Ana Westphalen: Mostre-me seu portfólio e te direi quem és
— Cara… uma situação dessa coloca a gente à prova, né? Suas convicções e seus medos mais profundos vão ser testados, não interessa quanto tempo cê tem de mercado. É pânico. Europa, Nova York derretendo. E, aqui, aquela situação: Quarta-feira de Cinzas, tinha que esperar depois do almoço, fazer o quê? E olha que aquele dia a gente tava até que bem. Dólar, ouro, put spreads de S&P. Quando o mercado abriu…
— PAIÊÊÊÊÊÊÊÊ!
— Só um minuto. Só um minuto. O que foi, filha?
— Pai, me ensina a jogar Jogo da Velha?
— …
As conversas com os gestores têm sido bem mais animadas ultimamente. No começo, achei que seria muito impessoal falar através de uma tela de computador. Mas nunca devemos subestimar a capacidade humana de adaptação, sobretudo em tempos de pandemia e isolamento social. Hoje, confesso que tenho gostado de conhecer o “lado home office” das pessoas, como o do gestor a quem fiz referência acima (sim, fatos reais).
Nós aqui da série Os Melhores Fundos de Investimento temos passado as últimas semanas em conversas com nosso time de gestores sugeridos, mais recentemente, dos fundos de ações. A ideia é entender como os portfólios foram sendo adaptados ao longo do primeiro semestre — período em que o Ibovespa amargou perdas de 17,8% — e qual a estratégia das casas para ganhar no pós-pandemia.
Algo interessante nos chamou a atenção. Se, no início de 2020, as carteiras dos fundos de ações eram muito semelhantes, repletas de cíclicos domésticos, chegamos à metade do ano com uma situação bem diferente. Isso porque, entre março e abril, a forte queda dos preços das ações propiciou um rearranjo dos portfólios, o que, ao longo dos próximos meses, deve revelar uma distorção de performance entre os gestores.
Permita-me um flashback rápido para explicar como foi essa travessia. Primeiro, o caos que se instalou nos mercados globais a partir do fim de fevereiro (como narrou nosso gestor misterioso no início deste texto) e fez com que os fundos de ações abandonassem suas teses construtivas para Brasil e mantivessem apenas exposição a empresas com bastante caixa e resultados sólidos. Até aí, foi um movimento bem coordenado.
Conforme o cenário para ativos de risco foi melhorando, às custas dos estímulos sem precedentes dos grandes bancos centrais, os gestores se sentiram à vontade para ir às compras. Cada um tinha aquela empresa que namorava de longe, mas que, por uma questão de preço, ainda não estava no portfólio.
Na Alaska, Henrique Bredda foi de Lojas Renner (LREN3) e Localiza (RENT3), que comprou pela metade do preço. Flavio Sznajder, da Bogari, encontrou a oportunidade perfeita para finalmente incluir BTG Pactual (BPAC11) na carteira. Na Fama, Fabio Alperowich escolheu nomes do setor de saúde, com um prévio entendimento de que os planos se beneficiariam (e não o contrário) do momento de preocupação com o coronavírus.
Resultado: hoje as carteiras refletem muito de como cada gestor está imaginando o cenário pós-pandemia. E cada um tem suas próprias apostas, mais autorais. As teses podem até ser semelhantes, como “financial deepening”, varejo online, tecnologia, planos de saúde; mas os cavalos não são sempre os mesmos. As “queridinhas”, de toda forma, são Magazine Luiza (MGLU3), Lojas Renner, Natura (NTCO3), Localiza, Via Varejo (VVAR3), Cesp (CESP6), Intermédica (GNDI3), Hapvida (HAPV3) e Eneva (ENEV3).
“Quem acertar na escolha das que vão ganhar market share vai se diferenciar, toda crise é consolidadora. É um mercado mais de ‘stock picking’ [seleção de ações], vai ter mais diferença de performance entre os gestores”, acredita Gustavo Heilberg, da HIX.
O gestor da Perfin Alexandre Sabanai vai na mesma linha. “Desde 2016, o ciclo de beta foi mais forte do que o de alfa. Quem investiu no Ibovespa ganhou mais de 100%; quem fez uma seleção razoável, 120% a 130%; e quem fez uma boa seleção ganhou mais de 200%. Do fim de 2019 para cá, no entanto, o nível de precificação da Bolsa
indica um ciclo mais propício para o stock picking do que para o beta.”
Como parte da melhora do ambiente para Bolsa, as ofertas iniciais de ações (IPOs) ganharam força; neste mês, abriram capital a mineradora de ouro Aura Minerals e a companhia de gestão ambiental Ambipar, mas outras estão na fila. Os mais otimistas falam em 30 a 40 operações até o fim do ano, o que corresponderia a uma movimentação de até R$ 50 bilhões. Bom para os gestores, que terão cada vez mais alternativas para diversificar.
Se ficou com vontade de saber mais sobre as oportunidades em que nossos gestores de ações preferidos estão de olho, o caminho é por aqui.
Um abraço,
Ana Luísa Westphalen.