI sinalize menor apetite por ações na B3. Desde o êxito da estratégia “kit impeachment” há dois anos, André Gordon, sócio-fundador da administradora de recursos independente, continua apostando em um ciclo virtuoso do Brasil. Seu entusiasmo passa pelo quadro eleitoral em meio à melhora dos fundamentos da economia brasileira. “Não consigo ser pessimista nesse cenário.”
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Atento às oportunidades fora do radar, Gordon realizou posições que atingiram o preço-alvo em sintonia com a alta da Bolsa, como a ação de Locamerica (LCAM3), que pegou a R$ 3,50 para R$ 25 (daí a razão do caixa de 10%, mais elevado que a média histórica). E decidiu se concentrar na assimetria que nota em setores que mesclam aspectos de renda fixa, como água e saneamento e shoppings, por entender que a curva de juros está “muito inclinada”.
O receio com a eleição presidencial explica o juro longo mais elevado no mercado, mas o gestor de fundos da GTI vê com bons olhos a chance de Geraldo Alckmin versus Jair Bolsonaro no segundo turno. “O mercado certamente de forma implícita já considera que em 2019 será aprovada a reforma da Previdência porque senão o corte de gastos terá de ser muito grande para poder preservar o arcabouço fiscal”, disse Gordon em conversa com o Money Times na semana passada.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Reforma da Previdência
Eu diria que hoje ela não está 100% descartada do ano. Eu tenho na minha cabeça que forças diversas no Congresso teriam todo o interesse de aprovar a reforma da Previdência, a começar pelo PSDB, que é um partido fragmentado. Se penso que vou assumir o governo em 2019, por que terei de fazer todo o trabalho braçal e não posso deixar uma parte já antecipada? Bastaria estimular a base para caminhar nisso. Isso não vale só para o PSDB, afinal os estados estão quebrados e dependem, de certa forma, dos parâmetros novos de Previdência. Então nada impede uma ‘reviravolta’ após as eleições, quando haverá um mês e meio para alguma movimentação. Tramita todas as etapas e depois põe para votação. De qualquer forma há o lado bom de tirar o ruído da frente do mercado em razão dos problemas de Rodrigo Maia na condução do processo.
Michel Temer
O Michel Temer substituiu o processo complicado da reforma da Previdência por algo que possa render dividendos, roubando, por exemplo, a agenda da segurança do Jair Bolsonaro. Há uma chance razoável de que o Temer, ou alguém por ele indicado, ganhe corpo para a eleição ao longo do ano com PIB crescendo 4%, inflação baixa e geração de emprego.
Eleição
O risco de cauda mais ameaçador era o Lula. Não que houvesse 100% de certeza de que Lula fosse adotar uma agenda populista plena. Mas seria ruim porque precisaria esperar para ver, tornaria o ambiente hostil, haveria políticas distributivas e etc.. O Ciro Gomes morre pela própria língua, uma ‘Dilma Rousseff cangaceira’. Inteligente, mas com premissas erradas. E a Marina Silva, o povo cansou do discurso ambíguo covarde.
Sobra o Geraldo Alckmin, que é uma agenda fiscalista ortodoxa na parte de equilíbrio das contas públicas, o que é muito bom. Talvez em termos de mercado seja o candidato melhor visto. Acena com Persio Arida na Fazenda, um dos pais do Plano Real. E tem a bandeira da segurança, conta com estatísticas a seu favor. Enfim, terá coisa para apresentar. Dependendo da composição, eventualmente com um governista, como o Henrique Meirelles, ou alguém que o Temer indicar, capaz de aglutinar, ele será um candidato forte.
O Jair Bolsonaro mostrou desconhecimento na economia e se colocou contra a reforma da Previdência, o que é algo pouco inteligente, embora diga que é a favor em outros termos, diferentemente da posição da esquerda. Não acho que ele seja ruim. Ter o Paulo Guedes na Fazenda não é ruim. Restará combinar com o Congresso, mas no Brasil quando alguém ganha a eleição, naturalmente, o partido tende a ganhar deputados, passa por um processo de migração e composição de base. Não consigo imaginar PMDB e DEM virando oposição. Será mais complicado, mas não ingovernável.
