Alta de custos de produção na indústria de alimentos pesa no bolso do consumidor
O aumento nos preços de commodities agrícolas e insumos, a variação cambial e o impacto da pandemia de Covid-19 têm influenciado os custos de toda a cadeia produtiva da indústria alimentícia.
De acordo com levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), milho, soja e arroz subiram 84%, 79% e 59%, respectivamente, no período de um ano.
Em abril, o índice de commodities agrícolas da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) foi 30,8% superior ao do mesmo mês de 2020, maior patamar deste 2014.
“O governo brasileiro poderia contribuir para mitigar a alta de preços reduzindo alguns impostos de importação, o que já vem sendo pleiteado à Camex (Secretaria-executiva da Câmara de Comércio Exterior)”, declara o presidente da Abia, João Dornellas.
No que diz respeito à pandemia, a estimativa é de que o custo adicional de produção tenha sido de 4,8% em 2020, o que impactou em até 2,5% o preço dos produtos ao consumidor final.
“A redução para os insumos do setor contribuiria para diminuir o impacto sobre os custos de produção de alimentos, aliviando, consequentemente, o impacto nos preços pagos pela população brasileira, uma vez que o câmbio e demanda são duas variáveis que o governo não pode controlar”, completa o presidente da Abia.
Matérias-primas e embalagens, que respondem por 65% dos custos de produção dos alimentos industrializados, também representam um gargalo por conta da oferta reduzida, agravada pela desvalorização da taxa de câmbio.
As resinas plásticas seguem com preços em alta, e, no caso da folha de flandres, além da restrição da produção interna, os preços acumulam alta superior a 60% nos últimos seis meses, o que tem gerado forte impacto.
Os preços do óleo de palma, importante matéria-prima utilizada na produção de alimentos (pães, bolos, biscoitos, chocolates, margarinas, entre dezenas de outros), e principal matéria-prima utilizada na substituição de gorduras trans, seguem com tendência de alta.
A produção nacional é estruturalmente insuficiente para atender o consumo. Após o mês de junho, quando se encerra a safra nacional do vegetal, o problema será agravado.
Apesar desses entraves, de janeiro a março de 2021 registrou-se expansão de 2,3% na produção física (base volume) e de 2,2% nas vendas reais.
Os dados anualizados, acumulados em 12 meses até março, mostram um comportamento próximo ao do fechamento de 2020, com as vendas reais em alta de 3,5% e a produção física, de 1,2%.
No primeiro trimestre de 2021 o número de pessoas ocupadas na indústria de alimentos apresentou alta de 1,7% em relação ao mesmo período do ano passado.
Cenário para 2021
O cenário ainda é incerto para o Brasil em 2021. Entretanto, há caminhos que podem ajudar a reduzir os custos de produção. A reforma tributária é um deles.
“Ela é essencial, uma vez que ampliará a renda líquida disponível das famílias brasileiras, gerando mais consumo. É imperativo que o Brasil tenha um sistema tributário mais simples e que não onere o consumidor naquilo que é básico para qualquer cidadão: a sua alimentação”, afirma Dornellas.
No curto prazo, a evolução da pandemia influenciará no ritmo da retomada principalmente do setor de serviços, mais dependentes da circulação de pessoas e do funcionamento dos estabelecimentos, como o de food service, e, em última instância, da própria economia.
Exportação X abastecimento interno
Ainda de acordo com o levantamento da Associação, as exportações de alimentos industrializados têm tido resultados expressivos: no primeiro trimestre de 2021, alcançaram US$ 8,96 bilhões, valor 14,1% superior ao observado no primeiro trimestre de 2020. Em volume, o crescimento foi de 15,5%.
A tendência para este ano é seguir em ascensão devido ao cenário de expansão da demanda mundial por alimentos, que tem forte correlação com a evolução do PIB mundial, projetado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) em +4,4%, e com a taxa de câmbio, que tem se mantido em patamar elevado.
Dornellas explica que o sucesso das exportações se deve ao aumento da demanda mundial e a preços internacionais mais elevados principalmente nos setores de açúcar, óleos e gorduras e carnes.
O presidente da Abia refuta o argumento de que o estímulo às exportações prejudica o mercado interno, afetando o bolso do consumidor.
“Não houve desabastecimento interno nem priorização às exportações em detrimento do mercado nacional. A variação de preços se deve à realidade de livre mercado, considerado o aumento da demanda por alimentos não só no Brasil, mas em todo o mundo. Como há uma pressão da demanda mundial, naturalmente há uma alta nos preços”, diz o dirigente, acrescentando que no primeiro trimestre de 2021, do total das vendas da indústria, 72% foram para o mercado interno e apenas 28% para exportação.
Impactos para o consumidor
As negociações entre as empresas do setor de alimentos e as cadeias de varejo contextualizam-se em um cenário de livre mercado e de acordo com as estratégias comerciais de cada empresa. Ainda assim, o aumento nos custos para o consumidor sempre será motivo de preocupação para o setor.
“A indústria não tem capacidade de absorver 100% dos custos, que acabam se desdobrando no preço final dos alimentos”, esclarece Dornellas, que defende uma alíquota reduzida para alimentos.
O dirigente cita um levantamento da Fipe, segundo o qual a média da carga tributária sobre os alimentos no Brasil é de 23%, uma das mais altas do planeta, e para os produtos da cesta básica a carga média de tributos é de 9,8%.
O valor atual da cesta básica praticado em algumas capitais consome quase 60% do salário mínimo, pior proporção em 15 anos.
“Estamos falando de 82,5 milhões de pessoas, 39,9% do total da população brasileira. Essa situação é agravada ainda mais pelo contexto econômico atual de perda de emprego e renda. Logo, quando se propõem elevações na carga tributária dos alimentos é preciso ter em mente esses impactos sociais”, enfatiza Dornellas.