Americanas (AMER3): Blockchain evitaria rombo, diz CEO de empresa que tokenizou CCB do Bradesco
A tokenização do mercado de crédito no Brasil por meio da tecnologia blockchain poderia ter evitado a situação que a Americanas (AMER3) está passando ao descobrir um rombo fiscal de R$ 20 bilhões, disse Paulo Oliveira, CEO da Bolsa OTC Brasil.
A Bolsa OTC foi a empresa que em conjunto com o Bradesco realizou a tokenização de uma CCB no valor de R$ 10 milhões no ambiente regulatório do Sandbox do Banco Central do Brasil.
Foi também a primeira transação de tokenização do mercado financeiro regulada pelo Banco Central, segundo o anúncio. O Bradesco atuou como originador e distribuidor dos títulos.
Pelas estatísticas do BC, no grosso existem R$ 10 trilhões no sistema financeiro nacional – CCBs, empréstimos green etc, dentro disso tem créditos, FIDCs e mercado de capitais
Conforme explica Oliveira, existem duas contas que são “compror” e “vendor”. São atreladas a essas operações de varejistas como Lojas Americanas, onde quando é a varejista que está com risco de crédito é uma “compor”. Quando é o fornecedor, ou seja, uma empresa que tá produzindo material é uma “vendor”.
Existem cerca de R$ 100 trilhões de “compor” no ano no Brasil, conta o CEO da Bolsa OTC.
“Se você tivesse isso em uma rede de blockchain, com certeza a informação estaria segura e garantida, a transparência do negócio é total. Então você aumenta muito a segurança no sistema. De novo, você não está dando segurança de crédito. O risco de crédito é algo a parte”, diz.
Mas, conforme diz, a visibilidade e a certeza que essa operação existe seria entregue por blockchain, além da certeza de uma autoridade monetária por trás.
“[A blockchain] daria total dimensão do tamanho do mercado. Quem tá comprando, quem tá vendendo e quando vencerá. Não tem nenhuma dúvida que tokenização evita um problema como esse que aconteceu”, afirma.
Planos para o futuro do Bradesco
Quando perguntado sobre planos de tokenização de outros títulos de dívidas pelo Bradesco, Oliveira diz que o Banco parece estar positivo e animado com a tecnologia.
“Eu não respondo pelo Bradesco. Então tô aqui falando da nossa parte e para nós foi excelente ter o Bradesco como parceiro pioneiro e com certeza eles estão mostrando a vontade, como o próprio Bernardino [diretor de ações e custódia em entrevista] falou. O problema do Bradesco era que isso fosse juridicamente viável”, diz
Oliveira reforça que a tecnologia blockchain difere do Bitcoin (BTC) e demais criptomoedas no aspecto da regulação. O primeiro ainda não é totalmente regulado pelo Governo brasileiro, enquanto o segundo “é uma tecnologia extremamente útil e forte e o futuro do mercado financeiro”.
“Não tem dúvida nenhuma. A tecnologia tem muita aplicação, então estamos ao lado da tecnologia blockchain pensando em ativos financeiros. No caso do Brasil, o Banco Central tem o Sandbox. Nosso projeto é um dos sete que foram selecionados, e dentro do próprio Central é um dos que está andando mais rápido”, afirma.
Conforme diz Oliveira, a tokenização do Bradesco criou um arcabouço regulatório que entrega a segurança jurídica para quem realiza tokenização. “É isso que o Bradesco tá esperando segurança jurídica na tokenização”, explica.
Os bancos querem tokenizar
Oliveira comenta que a tokenização, além de ser interessante para o tomador de crédito, é atraente para os bancos por baratear a emissão de títulos, muito devido à questão da dispensa de registro nessa operação.
Uma CCB precisa ser registrada por meio de uma registradora, que hoje a B3 atua como uma das principais. O processo de tokenização dispensa o registro pelo seu caráter tecnológico de registrar transações.
No caso do Tesouro Direto, por exemplo, precisa haver a certeza de quem é o credor, quem é o detentor do título e confirmar sua identidade. Na tokenização, o próprio contrato inteligente e a rede blockchain garante a posse do token.
“Quando isso ficou claro, e o Banco Central nos dispensou do registro, é criado um mercado que os bancos hoje adoram. Porque você tem um grande estoque de missões como CCBs e outros mais, estão na tesouraria e se fossem para mercado para secundário, teria que registrar. Com a tokenização, eu não tenho custo de registro então isso viabiliza um ‘spread’ que não existia no mercado. Está baixando o custo da emissão.”
Oliveira explica que ao fazer isso, o Banco tira o título do balanço. Além disso, já em forma de token, é possível viabilizar o ativo para o cliente, e se ele quiser mexer depois e criar um secundário é “só trocar sem muita discussão”.
“Pela primeira vez temos a oportunidade de criar um mercado secundário de dívida no Brasil. E hoje não tem por falta de liquidez o mercado brasileiro de dívida está por volta de dois trilhões de dólares em que 80% é dívida pública, ou seja, o Brasil é intoxicado em SELIC. As empresas não conseguem emitir dívida porque o processo de IPO é caro, é um círculo vicioso, o processo é caro, o custo é alto e para você poder arcar com esse custo, eu tenho que ter um título de longa duração”, explica.
A tokenização do Bradesco foi realizada de maneira interna, no ambiente de testes do Sandbox do BC.
Para Oliveira, o que acontecerá daqui para frente, em novas emissões, é que serão clientes que estão fora, como, por exemplo, corretoras que podem começar a usar esse mercado.
O CEO acredita que um grande leque está se abrindo no mercado de crédito.
“Existem 20 milhões de empresas no Brasil, onde 18 milhões são pequenas e médias que estão fora desse mercado. Sobrou dois milhões de empresas médias para grande, essas empresas podem ter acesso ao mercado de renda fixa, o mercado de crédito, abriu portas para ela.
Em um médio a longo prazo, quando essa empresa começa a emitir e ter liquidez, essas portas se abrem para o pequeno investidor.
“[O pequeno investidor] hoje tá preso numa taxa muito baixa e vai poder ter uma liquidez e investir no papel que rende melhor”, diz. “Sempre lembrando que risco de crédito é do investidor, né? Nós não estamos garantindo o crédito”, relembra.