Hoje Alckmin e Bolsonaro estariam no segundo turno. Os dois, portanto, mais viáveis ao segundo turno seriam bons ao mercado. O governo não precisa fazer nada, só não atrapalhar. Quanto ao Alckmin, ninguém tem dúvida. Por outro lado, ele defende o Estado do jeito que está. Fará pequenos ajustes, mais do que estamos acostumados em São Paulo, mas não imagino uma mudança do tipo reduzir impostos. Já o Bolsonaro chega com uma agenda de mudanças. Ele falou que não vai aumentar impostos. É um bom começo.
São dois nomes que, conforme afunilar o processo eleitoral, terão que apresentar um plano de governo. Com base nisso, os mercados terão uma ideia melhor.
Economia
Não há sinais nem perspectivas de inflação. Ainda há uma capacidade ociosa grande na indústria, uma mão de obra ainda ociosa, quase 12%, muito alta. Milhões a serem contratados sem pressões salariais. Há espaço, portanto, para crescimento rumo a nossa curva potencial sem pressionar a inflação. Pela primeira vez temos esse cenário com juro baixo. O juro baixo da Dilma Rousseff foi artificial. Até 9% tinha fundamento na época. Depois ela quis fazer o legado dela à força. Hoje está com 6,75% e se for para 6,50% não será surpresa. Alguns bancos sugerem que subirá depois para 8%, mas é um call nem tão convicto. Precisa ter uma piora que hoje não temos visibilidade, até porque se piorar a economia, não haverá pressão salarial. A agricultura continua indo bem, ninguém vê pressão de alimentos. E não há pressão cambial porque a balança comercial está muito forte, assim como o investimento estrangeiro direto.
Houve evolução também em vários aspectos da questão da regulação no Brasil. O efeito da reforma trabalhista se dará mais ao longo do tempo, alem do início de alguma simplificação tributária, eventualmente com PIS/Cofins. Algumas micro reformas que vão na direção correta. Não consigo ser pessimista nesse cenário. É um ambiente construtivo, muito positivo. Olhamos um ciclo favorável de ao menos oito anos.
Sabesp
A curva de juros está muito inclinada porque o mercado vê o risco da eleição. Sem a reforma da Previdência, a incerteza fiscal perdura. O déficit vai crescer e o governo vai precisar cortar. O mercado certamente de forma implícita já considera que em 2019 será aprovada porque senão o corte de gastos terá de ser muito grande para poder preservar o arcabouço fiscal.
Na Bolsa, vemos uma assimetria mais favorável em setores como utilities (água e saneamento) e shoppings, quase renda fixa, que misturam um pouco da economia real, mas sem ter o compromisso do high growth para justificar múltiplo, negociados muito baratos. Temos Sabesp (SBSP3) a 7,5x Preço/Lucro. Isso não é compatível com a atual taxa de juros do Brasil. O múltiplo tinha de ser mais alto: a Sabesp deveria negociar a 12x P/L, 14x P/L.
Além disso, a empresa tem a seu favor um pequeno crescimento, notícias envolvendo o aumento de capital, a melhora de governança, a revisão tarifária que foi positiva, mas há o risco da eleição para governador em São Paulo. Se vier o João Doria, excelente. Não vejo a Sabesp como privatizável, infelizmente, mas é uma empresa bem gerida.
Petrobras
Era uma empresa ‘too big to fail’ e estava quebrando, na prática. A Petrobras (PETR4) se refez em dois anos. A Eletrobrás (ELET6) está no mesmo processo, também estava quebrando. Eu não tenho Petrobras mais pelo meu call de petróleo não ser tão altista (‘bull’). E a dívida ainda é alta. Mas a empresa vem fazendo um trabalho de tirar o chapéu. Lembrando que quando você vende ativos também reduz sua capacidade de gerar Ebitda. O governo é grande no setor, com a Cide e todos os tributos. Fora isso, a demanda por combustível caiu muito nos últimos três anos, e não é muito claro como se dará a volta. Está mudando um pouco a forma de utilização de automóveis.