‘Anatel’ da inteligência artificial: Relatório do Senado propõe agência regulatória para IA
A inteligência artificial (IA) chamou a atenção de diversas pessoas nos últimos dois meses. Muito por conta do sucesso do ChatGPT, modelo generativo de mensagens da OpenAI.
Por isso, a pedido do Senado, 18 juristas criaram um extenso relatório de mais de 900 páginas que busca discutir os perigos para, assim, encaminhar a tecnologia rumo à regulação no Brasil.
O relatório ficou pronto no início de dezembro de 2022, após 239 dias de trabalho da comissão. Entre os consensos do grupo está a de um órgão regulador para IA, assim como uma regulação setorial, que visa observar a aplicação da tecnologia em diversos setores.
O relatório foi a pedido do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, após receber o P.L 21/2020. O projeto de lei 21/2020 também trata da IA, e já havia sido aprovado na Câmara em 2021.
O P.L 21/2021 agora corre em regime de urgência, conforme o site da Câmara dos Deputados e deve ser a base para a regulação mais robusta trazida através do relatório dos juristas.
Em entrevista ao Money Times, Rodolfo Tamanaha, sócio de negócios digitais do Madrona Advogados e professor do Mackenzie Brasília, comenta que o relatório de juristas foi justamente o resultado mais apurado da P.L aprovada na Câmara em 2021.
“A crítica que foi feita [ao P.L 21/2020] é que tramitou muito rápido, o que não deixou tempo para amadurecer e discutir”, comenta.
Tamanaha também comenta que era um projeto muito “principiológico”. Ou seja, trazia princípios, e poucas normas concretas para a tecnologia.
Após aprovado na Câmara, o P.L tramitou no Congresso, onde o presidente Rodrigo Pacheco solicitou a criação de um extenso relatório de juristas sobre o assunto.
“Hoje o que existe no Senado, que deve voltar a caminhar após o carnaval, são justamente esses projetos pensados por juristas”, explica.
“A minha percepção é que este [projeto feito por juristas] é muito mais interessante por tratar de questões que o outro não discutia. A leitura hoje no mercado é que é um projeto muito mais interessante e robusto”, complementa.
Entre os prós, o advogado comenta que o novo projeto no Senado tem muito mais a frente do consumidor da tecnologia, para protegê-los.
As críticas que o projeto recebe é justamente o órgão estatal tomar a frente das normas de implementação de uma tecnologia tão avançada, o que pode sufocar os avanços na visão de alguns.
“A IA é uma realidade diferente quando pensado em cada setor distinto em que que pode ser aplicada. A utilização de IA em seguradoras é diferente no mercado de criptomoedas como é diferente na área da saúde”, diz.
Um ponto que deve sofrer alteração no Congresso, segundo Tamanaha, é que cada órgão destes setores, como a Anatel, acompanhe a regulação da IA em sua determinada área.
Regulação de IA avança no Brasil
O relatório é dividido e classificado em níveis de criticidade, sendo eles baixos, médios ou altos.
Os níveis graves estão determinados como “risco à vida e integridade física de pessoas, a interrupção de funcionamento de operações críticas de infraestrutura”.
Nesses casos, os agentes de inteligência artificial comunicarão à autoridade competente a ocorrência de tais incidentes, “incluindo quando houver, graves danos à propriedade ou ao meio ambiente, bem como graves violações aos direitos fundamentais, nos termos do regulamento.”
Outros pontos abordados discorrem sobre as responsabilidades civis dos agentes de inteligência artificial, como a imputação de danos ocorridos devido ao funcionamento da tecnologia às empresas que a oferecem.
É definido também responsabilidades acerca do impacto do algoritmo da IA, que é de responsabilidade da empresa testar e ter certeza que não tenha impactos prejudiciais ou imorais aos seus clientes.
O projeto pede que as empresas forneçam documentação e a informação de como a tecnologia será utilizada, tanto ao órgão regulador quanto ao cliente. Estruturas de governança também são solicitadas aos agentes de inteligência artificial.
As IAs consideradas de alto risco são classificadas como as que administram trânsito, relacionadas a educação e triagem de candidatos, assim como veículos autônomos ou sistemas de cargas de emergência.
Já foram definidas também casos aonde a IA não poderá ser implementada. Confira exemplos:
Seção II |
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Risco Excessivo |
Art. 14. São vedadas a implementação e uso de sistemas de inteligência artificial: |
I – que empreguem técnicas subliminares que tenham por objetivo ou por efeito induzir a pessoa natural a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança ou contra os fundamentos deste lei; |
II – que explorem quaisquer vulnerabilidades de grupos específicos de pessoas naturais, tais como associadas à sua idade ou deficiência física ou mental, de modo a induzi-las a se comportar de forma prejudicial à sua saúde ou segurança ou contra os fundamentos desta lei; |
III – pelo poder público, para avaliar, classificar ou ranquear as pessoas naturais, com base no seu comportamento social ou em atributos da sua personalidade, por meio de pontuação universal, para o acesso a bens e serviços e políticas públicas, de forma ilegítima ou desproporcional. |
Art. 15. No âmbito de atividades de segurança pública, somente é permitido o uso de sistemas de identificação biométrica à distância de forma contínua em espaços acessíveis ao público, quando houver previsão em lei federal específica e autorização judicial em conexão com a atividade de persecução penal individualizada, nos seguintes casos: |
I – persecução de crimes passíveis de pena máxima de reclusão superior a dois anos; |
II – busca de vítimas de crimes ou pessoas desaparecidas; |
III – crime em flagrante. |
Parágrafo único. A lei a que se refere o caput preverá medidas proporcionais e estritamente necessárias ao atendimento do interesse público, observados o devido processo legal e o controle judicial, bem como os princípios e direitos previstos nesta Lei, especialmente a garantia contra a discriminação e a necessidade de revisão da inferência algorítmica pelo agente público responsável antes da tomada de qualquer ação em face da pessoa identificada. |
Art. 16. Caberá à autoridade competente regulamentar os sistemas de inteligência artificial de risco excessivo. |