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Ana Westphalen: divirta-se na grama do vizinho (sogra tem sempre razão)

13 dez 2019, 11:33 - atualizado em 13 dez 2019, 11:33
Mercados
“Na nova realidade de juros mais baixos que vivemos, será imprescindível diversificar, tomar mais risco em Bolsa, se aventurar mundo afora”, afirmou Ana Westphalen (Imagem: Unsplash/@austindistel)

Por Ana Westphalen, da Empiricus Research

“SEIS CHAMADAS NÃO ATENDIDAS”, acusava o celular sobre a mesa de trabalho. Hoje em dia, sair para o almoço e não levar o telefone é um ato de rebeldia, comentei com uma colega. O clima de brincadeira virou preocupação quando percebi que eram ligações da minha sogra. Éramos vizinhas e algo poderia ter acontecido em casa.

— Lelé, tudo bem?, perguntei apreensiva.

— Tudo ótimo, querida, e você?, respondeu, com a tranquilidade costumeira.

— Vi que você me ligou. Tá tudo bem mesmo?

— Ah, sim! Liguei… Como faço para comprar ações do Alibaba?

Era o dia em que o gigante do comércio eletrônico estreava na Bolsa de Nova York, em 2014. Jack Ma, fundador do Alibaba, estava no centro das atenções e a tela da Bloomberg estampava: “O maior IPO da história”. A cifra de US$ 25 bilhões só foi superada ­— e por pouca coisa — nesta semana, pela petroleira Saudi Aramco.

Mas, àquela altura, qualquer recorde era secundário. Eu só queria entender por que a Lelé, que até onde sei nunca foi investidora, estava obcecada pela ideia de comprar ações do Alibaba. À noite, fui tirar a história a limpo. Descobri que ela era cliente do site e achava a ideia de comprar online “o máximo”.

No fundo, vejo outra motivação. Apesar de sair pouco de casa, minha sogra tem um gosto pelo diferente, um ímpeto contido de desbravar, de se jogar em outras praias. Em resumo, a Lelé tem um perfil muito diferente daquele do investidor brasileiro.

Na hora de investir, nós ­(me incluo nessa) somos acometidos por uma tendência chamada de “home biased” pela teoria das finanças comportamentais. Ou o tal “viés local”, em português. Fala a verdade, não parece muito mais confortável investir naquilo que está próximo de nós?

Isso me faz lembrar do meu sogro. Há décadas o Nico vai à agência do Bradesco para pagar contas. Por tabela, sua carteira de ações é dominada pelo Bradescão. “Viu a ação do Bradesco?”, me pergunta sempre, e ai de mim se não souber o que houve com o papel.

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O brasileiro investe só 1% de seu patrimônio no exterior, segundo dados da Anbima (Imagem: Unsplash/@m_b_m)

Resultado: o brasileiro investe só 1% de seu patrimônio no exterior, segundo dados da Anbima. Será que faz sentido esse número ser tão baixo? E se eu te lembrar que o Brasil representa apenas 3% do PIB mundial? Ou seja, 97% da riqueza do mundo é produzida lá fora.

Ok, temos um atenuante: a taxa de juros historicamente alta no país nos acostumou mal. Tínhamos um ativo livre de risco que pagava bem e com pouca volatilidade, o que realmente nos deixava sem incentivo para explorar novos territórios. Mas a Selic, que estava em 14,25% ao ano em 2016, chegou nesta semana a inéditos 4,50% — e ainda pode ter um “chorinho” em fevereiro.

Há também o componente regulatório. Até 2015, por exemplo, um fundo não podia investir mais do que 20% do capital no exterior. Hoje, a instrução 555 da CVM permite que fundos com o sufixo “investimento no exterior” aloquem até 100% do patrimônio lá fora. Só que os melhores veículos em geral são restritos ao investidor qualificado (com mais de R$ 1 milhão em ativos financeiros).

Como temos dito por aqui, na nova realidade de juros mais baixos que vivemos (e que veio para ficar) será imprescindível diversificar, tomar mais risco em Bolsa, se aventurar mundo afora. Como bem percebeu a Lelé, ajudamos as empresas internacionais a engordar suas receitas, mas não participamos dos lucros delas.

Ampliando o olhar para outros países, o Chile está muito mais adiantado do que nós. Lá, cerca de 40% dos ativos são investidos fora. Nos Estados Unidos, o porcentual é menor, de 25%. Mas muito superior ao nosso tímido 1%.

Agora quer saber como pensam os melhores? Vocês três leitores do Day One já foram apresentados à Bridgewater, maior gestora de hedge funds do mundo, de Ray Dalio. Para tirar o máximo benefício da diversificação, o All Weather portfolio investe em 70 mercados em nada menos do que 40 países. É nisso que temos que nos inspirar. Um veículo para acessar o famoso fundo será lançado aqui no Brasil em breve, pela HMC Itajubá.

Voltando ao início desta conversa, talvez você esteja curioso (ou curiosa) para saber se a Lelé virou ou não sócia do Alibaba. A resposta é: ainda não. Estamos pensando em uma forma mais diversificada e completa para que ela finalmente desbrave o mundo por meio dos investimentos.

E algo me diz que nos próximos dias teremos novidades. Aguenta mais um pouquinho, sogra! Até lá, você leitor pode refletir sobre quantas oportunidades pode estar perdendo ao concentrar seu patrimônio dentro das fronteiras tupiniquins.

Um abraço,

Ana Luísa Westphalen

P.S.: Só para constar, quem investiu no IPO do Alibaba viu o preço da ação triplicar entre 2014 e hoje.

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